No mesmo trecho e às margens do mesmo rio, o Itaquaí. Entre os autores do crime está um grupo de pescadores de uma comunidade ribeirinha vizinha aos acontecimentos. Que usaram o mesmo tipo de arma com idêntico calibre. E que também enterraram os corpos, na tentativa de apagar as pistas.
Muitos paralelos podem ser feitos entre os assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips, ocorridos em 5 de junho de 2022, e uma execução a tiros de três indígenas Korubo, então vivendo em isolamento voluntário no Vale do Javari, ocorrida em setembro de 1989.
Foto: Chris Ratcliffe/Greenpeace
Uma das ligações está nas relações familiares dos autores dos dois crimes. A Pública localizou a cópia de um registro de identidade que confirma o que é dito por moradores de Atalaia do Norte (AM).
Um dos autores da chacina dos indígenas em 1989, o ribeirinho Sebastião “Sabá” Conceição da Costa, já falecido, vinha a ser o sogro de Oseney da Costa de Oliveira, o “Dos Santos”, um dos três presos pelo assassinato de Bruno e Dom e irmão do principal acusado pelo crime, Amarildo da Costa de Oliveira, o “Pelado”.
O massacre de 1989 foi um dos vários episódios sangrentos na relação entre indígenas isolados e os ribeirinhos, seringueiros, pescadores, caçadores e madeireiros do Vale do Javari ao longo de décadas. Em 1996, um relatório do indigenista Rieli Franciscato mencionou a ocorrência de “pelo menos 62 conflitos” entre indígenas e não indígenas num período de 70 anos, a partir da década de 1920.
“Nesse contexto hostil e perverso, aguerridos na defesa da terra e de seu povo, os ‘Korubo’ (conhecidos como caceteiros) foram uma das maiores vítimas desse processo brutal de ocupação e de exploração", escreveu Rieli.
Foto: Ibama/PF
Quando o nome de “Pelado”, foi revelado nas investigações sobre o assassinato de Bruno e Dom, indigenistas experientes se surpreenderam com a sua participação, pois ele havia integrado, em 2002, uma expedição organizada pela Funai para reprimir invasões ao território indígena.
Reprodução/TV Globo
Um olhar mais atento sobre o passado da região, o que deve incluir a chacina de 1989, porém, mostra que o ambiente no qual “Pelado” cresceu e viveu está muito longe de considerar a violência um meio não adequado para solução de conflitos.
O indigenista Fabrício Amorim disse que na região há um histórico de violência. No caso que vitimou Bruno e Dom, “há uma diferença”. “Os assassinatos de Bruno e Dom são os primeiros de não indígenas praticados por não indígenas [em torno da proteção das terras indígenas]”, disse.