Famosa pelo rio que a margeia, o Araguaia, e pelo histórico de violência no meio rural, Conceição do Araguaia, no Pará, tem apenas 36 mil habitantes e duas emissoras de televisão, repetidoras do SBT e da Record, que produzem programas locais.
O canal 10, que retransmite o SBT, está sob o comando do radialista Nildo Monteiro e funciona ocupando um canal da prefeitura. Monteiro concorreu a vereador em 2010. Derrotado nas urnas, virou assessor da Câmara Municipal e fez o acordo com a prefeitura para implantar a TV.
O canal 18, retransmissor da Record, é administrado por outro derrotado nas urnas: Eduardo Queiroz, que concorreu a prefeito em 2010 e a deputado estadual em 2012, pelo PR. A expectativa é de que voltará a concorrer a prefeito na próxima eleição.
O prefeito Valter Peixoto, do PT, assinou com Nildo Monteiro um contrato de cessão de direito de uso do canal 10 por dois anos. Um projeto de lei para renovar a cessão por longo prazo tramita na Câmara.
Oriundo da Ilha do Marajó, Nildo Monteiro passou por emissoras de rádio em várias cidades do Pará e faz reportagens como colaborador para veículos de outros estados. “Eu toco a TV sozinho. O dinheiro que pinga é muito pouco. Gastei R$ 38 mil em equipamentos e estou endividado pelos próximos cinco anos. Pode parecer clichê, mas estou nisso por amor”, disse ele.
Falante, acelerado, ele transmite o noticiário diretamente da rua porque não possui estúdio. “Como eu não tinha dinheiro para montar uma estrutura, bolei o programa Cidade em Movimento, que pode ser feito sem estúdio. Um dia eu gravo na praça, outro dia eu transmito da feira. Quando chove ou quando está muito quente, eu alugo um espaço.”
A prefeitura de Conceição do Araguaia recebeu três canais de retransmissão de TV em 1987, no governo de José Sarney. Um dos canais retransmite a Bandeirantes, com sinal muito ruim e sem programação local. O outro está fora do ar desde que um temporal derrubou o transmissor. A prefeitura tem um programa aos sábados na TV de Nildo Monteiro. O assessor de comunicação do prefeito, Rogério Brasil, diz que há repasses de dinheiro público à emissora.
Acostumado a reportagens investigativas, Monteiro diz que se sentiu um “infrator” quando começou a vender anúncios para manter a TV. Achava que não podia colocar publicidade no ar por ser um canal público, mas disse que foi tranquilizado por técnicos da Anatel.
O jornalista tem dois ajudantes: Lázaro Rodrigues, de 37 anos, e Nielson Taveira dos Santos, de 34. O primeiro, mais experiente, ensina o ofício ao segundo, que era servente de obras antes de se aventurar na TV.
Troca de donos
A outorga da TV Rio Norte, canal 18, que retransmite a Record em Conceição do Araguaia, está em nome de um político conhecido no sul do Pará: Nagib Mutran Neto, ex-prefeito de Marabá. Ele se elegeu vereador em 2012, pelo PMDB, quando informou possuir 1.044 cabeças de gado. A Rio Norte é uma das nove retransmissoras da RCR, a Rede de Comunicação Regional, da família Mutran. Mas está em mãos de terceiros há muitos anos, por contratos de gaveta.
Iranildo Pereira da Silva trabalha na emissora desde 2006 e é responsável por colocar a programação local no ar. O atual proprietário, segundo ele, é Luiz Fernando Purcino, que vive no Canadá. O funcionário conta que a TV passou por quatro arrendatários desde que Purcino deixou o Brasil. Eram radialistas e um candidato a deputado. A troca de locatários não muda a rotina de Iranildo, que trabalha como prestador de serviço. “Só tenho de mudar o nome da empresa e o número do CNPJ no recibo de prestação de serviço”, explicou.
Eduardo Queiroz, o atual arrendatário, é contador. Ele apresenta o programa Balanço Geral ao lado da mulher, Maria Valdeíde Queiroz. Eles gravam em um cômodo com paredes e piso verdes, e o editor monta um estúdio virtual no computador. Para editar o noticiário, a emissora contrata os serviços de Edvaldo Smithe, um rapaz moreno e delgado, de 27 anos, dono da Smithe Produções, especialista em filmar casamentos e eventos.
O noticiário abre com uma sequência de imagens de ação tiradas da internet, incluindo militares prontos para o combate. Tudo sugere dinamismo, ação, rapidez e alta temperatura, mas todo o programa é gravado com um dia de antecedência. Os repórteres são dois jovens descolados que se interessam por comunicação. Um deles, conhecido como “o cara bacana”, tem um carro de som que anuncia produtos e eventos nas ruas. O outro é professor de matemática.
Iranildo começou como DJ em Xinguara, a cerca de 200 quilômetros de Conceição do Araguaia, aos 17 anos. O pai era saxofonista. De clubes ele passou a trabalhar em rádios, mas foi na TV que disse ter encontrado a verdadeira vocação.