O anistiado, o otimista, o diretor sem dinheiro e os meliantes

Outras histórias encontradas pelo caminho

Um filho de agricultor que se tornou diretor de TV no Mato Grosso, um político dos confins do Amazonas que não conseguiu se reeleger mesmo com o monopólio da comunicação sobre assuntos locais, um taxista que conseguiu um segundo canal depois de envolvido no escândalo da emenda da reeleição, um diretor de TV que investe em programas policiais porque meliantes não têm salário. Abaixo, algumas histórias e personagens típicos das miniemissoras da Amazônia Legal.

A emissora do anistiado político

Nazaire Cordovil Barbosa.
Nazaire Cordovil Barbosa (Foto: Elvira Lobato).

Aos 97 anos, Nazaire Cordovil Barbosa, ex-combatente da Marinha na Segunda Guerra Mundial, continua à frente de uma pequena retransmissora de TV na aldeia do Abade, município de Curuçá, no litoral paraense.

Finda a guerra, aderiu ao Partido Comunista e ao movimento pela estatização do petróleo – a campanha o Petróleo é Nosso–; foi preso e passou à reserva. Quando a Petrobras foi criada, foi contratado como técnico em manutenção. Ficou pouco tempo na estatal. No golpe militar, em 1964, perdeu os direitos políticos e o emprego.

Após o período militar, Nazaire foi anistiado e readmitido na Petrobras. É o associado mais antigo do Sindicato dos Petroleiros do Pará. Justiniano Prado de Carvalho, diretor do sindicato, cita a preocupação com as questões sociais e a persistência como as características mais marcantes de Nazário.

“Até hoje ele mantém uma escola para crianças carentes na comunidade onde mora. Paga as professoras, os uniformes e o material escolar do próprio bolso, sem ajuda do governo”, diz.

As filhas de Nazaire não souberam informar como ele conseguiu a retransmissora. A portaria que lhe deu a outorga foi assinada pelo ex-ministro Sérgio Motta, em 1997. O canal retransmite a programação do SBT e passa períodos fora do ar por falta de recursos.

O apresentador que virou dono de TV

Hugo Tillmann é um radialista conhecido no Sul do Pará. Ganhou fama como âncora do jornal da TV Liberal em Altamira. Em janeiro de 2015, entrou para o clube dos radiodifusores ao se tornar dono de sua própria TV, o canal 14 da cidade de Novo Repartimento.

Tillmann diz que esperou dois anos pela outorga e, embora admita que a indicação política ajuda na tramitação do pedido no ministério, sustenta que não teve padrinho. O canal está em nome da empresa Tillmann e Oliveira. Indagado sobre como conseguiu vencer os entraves burocráticos, ele respondeu: “É preciso contratar um bom engenheiro, que conheça os trâmites no Ministério das Comunicações e na Anatel. E ir à luta. Quem tem boca vai a Roma.”

Novo Repartimento tem 65 mil habitantes e está a 200 quilômetros de Marabá e a 70 quilômetros de Tucuruí. É uma cidade em crescimento econômico, que até então não tinha nenhum programa local de TV. “Percebi que tinha uma possibilidade de mercado. Havia dois canais de TV na cidade – o canal 13 da RedeVida e o canal 8, do SBT –, mas nenhum gerava programação local. E corri atrás da oportunidade”, afirmou Tillman.

A emissora foi inaugurada em março de 2015, retransmitindo a Record. Otimista, Tillmann diz que sua iniciativa despertou os concorrentes, que também começaram a fazer programação local.

A Record dá a ele duas janelas de tempo por dia para incluir sua produção: das 12h às 12h40 e das 18h às 18h30. Aos domingos, ele tem uma hora à sua disposição: das 9h30 às 10h30.

O novo radiodifusor disse estar otimista com o futuro. Pretende manter sua TV com a venda de anúncios locais. A relação com a Record, disse ele, é de parceria, e não envolve pagamento entre as duas partes. Indagado se tem planos de fazer carreira política a partir da TV, ele respondeu que não, “por enquanto”.

Enquanto isso, na televisão

Dono de TV em Gurupi é lojista e político

Com 83 mil habitantes, a cidade de Gurupi, no sul do Tocantins, chama a atenção pela quantidade de canais de TV: uma geradora, afiliada da Globo, e sete retransmissoras, todas aptas legalmente a produzir conteúdo local.

Silvério Maciel Filho é o proprietário da SilTV, canal 19, e também presidente do diretório municipal do PDT. É ainda dono da Sil Esportes, uma loja de material esportivo cujas vendas sua emissora ajuda a alavancar.

Na TV, ele faz reportagens, apresenta o jornal local e vende espaços publicitários ao comércio. Segundo disse, a venda de anúncios mal dá para cobrir os custos da emissora, que tem equipe minúscula: um repórter, um cinegrafista, um estagiário e um editor, além do próprio Silvério, que cursou jornalismo depois de comprar a TV.

O que o atraiu na radiodifusão, disse, foi a paixão pelo esporte. Antes de comprar a TV, ele arrendou horário em uma outra emissora para fazer seu próprio programa esportivo.

Em dezembro de 2002, quando o governo de Fernando Henrique Cardoso chegava ao final, o Ministério das Comunicações outorgou três canais de retransmissão à empresa Macarena Telecomunicações em três cidades de Tocantins: o 19, de Gurupi, o 56, de Palmas, e o canal 6, de Araguacema.

O empresário afirmou que comprou a Macarena em 2006, por intermédio de um escritório de advocacia, e que não sabe quem era o proprietário anterior. Seguindo uma prática corriqueira na Amazônia, ele arrendou o canal de Palmas à Igreja Adventista do Sétimo Dia, para exibição da programação da Rede Novo Tempo. A emissora de Araguacema não havia entrado no ar até a realização da entrevista com Silvério, em julho de 2015. “A cidade é muito pequena e não oferece a menor possibilidade de uma emissora se sustentar com a venda de anúncios”, justificou ele.

Por vias indiretas, a onda de arrendamento de canais a igrejas beneficiou duplamente o empresário. Além de faturar com o aluguel na capital, ele fez um upgrade na programação em Gurupi: no final de junho de 2015, trocou a RedeTV pela Band, que, segundo diz, tem uma programação mais atrativa. Isso foi possível porque a antiga afiliada da Band em Gurupi, a TV Girassol, arrendou o canal ao pastor Waldomiro, da Igreja Mundial do Poder de Deus.

Perguntei a quem pertence a TV Girassol, e Silvério respondeu com uma evasiva: “A gente nunca sabe direito. Sempre ouvi dizer que era do Eduardo Siqueira Campos”, disse, referindo-se ao deputado estadual, ex-senador e ex-prefeito de Palmas.

O meliante é a estrela na TV de Cacoal

Com 90 mil habitantes, a cidade de Cacoal, em Rondônia, tem cinco emissoras de televisão com programação local. Uma delas é a TV Allamanda, canal 13, retransmissora do SBT.

O programa de maior audiência da emissora é o Comando Policial, que, como o nome indica, privilegia a cobertura de crimes. Ele é transmitido diariamente das 11h30 às 13h45.

Diretor da emissora há doze anos, Valdecir Lopes, 42, disse que não tem recursos financeiros nem mão de obra qualificada para produzir programas culturais. Bem humorado, explicou a razão da abundância dos programas policiais nas pequenas emissoras da Amazônia Legal: “No noticiário policial o meliante é a estrela. E ele não cobra para aparecer na TV. Se o apresentador é bom questionador, tem boa desenvoltura e faro para a notícia, o programa está viabilizado.”

Além do Comando Policial, a TV tem um segundo noticiário, o Allamanda Notícias, que vai ao ar das 18h15 às 18h40. E aos domingos transmite a missa direto da catedral.

Concorrente da Allamanda, a retransmissora da Record em Cacoal – TV Candelária, canal 46 – terceirizou a produção de conteúdo. O Cidade em Destaque, que vai ao ar do meio-dia às 13h40, é produzido pelo publicitário Jenézio Lima e transmitido simultaneamente por mais duas emissoras de cidades vizinhas: o canal 10 de Pimenta Bueno e o canal 8 de Espigão do Oeste.

Na contramão do concorrente Valdecir Lopes, Jenézio diz que o programa é uma “revista eletrônica” e que prefere o noticiário “soft”. “Jamais mostro violência”, diz.

O programa foi exibido durante 14 anos pela KTV, afiliada da TV Cultura, pertencente ao ex-vice-prefeito de Cacoal Luiz Carlos Katatau. Para Jenézio, a oportunidade de mudar de emissora surgiu com a implantação do canal 46, afiliado da Record, que pertence ao ex-presidente da Assembleia Legislativa de Rondônia Everton Leoni.

Segundo o apresentador, a concorrência entre emissoras de TV em Cacoal é maior do que a existente na capital do estado, Porto Velho. “É algo meio doido, que não tem explicação.”

Quem é o dono desta emissora?

Como muitos de seus conterrâneos, o paranaense Dirceu Zanatta, 40, deixou sua cidade de Ivaiporã quando jovem em busca de novas oportunidades no Mato Grosso. Estabeleceu-se em Sorriso, um dos municípios de maior produção de soja do país. Lá entrou para a política e se elegeu vereador pelo PMDB, em 2012. Em 2014, candidatou-se a deputado federal, mas não foi eleito.

Também como tantos outros políticos, Zanatta buscou ter sua própria TV e arrendou o canal 6, afiliado do SBT. Entrevistado por telefone, ele disse que a emissora é viável economicamente porque Sorriso é uma cidade próspera, de 80 mil habitantes.

O canal está registrado em nome da empresa Teles Pires, mas o vereador disse não conhecer os nomes que aparecem como sócios no sistema de informações da Receita Federal: Ieso Bento Vasconcelos, Marta Machado Ramos e Harrison Ormond. Quando entrou no negócio, afirmou, a empresa já estava sob responsabilidade de outras pessoas. Zanatta disse que tem uma parceria com o proprietário da emissora, cujo nome não quis revelar.

Perguntei se ele não considera as retransmissoras de TV inseguras do ponto de vista jurídico, já que não possuem concessões como as geradoras. “Minha segurança é o contrato com o SBT”, respondeu de pronto, demonstrando estar convencido de que tem um negócio garantido nas mãos. O contrato com o SBT é renovado a cada três anos.

Zanatta disse que tem uma relação de parceria tanto com o SBT quanto com o proprietário da retransmissora. Com o primeiro, a relação não envolve pagamento: “Temos um horário na grade de programação para produção de conteúdo local e a responsabilidade pela qualidade desse conteúdo é nossa. Já o dono da outorga do canal recebe uma parte do lucro do negócio.”

De provedor de internet a dono de TV

À medida que a rede de banda larga das companhias telefônicas se espalha pelo interior da Amazônia Legal, pequenos provedores de internet se veem obrigados a mudar de negócio. Foi o caso de Jean Carlos Rodrigues Pereira, empresário da cidade de Confresa, no norte do Mato Grosso.

“Fui a primeira pessoa a oferecer internet na região. Mas quando a Oi implantou o ADSL [tecnologia de banda larga], matou os provedores locais. Os que persistem enfrentam muitas dificuldades para ter link”, explicou o empresário.

Jean Carlos fez uma parceira com o grupo Gazeta, afiliado da Record no estado, e implantou o canal 12, que estava fora do ar. Investiu R$ 80 mil em equipamentos, segundo disse. O sinal da emissora cobre treze municípios, num raio de 35 quilômetros. Com duas equipes de jornalismo e um total de nove funcionários, ele é responsável pela cobertura jornalística em toda sua área de cobertura. O jornal local tem 1 hora e 15 minutos de duração e vai ao ar de segunda a sexta-feira.

A TV Gazeta terceirizou a gestão do canal pelo período de quinze anos. Jean Carlos diz que não se trata de arrendamento, porque ele não paga a Gazeta pelo uso do canal. “Temos uma parceria em que eu tenho várias obrigações a cumprir. A principal delas é manter o canal no ar. A outorga do canal pertence à Gazeta e, se ficar fora do ar, ela estará sujeita a multa.”

A TV de Jean Carlos é a única existente em Confresa com produção de conteúdo local. A TV Centro América, afiliada da Globo no estado, possui uma retransmissora na cidade, o canal 9, que apenas repete a programação gerada na capital. Para o empresário, seria melhor se houvesse mais competidores gerando conteúdo, o que ajudaria a criar uma cultura no comércio local de investir em publicidade.

Arrendada após irritar o prefeito

Uma emissora de televisão, mesmo pequena, é uma arma política de grosso calibre, como se viu em Barra do Bugres, um município a 150 quilômetros de Cuiabá, em 2012.

A cidade, de 30 mil habitantes, tem uma pequena retransmissora que produz conteúdo local: a TV Independência, canal 9, afiliada Record. É administrada por um ex-presidente da Câmara municipal, Orlando Cardoso Chaves, apresentador do programa Tribuna do Povo.

Sob o comando de Chaves, a emissora foi uma crítica implacável da gestão do ex-prefeito Wilson Oliveira, do PSD (2009-2012). Em reação, ele apertou o pescoço de uma repórter diante da câmera ligada, causando protestos.

Pouco depois, o assessor jurídico do então prefeito arrendou a TV, o apresentador foi afastado e as críticas à prefeitura cessaram. Terminado o mandato do prefeito, Chaves reassumiu a emissora. Ele sustenta que faz jornalismo e que a TV fiscaliza o poder público.

Em 2009, cinco empresários da cidade se juntaram para solicitar ao Ministério das Comunicações um outro canal de TV para a cidade, em nome da Associação Metropolitana de Comunicação. À frente do projeto está o ex-locutor de rádio Odair Alves Lara. “A cidade está mal servida de comunicação. Tem uma rádio comunitária e uma TV que funcionam como instrumento político. Fora isso, restam apenas os blogs”, disse Odair.

Filho de agricultores comanda TV em Colíder

Filho de agricultores, Wesley Bras Tavares começou a trabalhar em televisão ainda adolescente. Tinha 16 anos quando uma prima lhe arrumou emprego na TV Tropical, canal 13, afiliada do SBT em Colider, no Mato Grosso.

De operador de máster – o computador que interrompe o sinal captado do satélite para incluir a programação local –, ele passou a cinegrafista, repórter e diretor da emissora. Assumiu a direção em 2008, no lugar de Nilson Santos, ex-deputado estadual e atual prefeito de Colider pelo PMDB.

A TV faz parte da rede de comunicação criada pelo ex-governador Silval Barbosa, também do PMDB. Wesley contou que o ex-governador montou a emissora, em 1998, mas sempre delegou a gestão a terceiros.

A TV se mantém com a venda de publicidade. O faturamento mensal, segundo o diretor, é de cerca de R$ 15 mil, para manter dez empregados. A prefeitura gasta R$ 1.500 com publicidade na TV, respondendo por 10% do faturamento.

Perguntei a Wesley o que atrai os jovens para a profissão, tendo em vista que os salários são baixos. Para ele, a perspectiva de construir uma carreira política a partir da visibilidade dada pela TV é um atrativo. “Televisão é um caminho muito bom para se construir uma carreira pública. Quando o apresentador assume causas de interesse da população e cobra limpeza de ruas, conserto de estradas e atendimento de saúde, ele faz seu nome.”

A emissora produz três programas locais: um noticiário policial diário, o Repórter em Ação, no horário do almoço; um resumo do noticiário no final da tarde, o Cidade Notícia, e um programa de variedade, aos sábados, inspirado no Mais Você, de Ana Maria Braga.

Wesley se disse preocupado com o futuro. Até dezembro de 2018, a emissora terá de migrar do sistema analógico para o digital. A migração custará R$ 200 mil, e ele não vê como bancar a despesa com o faturamento da TV. Se o proprietário Silval Barbosa não fizer o investimento, antevê que terá de buscar uma alternativa profissional.

Uma pequena TV na Cabeça do Cachorro

No interior do Estado do Amazonas não há retransmissoras de TV de empresários ou políticos locais, que funcionem como unidades de negócio independentes. Todas as outorgas de retransmissão de TV pertencem às redes geradoras. O fenômeno é atribuído ao isolamento dos municípios e ao vazio demográfico. A exceção é a TV Quirino, canal 10, de São Gabriel da Cachoeira, região isolada na fronteira do Brasil com a Colômbia e Venezuela, conhecida como Cabeça do Cachorro.

São Gabriel da Cachoeira.
São Gabriel da Cachoeira (Foto: Natalia Viana / Agência Pública).

A pequena retransmissora pertence a um político: o ex-prefeito Raimundo Quirino Calixto, que ocupou o cargo em dois mandatos –1986 a 1988 e 2001 a 2014. Calixto disse que sempre foi político e que a emissora não influenciou seu desempenho nas urnas. De fato, ele não se reelegeu em 2004 e foi novamente derrotado na eleição para prefeito em 2008, quando concorreu pelo PRP.

Calixto conseguiu o canal em 1988, por portaria do então ministro das Comunicações, Antônio Carlos Magalhães. A TV está em franco declínio, e não tem mais programação local.

No início, a TV retransmitia o SBT e tinha noticiário próprio. O SBT não renovou o contrato, e Calixto passou a retransmitir o sinal da RedeTV. Por fim, em 2015, passou a veicular a programação da Rede Vida, da Igreja Católica, na qual inclui anúncios locais.

O ex-prefeito é comerciante de produtos eletrônicos e não depende financeiramente da receita da emissora. Mas a empresa tem valor econômico. Na campanha eleitoral de 2008, ele informou ao TSE que a TV valia R$ 90 mil.

O vereador Jerônimo Almeida Ferreira, do PTB, testemunhou que o ex-prefeito é uma exceção à regra de que políticos usam meios de comunicação para atacar adversários e se promover. Para o vereador, a emissora se enfraqueceu por causa da proliferação das antenas parabólicas. Como não existem outros canais na cidade, a população não se sente estimulada a colocar uma segunda antena para captar o sinal local. Ele próprio diz que não vê a TV Quirino há vários anos.

TV nasceu de projeto de assentamento

Tucumã é um dos muitos municípios do sul do Pará que nasceram dos projetos de povoamento da Amazônia promovidos pelo regime militar. A agrovila foi implantada em 1981 e hoje é uma cidade de 36 mil habitantes. Colonos chegavam em busca de terras e ficavam isolados, sem informações do resto do país. Para romper o isolamento, criaram o Conselho Comunitário de Desenvolvimento de Tucumã e pleitearam um canal de TV.

Em 1988, o então ministro Antônio Carlos Magalhães autorizou duas retransmissoras para o conselho: o canal 12, em Tucumã, e o canal 4, em São Félix do Xingu, ambos para retransmitir a TV Globo. O canal de Xingu está desativado há mais de dois anos.
No cadastro da Anatel, o canal 12 ainda consta como retransmissor da Globo, embora desde 2007 tenha migrado para a Record. A emissora está registrada em nome de um conselho comunitário, mas, na prática, é um canal particular do vereador Anivaldo Julião de Lima, do PV, presidente da Câmara Municipal de Tucumã e membro do diretório nacional do Partido Verde.

Conhecido como Anivaldo Savanas, o político disse que a emissora deixou de produzir programação local em 2013, por causa da crise econômica e do aumento da competição pela publicidade. Segundo ele, criar conteúdo local custaria pelo menos R$ 10 mil por mês.

Atualmente, há cinco retransmissoras na cidade – da Globo, Bandeirantes, SBT, Record e TV Mundial – e a competição por anúncios em Tucumã é acirrada. Nenhuma das cinco emissoras tem programação própria local. Savanas calcula que o bolo publicitário total de Tucumã, para rádios e TVs, é de R$ 50 mil por mês.

Ele disse que a prefeitura não gasta com publicidade na TV e que sua emissora estaria proibida de assinar contrato com a prefeitura. “A TV Carajás não pode ter contrato com a prefeitura porque sou vereador e estou impedido de prestar serviço ao município.”

Savanas está no terceiro mandato como vereador, e afirmou nunca ter usado a TV em seu benefício político.

O taxista que ganhou duas TVs no Acre

Dizem que um raio não cai duas vezes no mesmo lugar. Para a sorte, porém, não parece haver limite de coincidência. Valcy de Souza Campos é um homem de poucas palavras. E de muita “sorte”. Ele foi contemplado com dois canais de retransmissão de TV em governos distintos, e para a mesma cidade: Senador Guiomard, na região metropolitana de Rio Branco, capital do Acre.

Ex-taxista, Valcy ficou nacionalmente conhecido em maio de 1997, no escândalo sobre a compra de votos para a aprovação da emenda constitucional que permitiu a reeleição para presidente da República, governadores e prefeitos.

O nome de Valcy apareceu por causa da divulgação de um telefonema em que o então deputado Ronivon Santiago, do Acre, afirmava ter recebido o canal 40, em Senador Guiomard, do então ministro das Comunicações, Sérgio Motta, em troca de seu voto pela reeleição.

O canal havia sido outorgado à empresa VN Imagem e Som, da qual Valcy, na época taxista, e sua mulher, Nilza Freitas, manicure, eram proprietários. Segundo reportagens publicadas no período, Valcy morava em uma casa emprestada pela sogra. A emissora, a TV Quinari, estava instalada num cômodo de seis metros quadrados, onde ele e dois ajudantes operavam os equipamentos para manter o canal no ar.

Valcy negou ser laranja do deputado Ronivon, que acabou por perder o mandato. Passado o escândalo, o ex-taxista voltou ao anonimato, e por uma década e meia não se ouviu falar mais dele.

Depois desse tempo, Valcy obteve uma outra retransmissora de TV em Senador Guiomard, o canal 25. A outorga foi dada à empresa Rede Quinari de Comunicações, da qual Valcy tem 99% das quotas. A portaria de outorga do canal foi assinada em junho de 2010 pelo então ministro das Comunicações, José Artur Filardi, do grupo político do ex-senador Hélio Costa (PMDB), de Minas Gerais.

Valcy já tinha passado o canal 40 adiante quando recebeu o segundo. Em maio de 2013, a imprensa do Acre noticiou que a Igreja Assembleia de Deus de Rio Branco comprara o canal 40 do ex-deputado federal Júnior Betão, do PL, por R$ 1,5 milhão, e que o dinheiro fora arrecadado entre os fiéis.

Por telefone, Valcy de Souza Campos deu curtas explicações sobre os dois canais. Leia a entrevista:

O senhor vendeu o canal 40?
Tive problemas e passei adiante.

Problemas financeiros?
Mais ou menos isso.

O senhor vendeu para o ex-deputado federal Betão Júnior?
A gente passou para uma pessoa aí. Fiz uma besteira e graças a Deus consegui outra TV, que vai ser a minha aposentadoria.

Saiu na internet que a TV foi revendida a uma igreja por R$ 1,5 milhão.
Tem essa fofoca.

O senhor vendeu por menos?
Não quero comentar. Eu estava com problema e passei a TV adiante pra resolver.

Para quem o senhor vendeu o canal 40?
Faz tanto tempo que eu não me lembro.

O senhor era taxista. Por que decidiu montar uma TV?
Porque eu gosto. Fico feliz quando alguém assiste à minha TV.

Como o senhor conseguiu o segundo canal? Foi com ajuda de algum político?
Eu não desisto fácil das coisas. Sou brasileiro. Tenho o mesmo direito de ter uma TV que um gari ou o presidente da República. Eu montei um projeto e corri atrás. Demorou quase dez anos para eu conseguir o segundo canal.

O senhor foi a Brasília para isso?
O processo de retransmissora é técnico. Padrinho político funciona, mas também funciona a força da gente. Telefono, mando e-mail e memorando.

Quando vale uma retransmissora de TV em Senador Guiomard?
A minha não tem preço. Vai ficar para os meus filhos e netos.