Pedido 0052

Proposta por

Deborah Duprat, Mauro de Azevedo, Silvio de Almeida e outros

Em análise há 1780 dias

Art. 5º,7º, 8º e 9º da Lei de Impeachment

Por Laura Scofield e Raphaela Ribeiro

Nos últimos 4 anos, Deborah Duprat atuou como procuradora federal dos Direitos do Cidadão, finalizando seu mandato em maio de 2020. Com mais de 30 anos de atuação e defesa da democracia, Duprat, afirma: “Se você tem um presidente que atenta tanto contra a democracia, ele precisa ser afastado. Não é porque o impeachment foi mal usado no passado que ele pode ser evitado agora. Porque, do contrário, nós acabaremos esse período com as instituições absolutamente em colapso.”

Por Natalia Viana

“É preciso salvar a democracia”, diz Deborah Duprat
Qual a vantagem do pedido de impeachment ser assinado por diversas organizações e figuras, além da petição que foi assinada por mais de 3000 mil pessoas e instituições? Eu acredito que tudo tem uma simbologia. O número de assinaturas não corresponde ao número exato de pessoas, quando falamos de organizações falamos de coletivos que transcendem e muito as assinaturas. Isso dá uma dimensão muito grande da sociedade civil organizada e também de personalidades. Então isso tem uma simbologia grande. Mas o mais importante nesse documento, é o protagonismo das lutas populares. As lutas populares fizeram acontecer a Constituição de 1988 e, agora em 2020, estão tratando de salvar a Constituição. O pedido lista diversos crimes que teriam sido cometidos por Bolsonaro, na saúde, na  cultura, no meio ambiente, entre outros. Na sua opinião, quais foram os crimes mais graves cometidos pelo presidente? Eu diria que são três fundamentos centrais no pedido: a probidade administrativa, com o desmonte do Estado, a captura das instituições, a chegada de pessoas não técnicas para tratar de assuntos técnicos, o desprezo pelo conhecimento acumulado dos servidores públicos, uma política contra os temas próprios de cada pasta dos ministérios. Esse é um ponto que está na probidade administrativa. Outra, são os direitos fundamentais desses grupos prioritários, indígenas, quilombolas, a questão ambiental. E, por último, os compromissos internacionais. Vocês oferecem destaque aos crimes definidos no artigo 5, os crimes contra a existência da União, que abordam as mudanças nas políticas externas do governo. Por que o consideram importante? Isso refere-se principalmente aos tratados internacionais. Se pegarmos a questão racial, você tem a convenção contra a discriminação racial. Se pegarmos a questão de gênero você tem a convenção dos direitos da mulher contra todo tipo de violência. Você tem a Convenção 69 da OIT sobre indígenas e quilombolas e outros povos e comunidades tradicionais. Existem muitos acordos internacionais que tratam da questão ambiental. Então, esse artigo foi um dispositivo muito tratado. O impeachment é a melhor saída no momento?  Eu acredito que o impeachment não só é a melhor saída, como eu acho que ele é urgente. Pela análise da petição, fica bastante evidente que esse é um processo cada vez mais progressivo. Há um avanço sobre os direitos, um avanço sobre os espaços estatais, um desmonte mesmo. Se a gente não conter esse processo, ao final de quatro anos não terá sobrado nada de algo que foi construído desde o governo Collor, que é o primeiro governo eleito democraticamente, em 1990. O que a instauração do processo de impeachment significaria em um ambiente político já esgarçado? Olha, não dá para avaliar a repercussão imediata disso no ambiente político. Eu só acho que é preciso salvar a democracia. Há muita literatura escrita sobre a chegada do fascismo na Europa através do voto, no final da década de 30. Desde então, as constituições pós-guerra apresentam instrumentos para a salvaguarda da democracia, uma delas é o crime de responsabilidade. Se você tem um presidente que atenta tanto contra a democracia, no sentido mais substantivo de democracia como realização de direitos fundamentais para todas as pessoas, ele precisa ser afastado. Não é porque o impeachment foi mal usado no passado que ele pode ser evitado agora. Porque, do contrário, nós acabaremos esse período com as instituições absolutamente em colapso. Há outro caminho além do impeachment para o afastamento do presidente? No momento nós não temos outra alternativa. No restante do mundo há providência de caçar o funcionamento de partidos políticos que veiculam ideias e propósitos contrários à democracia. O Bolsonaro não tem nem partido agora. Não tem nem como você imaginar o não funcionamento desse partido, ele congrega um grupo que não tem uma institucionalidade que possa ser questionada. Então não tem alternativa a não ser o crime de responsabilidade e o impeachment.

Resumo do pedido

Representantes de organizações da sociedade civil, artistas e intelectuais, protocolaram um pedido coletivo de impeachment contra o Presidente Jair Messias Bolsonaro, no dia 14 de julho de 2020. Entre os 66 autores do pedido, há entidades como CUT, UNE e MST, além de personalidades como o cantor Chico Buarque, a procuradora Deborah Duprat, o jornalista Juca Kfouri, o humorista Gregório Duvivier e a atriz Dira Paes. Mais de 3.000 pessoas e organizações também demonstraram apoio ao pedido assinando uma petição incluída na peça.

O pedido, pautado na suposta infração dos artigos 5º,7º, 8º e 9º da Lei de Impeachment, afirma que a “desconstrução sistemática de direitos políticos, individuais e sociais” é “traço constante da atuação do Presidente”. Classifica os crimes de responsabilidade que teriam sido cometidos em: violações específicas a direitos políticos, individuais e sociais; violações à segurança interna; crimes contra a probidade da administração; e crimes contra a existência da União. De acordo com a peça, Jair Bolsonaro cometeu violações ambientais; culturais; aos direitos da população negra e das comunidades quilombolas; aos direitos dos povos indígenas; aos direitos individuais e coletivos dos trabalhadores; e aos direitos da população LGBTQI.

A primeira infração apresentada refere-se à temática ambiental, baseada no aumento excessivo de agrotóxicos liberados nos últimos meses, no desmonte do sistema de fiscalização ambiental e no enfraquecimento de órgãos como ICMBio e Ibama, o que teria resultado no aumento de desmatamentos e incêndios em áreas de preservação. Para corroborar, o pedido cita ainda a fala do ministro do meio ambiente, Ricardo Salles, na reunião ministerial do dia 22 de abril de 2020, onde ficaria explícita a intenção de “passar a boiada” em reservas ambientais, o que demonstraria a política anti ambientalista do governo.

O pedido elenca ainda o desmonte de políticas culturais e o rebaixamento do Ministério da Cultura ao nível de secretaria. De acordo com a peça, Bolsonaro “empreendeu uma verdadeira perseguição às produções que não se alinham às crenças e aos valores dos grupos políticos que dão suporte ao seu governo”, o que teria resultado no direcionamento ideológico do recursos do Fundo Setorial Audiovisual e da direção de editais, assim como a paralisação do financiamento público de iniciativas culturais. Os autores destacam ainda a preservação do patrimônio cultural e histórico nacional, que têm sido “ameaçados com o corte de recursos e a substituição de pessoal técnico por não técnico”.

O “desprezo pelos direitos sociais” do Presidente também ficaria explícito nas medidas provisórias 927 e 936, criadas em meio à pandemia para regular o trabalho. O pedido considera que as ações do governo federal tiveram como resultado “reduzir direitos das trabalhadoras e dos trabalhadores e beneficiar a classe empresarial, sem, contudo, garantir nem gerar empregos”. A peça também indica que a postura “discriminatória” de Bolsonaro estaria fomentando o aumento da violência contra a população LGBTQI.

Ao “desrespeitar” diretrizes científicas para o enfrentamento da pandemia, reter orçamento de emergência aprovado pelo Congresso e gerar “conflito” com autoridades, o Presidente estaria cometendo crime contra a segurança interna (art. 8º, incisos 7 e 8 da Lei nº 1.079). A falta de um plano federal de contenção da crise sanitária, com “insuficiente, desordenada e atrasada adoção de medidas efetivas”; o incentivo ao uso de medicamento sem eficácia comprovada; além do desmonte do SUS, Previdência Social e direitos dos trabalhadores atentariam contra a probidade da administração (art. 9º, incisos 3, 4 e 7, da Lei do Impeachment).

Por fim, a peça apresenta as ações de Bolsonaro que seriam contra a existência da União, considerando a soberania nacional e relações exteriores. São elas: criação de acordos “subservientes e prejudiciais ao interesse nacional”; fomento de conflitos com outras nações, em “desrespeito à autodeterminação” delas; “violações” a tratados nacionais de direitos humanos e políticas ambientais; e descumprimento de normas jurídicas de acordos internacionais. As condutas estão descritas no art. 85, I e IV da Constituição e no artigo 5º e 8º da Lei do Impeachment.

Avise o Congresso que você quer acompanhar essa proposta 374

Pedido 0052 na íntegra