O que te levou a protocolar um pedido de impeachment contra o presidente Jair Messias Bolsonaro (sem partido)?
Eu venho acompanhando a questão de quebra de decoro do presidente já há um certo tempo, desde o carnaval, os vídeos eróticos que ele compartilhou, e a forma que ele trata a imprensa. Eu entendia que era uma questão sim de quebra de decoro. Mas eu achava que era pouco ainda para que se pudesse pleitear um impeachment do presidente. Quando começou a fazer os chamamentos para aquelas manifestações [15 de março de 2020], começou uma escalada autoritária, com as redes sociais, com as pessoas na rua, muitos se opondo aos demais poderes.
Ao perceber que havia um direcionamento do presidente da República para que se fizesse isso, tentando fragilizar os demais poderes para que ele viesse a exercer autoridade sobre eles, anulando os demais poderes, eu percebi que ali havia uma violação clara do artigo 85 da Constituição e do artigo 4º da Lei de Impeachment. Eu vi que ele estava realmente atentando contra o livre exercício do poder legislativo e judiciário, acuando os poderes ao convocar manifestações antidemocráticas. Eu percebi que havia o dolo da parte dele de anular, agir contra os poderes, conclamar a população, para que ele viesse a ter um poder que suplantasse os outros, ali ele estava simplesmente expondo os alicerces do estado democrático, querendo transformar isso em um estado autocrático, em uma ditadura. Ele simplesmente sendo a palavra final de todos os embates. Nesse momento eu propus o impeachment do presidente, ele cometeu um crime de responsabilidade e temos que buscar a sua responsabilização.
Qual a importância, enquanto cidadão comum, de propor o impedimento do presidente?
Obviamente, é um juízo político antes de tudo, mas eu acho que é uma grande ferramenta nas mãos de qualquer cidadão exercer a cidadania apontando os cometimentos desses crimes de responsabilidade pelo presidente.
Dos 38 pedidos que foram protocolados, 27 foram de cidadãos comuns. Poucos parlamentares se propuseram a protocolar um pedido...
Eu sou advogado, eu atuo muito em tribunais superiores de Brasília, e quando eu fui protocolar o pedido de impeachment eu busquei apoio de alguns parlamentares, mas ninguém quis. As pessoas não queriam, tinham medo. Na verdade, quando eu fui protocolar esse pedido as pessoas me diziam para ter cuidado. A minha família tinha medo porque eles faziam uma pressão muito grande atacando as pessoas e eu não quis me intimidar, porque eu acho que isso é uma arma fascista. É uma forma de colocar medo nas pessoas de poderem exercer a sua cidadania. Isso é um direito meu como cidadão, de apontar os crimes de responsabilidade do presidente da república. E o dever do Congresso é processá-lo.
Eu entendo que há um juízo político. E que agora nessa questão da pandemia não é o momento de se iniciar o processo, porque prejudicaria as pessoas, com essa instabilidade. Mas eu entendo que em algum momento ele deve ser processado. Eu acho que as pessoas estão despertando, por eu ter sido um cidadão comum que foi lá protocolar um pedido, depois disso muitas pessoas entraram em contato comigo, eu acho que isso ajuda as pessoas a se insurgir contra um governo que elas estavam com medo. Nós não podemos nos intimidar com a prática de crime de responsabilidade pelas autoridades, independente de quem sejam.
Vendo agora o que tem acontecido, é algo muito prejudicial ao país, principalmente agora vendo o que tem acontecido. Nós somos o único país do mundo que além de ter um problema de saúde pública, um problema econômico, nós temos um grave problema político. E quem cria isso é o presidente da República.
O que falta para a câmara dar um parecer favorável ou negativo em relação aos pedidos protocolados?
O regimento da Câmara não impõe prazo para as análises. A Constituição deixa claro que é um juízo político, que é trabalhado dentro de um arcabouço jurídico, mas em um processo político administrativo. É uma atividade atípica do legislativo. E o juiz do legislativo, diferente do judiciário, é um juízo político.
Eu, como jurista, entendo que a câmera deve se manifestar em um tempo razoável. Quem propõe uma medida extrema, porque o impeachment é uma medida extrema, tem que ter resposta do estado dentro de um tempo razoável.
O presidente da câmara vendo que a sociedade, são cidadãos protocolando estes pedidos, não são grupos políticos. Eu mesmo faço parte de um grupo político, agora eu me filiei a um partido de direita (PSD), mas depois de protocolar o pedido de impeachment.
Eu nunca fui filiado a partido nenhum e não tenho nenhuma inclinação partidária, mas eu vejo que o presidente está errado. E o presidente da câmara precisa fazer essa análise, grande parte da população está insatisfeita com a postura do presidente.
Eu acho que o Maia erra em relação a isso, acho que é uma postura equivocada que precisa ser revista, e precisa fazer a análise dos pedidos e dar encaminhamento aos que ele entende viável.
Agora, se eu fizesse um juízo político, talvez nesse momento eu não faria porque o país está vivendo uma questão de mil mortes diárias. Então talvez isso colocasse mais fogo, mais instabilidade na administração pública. Mas, ele tem que sopesar esses interesses. Ele está lá para isso.