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Microplásticos, fotossíntese e o risco de milhões passarem fome

Eles estão em todo lugar, no nosso cérebro e na superfície das folhas, impedindo as plantas de se alimentarem

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11 de abril de 2025
06:00

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Outro dia, na redação da Agência Pública, a colega Mariama Correia soltou uma interjeição de puro choque diante de uma notícia: “Vocês viram que a quantidade de microplástico que a gente tem no cérebro é equivalente a uma colherinha de plástico?”

Tinha passado batido por mim mais esse estudo que mostra como os microplásticos se tornaram onipresentes no nosso mundo, em outros animais, nos nossos próprios corpos. A cada hora a gente descobre que esses danados chegaram a mais algum lugar e ameaçam a saúde humana e do planeta. Foi inevitável imaginar uma daquelas colheres branquinhas que a gente usa apenas uma vez e logo joga fora boiando na minha cabeça.

Não é assim, claro, mas você entendeu.

O trabalho, que foi publicado em fevereiro na revista Nature Medicine, apontou que amostras de cérebro de pessoas que morreram em 2024 tinham quase 50% mais microplásticos do que amostras das que morreram em 2016. E os cérebros de pessoas com demência tinham muito mais microplásticos do que de quem não tinha demência, sugerindo uma relação entre as partículas e a doença. 

O New York Times fez uma boa reportagem sobre o assunto e dá para ler uma tradução na Folha. O trecho que explica a ideia da colherinha é esse: “A concentração média de microplásticos em 24 cérebros humanos de 2024 era de quase 5.000 microgramas por grama. Isso é cerca de 7 gramas de plástico por cérebro – tanto quanto compõe uma colher descartável, ou cerca de cinco tampas de garrafa de água”. Apavorante.

Mas, ao procurar por essa história, me deparei com uma outra também sobre os riscos de microplásticos que, honestamente, me assustou ainda mais. A poluição por essas micropartículas já está sendo capaz de reduzir a capacidade de plantas de fazerem fotossíntese. Grosso modo, ao se grudarem nas folhas, por exemplo, os microplásticos impedem que elas absorvam a luz.

O trabalho, publicado em março na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), estimou que já houve uma redução de 7% a 12% na fotossíntese de plantas terrestres e de algas marinhas e de água doce. Fotossíntese, para quem não lembra das aulas de biologia e química, é a forma como as plantas se alimentam, basicamente transformando luz, água e gás carbônico em açúcar e oxigênio.

Sem fazer fotossíntese, claro, elas morrem. E isso já está sendo observado em plantas que a gente consome em gigantescas quantidades em todo o mundo. Os pesquisadores estimam que a poluição plástica já levou a perdas de 4% a 13,52% nas plantações de trigo, arroz e milho.

“A humanidade tem se esforçado para aumentar a produção de alimentos para alimentar uma população cada vez maior; esses esforços contínuos agora estão sendo prejudicados pela poluição plástica”, afirmam os pesquisadores, liderados por Huan Zhong, da Universidade de Nanquim, na China. Segundo eles, as descobertas ressaltam a urgência de agir para reduzir essa poluição a fim de proteger o suprimento global de alimentos.

Um cenário que pode ficar ainda pior quanto mais plástico a gente jogar no ambiente. E que se soma a outra ameaça à produção agrícola – as mudanças climáticas –, que ano a ano já têm levado a severas quebras de safra em todo o mundo. O preço do café, do azeite, do cacau que o digam!

Mas não são só os altos preços o problema. O alerta dos pesquisadores é que isso pode significar um risco iminente de aumento da fome no mundo.

Eles apontam que, em 2022, cerca de 700 milhões de pessoas foram afetadas pela fome em todo o mundo em consequência de conflitos, eventos climáticos extremos, choques econômicos e aumento da desigualdade.

“Espera-se que a exposição aos microplásticos exacerba essa crise, com o aumento de centenas de milhões de pessoas sob risco de fome”, escrevem os autores. O cálculo que eles fazem é de que pelo mais 400 milhões de pessoas entrem nessas condições nas próximas duas décadas em decorrência do aumento da poluição.

As crises ambientais se juntam e se intensificam. É preciso lidar com todas ao mesmo tempo e agora.

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