Na fronteira entre Brasil, Peru e Colômbia, fazendeiros de coca peruanos, os “patrões”, enviam barcos para recrutar indígenas brasileiros que vivem nas comunidades à beira do rio para trabalhar nos “roçados” para a produção de cocaína.

Os indígenas, sobretudo os jovens, são atraídos pelo prometido pagamento em cidades que quase não têm oportunidades de emprego. Os municípios do Alto Solimões são marcados pela desigualdade social elevada e baixo IDH, segundo os indicadores do IBGE e do índice de Gini.

O Alto Solimões possui a maior densidade populacional indígena do país, segundo o último censo do IBGE. São cerca de 65 mil indígenas vivendo na zona urbana dos municípios, de acordo com os dados reunidos pelo Núcleo de Estudos Socioambientais da Amazônia (Nesam).

Quando se inclui a população residente nas terras indígenas situadas nas áreas rurais dos municípios, o número chega a cerca de 123 mil indígenas de pelo menos 13 grupos étnicos em 35 territórios demarcados e em diferentes estágios do processo de demarcação.

Nas comunidades indígenas visitadas pela Pública, é comum ver pichações nas paredes com referências a facções criminosas com presença local como o Comando Vermelho e Os Crias.

Ouvimos, sob a condição de anonimato, indígenas do Alto Solimões que trabalham em cultivos no Peru há décadas. Apesar de os roçados existirem na fronteira há muito tempo, eles contam que o recrutamento vem se intensificando nos últimos anos.

“Aqui não tem trabalho. Lá [nos roçados], eu ganho pelo menos R$60 a diária. Os patrões dão alojamento, alimentação, dão tudo”, afirma José*, um indígena Tikuna residente em uma das comunidades visitadas pela Pública.

Ele diz que o máximo que já ganhou na cidade foi descarregando barcos em um dos portos locais, o que lhe rendia R$ 400 mensais. Recolhendo folhas de coca nas roças para ajudar a fazer a pasta base nos laboratórios das fazendas, já ganhou R$ 4 mil em uma semana.

Os rios que atravessam o Trapézio Amazônico deságuam em áreas portuárias cada vez mais importantes na logística de exportação de drogas na Amazônia, como a região metropolitana de Manaus e a cidade de Santarém.

“Estamos na tríplice fronteira. Não tem fiscalização, não tem segurança na fronteira. As pessoas chegam aqui pelo rio Javari, a maioria são os peruanos que vêm de lá. Chegam com drogas, com armas e ninguém revista”, afirma o cacique Isaque Bastos, de Benjamin Constant (AM).

Servidores da Funai ouvidos pela Pública sob anonimato por temerem represálias internas no órgão disseram ter conhecimento do assédio do narcotráfico às áreas indígenas. “Quando tem alguma denúncia, ela é encaminhada para a PF. Mas a Funai não tem poder de polícia”.

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