Uma comissão especial da Câmara dos Deputados aprovou na quinta-feira (5) a Proposta de Emenda à Constituição nº 99 de 2011 (PEC 99/2011), que dá às entidades “religiosas de âmbito nacional” e àquelas representativas dos municípios o direito de propor ações diretas de inconstitucionalidade (ADI) e ações declaratórias de constitucionalidade (ADC) ao Supremo Tribunal Federal (STF). Com a aprovação no colegiado, o substitutivo proposto pelo relator Bonifácio de Andrada (PSDB-MG) precisa do crivo do plenário para seguir ou não para o Senado Federal.
“Colocamos entidade de caráter nacional exatamente para explicar que não é uma igreja em si que vai ao Supremo, mas as associações”, explica o deputado federal Ronaldo Fonseca (Pros-DF). Ele presidiu a comissão especial – composta majoritariamente por parlamentares evangélicos – que analisou a PEC 99/2011, proposta de autoria do presidente da Frente Parlamentar Evangélica, o deputado João Campos (PSDB-GO). “Esse é um tema caro pra nós, pois, da forma como está na Constituição, sempre ficamos à deriva, na dependência de que outras instituições entrem na causa em nosso nome, mesmo quando se trata de leis que afetam a liberdade religiosa e de culto.”
Como exemplo de instituições que teriam acesso ao STF, ele cita a Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil e a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil, entre outras, mas acredita que o Supremo deverá decidir as entidades habilitadas para entrar com ADCs e ADIs. Segundo Fonseca, além das liberdades religiosas, “temas não diretamente ligados à religião” poderão ser alvo de ações por parte das entidades representativas das igrejas. “É o caso daquilo referente à família, que é um dos centros das nossas preocupações”, detalha, mencionando hipoteticamente o questionamento de eventuais leis sobre o aborto e o uso de drogas.
Para o professor de Direito da Universidade de Brasília, Mamede Said, nada impede que, caso aprovado o texto, entidades nacionais ligadas a religiões orientais ou de matriz africana também possam apresentar ações ao Supremo. “A discussão é caso a caso, em face do concreto. Claro que a interpretação do Supremo vai gerar um entendimento que tende a se estender para outras ações similares”, analisa. Segundo ele, o STF pode utilizar critérios para admitir ou não ações de algumas das instituições. Das entidades de classe e sindicais, por exemplo, a Corte costuma exigir a pertinência temática entre a ação, os efeitos da lei questionada e a atuação do autor da ação. Já os partidos políticos, entre outros, podem ajuizar qualquer tipo de ação.
Para o constitucionalista, o contexto em que se dá a aprovação da PEC na comissão especial diz muito por si só. “Essa proposta vem em um momento em que há uma mistura indevida entre religião e política, em que a bancada religiosa, especialmente a evangélica, se organiza de forma mais incisiva para ocupar espaços e tentar interferir nas mais diversas discussões. Há, porém, questões que transcendem o ponto de vista religioso e não podem ser analisados somente a partir da doutrina e dogmas de uma religião.”
Atualmente, de acordo com a Constituição, só podem entrar com ADIs e ADCs no Supremo o presidente da República, o Procurador-Geral da República, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, partidos políticos com representação no Congresso Nacional, confederações sindicais ou entidades de classe de âmbito nacional e as Mesas do Senado Federal, da Câmara dos Deputados, das Assembleias Legislativas estaduais e da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF).