Por que o senhor decidiu entrar com pedido de impeachment contra o presidente Bolsonaro?
Eu vejo que a Constituição Federal celebra um compromisso com cada um de nós, garantindo que a cidadania é um dos fundamentos da República. Por essa razão, a cidadania não é somente o direito de votar e ser votado, mas uma autorização/compromisso de auxiliar na correição de rumos naquelas situações em que há um abuso de direito. O presidente Jair Bolsonaro ataca a democracia, portanto na defesa desta é que legitimamente propomos a sua cassação.
O senhor já tinha entrado com pedidos de impedimento contra outros políticos antes?
Pedi a cassação do ex deputado federal Eduardo Cunha, então presidente da Câmara Federal. Meu pedido foi apensado a outro existente, proposto por um deputado federal, e só “caminhou” quando o Cunha já estava cassado e preso. Um lástima.
Quais crimes foram cometidos pelo presidente, na sua opinião?
Creio que o presidente violou o artigo 4º da lei 1079/50 ao convocar atos contra o STF e o legislativo. Isso ocorreu já no mês de fevereiro deste ano, o que me motivou a pedir a instauração do impeachment. Contra ele e seu vice, já que Mourão concordou publicamente com o crime.
E pelo vice-presidente, também denunciado em seu pedido?
Mostramos a convivência do Hamilton Mourão com a postura delituosa. Em episódios posteriores ao meu pedido [26 de fevereiro], a postura dele foi bem ativa nos ataques aos demais poderes. Ele criticou decisões judiciais do STF que o desagradavam, e isso é crime de acordo com o inciso VIII do art. 4º da Lei dos Crimes de Responsabilidade.
O seu pedido tem como base a convocação de manifestações contra o Congresso por parte do presidente no final de fevereiro. Desde então, o presidente participou de muitos outros atos que atacam as instituições, em um contexto de pandemia. Como o senhor vê essas ações?
Em nosso Código Penal, no artigo 71, está prevista a figura do “crime continuado”, quando o delinquente, mediante uma ação ou omissão pratica crimes seguidos, da mesma espécie.
Bolsonaro faz isso, repete as mesmas condutas, contando com a inoperância de quem deveria fiscalizar, como o próprio Supremo Tribunal Federal, o Parlamento e a Procuradoria-Geral da República. Há um claro “jogo de empurra” entre as instituições, que inclusive são vítimas dos ataques do presidente, mas se calam, encorajando o infrator.
Além do seu pedido, outros 26 pedidos aguardam análise do presidente do Congresso, Rodrigo Maia. Como o senhor vê a demora nessas análises?
Vivemos uma escassez de lideranças, os dirigentes do Congresso e do próprio STF não estão a altura do momento triste que vivemos, em todos os sentidos. O presidente Rodrigo Maia torce para que o Supremo despache os processos que podem levar à cassação de Bolsonaro, enquanto ele permanece na zona de conforto.
Nesses outros pedidos, o presidente é acusado de cometer outros crimes, como intervenção na Polícia Federal e obstrução de justiça no caso Marielle. Como o senhor vê essas outras acusações?
Gravíssimas. Nos meses de março, abril e maio de 2020 foram feitas novas revelações mostrando a ingerência de Jair Bolsonaro nas instituições do sistema de justiça. Ele teve acesso a inquéritos sigilosos, pediu diligência à PF para ouvir um preso de segurança máxima sobre o namoro do seu filho, tem uma conduta desastrosa na condução da crise do coronavírus. Creio que Bolsonaro comete infrações todos os dias, que individualmente são crimes passíveis de cassação do mandato.