Um despacho assinado pelo presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, pode fazer com que a União deixe de receber ao menos R$ 3,6 bilhões em multas por infrações ambientais.
Marcelo Camargo/Agência Brasil
As informações são de um levantamento exclusivo feito pela Agência Pública. A medida também abre a possibilidade de infratores condenados pedirem de volta o dinheiro já pago.
Divulgação Ibama
O valor apurado pela reportagem se refere a 6.297 processos administrativos atualmente com o status de “AI notificado via edital para alegações finais”. Nessa fase, os infratores têm mais uma chance de se manifestarem antes da avaliação de uma autoridade julgadora do Ibama.
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Em 2021, Bim chegou a ficar três meses afastado do cargo por decisão da Justiça por causa de outro despacho que teria beneficiado madeireiros em esquema de contrabando. O caso, investigado pela Polícia Federal (PF), levou à saída de Ricardo Salles do ministério.
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Documentos obtidos pela Pública mostram que o presidente do Ibama começou a aplicar seu próprio entendimento sobre as multas antes mesmo de oficializá-lo no Diário Oficial da União, em março.
Meses antes do despacho, Bim contrariou uma normativa da Procuradoria Especializada do Ibama e decidiu pela prescrição de um processo por considerar que a notificação via edital não tinha validade.
Foto: Edilson Rodrigues/AS
“Estamos anistiando todas as infrações [notificadas para alegações finais por edital] praticadas de 2008 a 2019. É um estímulo total [ao crime ambiental]. É tipo ‘olha todo esse trabalho que o Ibama vem fazendo, isso tudo não vale nada, nós [o governo de Jair Bolsonaro] conseguimos cancelar’”, afirmou uma analista do Ibama ouvida pela reportagem.
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Durante os três primeiros anos do governo Bolsonaro, o orçamento do Ibama diminuiu, saindo de R$ 102,9 milhões em 2019 para R$ 82,9 milhões em 2021. Enquanto o dinheiro que pode ser perdido pela União com o despacho de Bim é bilionário, o orçamento do órgão responsável pela fiscalização é medido em milhões.
Entre as dez maiores multas aplicadas pelo Ibama identificadas pelo levantamento e que poderiam, em tese, ser beneficiadas pelo despacho de Bim estão grandes empresas como o banco Santander e a ferroviária Rumo Malha Norte, além de infratores conhecidos, como Pedro Cordeiro, que com a família figura entre os maiores desmatadores de unidades de conservação na Amazônia.
Bruno Kelly/Amazonia Real
Cerca de 80% do total de multas na fase processual de notificação para alegações finais via edital envolve infrações contra a flora, que vão de desmatamento e transporte ilegal de madeira a queimadas.
A canetada ainda afetou o moral na instituição, denunciaram os analistas ouvidos. Como presidente do órgão, Eduardo Bim deveria ser “o primeiro a defender a gente”, mas não o faz, comentou um funcionário do Ibama. “É como se o nosso trabalho não valesse de nada”, desabafou.