“Um avião passou por cima da minha casa soltando uma água branca e no outro dia eu estava passando muito mal”, conta uma moradora do assentamento Queima Fogo, em Pompéu (MG). “A boca arrebentou toda por dentro, queimava como fogo. Dava falta de ar”, descreve. A trabalhadora rural vive perto de uma plantação de eucaliptos da fazenda Rio Velho, propriedade do Grupo Alterosa.
Segundo moradores, a empresa teria pulverizado agrotóxicos no dia 23 de junho e a deriva — quando o produto desvia do local onde deveria ser aplicado por causa do vento —, teria deixado ao menos sete pessoas com sintomas de intoxicação.
Dez dias após a pulverização, a casa da presidente da associação comunitária Tatiane de Menezes foi alvo de cinco tiros durante a madrugada. “Não sei se foi coincidência ou não, mas sei que na noite de sábado para domingo foram efetuados vários disparos na porta da minha casa, inclusive uma bala ficando cravada na parede da chegada da minha casa”, relatou.
O MP-MG acionou a Polícia Civil, que abriu inquérito para investigar os disparos. “Aconteceu em um mesmo contexto, foi próximo ao dia da notícia da contaminação e envolveu uma das partes que está diretamente envolvida. Portanto, existe suspeita que tenha envolvimento com a questão da contaminação”, disse o promotor que atua em Pompéu, Guilherme Hack.
Pelas regras do Ministério da Agricultura, não é permitido um avião aplicar agrotóxicos em áreas situadas a uma distância de menos de 500 metros de povoações, cidades, vilas e mananciais de captação de água.
A empresa é vizinha ao assentamento e algumas residências ficam muito próximas da fazenda. “Você vê o eucalipto quase dentro de casa”, resume uma moradora. Os assentados relatam que todos os anos os aviões passam pulverizando a fazenda e causam impactos na saúde, nas plantações e nos animais.
“Quando a gente procura, eles [a empresa] alegam que não é veneno, que é adubo”, diz a líder comunitária. O Ministério da Agricultura aponta que, no caso da aplicação aérea de fertilizantes, é obrigatório o comunicado prévio aos moradores de áreas situadas à distância inferior a 500 metros.
Foto: Prefeitura de Pompéu
Todos os trabalhadores entrevistados pela reportagem afirmaram que não foram informados sobre as pulverizações. “Eles nunca avisam e ainda falam que não é veneno, mas a gente não sabe. Eu tinha uma horta e morreu tudo: o pimentão caiu do pé, os pés de mamão apodreceram e ficaram pintados de preto”, disse uma das moradoras.
Tatiane de Menezes afirma que os moradores, além de lidar com a pulverização de agrotóxicos, queixam-se dos efeitos do rompimento da barragem da Vale, em 2019. “Com o rompimento da barragem da Vale não tem nem água em casa para ficar tomando banho”, completa.