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Influenciador denunciado pela Procuradoria atua com Eduardo Bolsonaro por punições que podem ‘salvá-lo’ da Justiça

Reportagem
29 de maio de 2025
14:00

“Eu abro a porta, eu sou o coração, mas você é o cérebro”, afirmou o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) ao influenciador Paulo Figueiredo, em vídeo publicado na última terça-feira, 27 de maio, no canal de Figueiredo no YouTube. A declaração se refere às articulações que ambos têm feito nos Estados Unidos (EUA) para pressionar por sanções contra autoridades e instituições brasileiras. “Você, Paulo, tem contribuído muito”, elogiou o filho de Jair Bolsonaro (PL).

Neto de um ex-presidente da ditadura, ex-sócio de Donald Trump e integrante da ala mais radical do bolsonarismo, Paulo Figueiredo tornou-se o principal aliado de Eduardo Bolsonaro na ofensiva internacional contra ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), especialmente Alexandre de Moraes. Ele contou, em março do ano passado, também em seu canal no YouTube, que passou a frequentar o Congresso americano logo após as eleições presidenciais de 2022, “em busca de apoio”.

Figueiredo atua nos EUA contra o STF enquanto é alvo no Brasil do inquérito das fake news, além de ter sido denunciado pela Procuradoria-Geral da República por tentativa de golpe, com pedido de prisão preventiva em aberto. A denúncia contra Figueiredo está no chamado núcleo 5. Os outros quatro núcleos já tiveram as denúncias analisadas pela primeira turma do STF, com 31 denunciados se tornando réus. Os casos envolvendo Figueiredo estão sob relatoria de Moraes.

Já Eduardo Bolsonaro passou a ser investigado por coação e obstrução de justiça, após a Procuradoria-Geral da República (PGR) apontar que ele está tentando interferir no processo criminal contra o pai, o ex-presidente Jair Bolsonaro, e “perturbar os trabalhos técnicos” do inquérito das fake news.

Por que isso importa?

  • A atuação de Paulo Figueiredo e de aliados bolsonaristas podem levar a sanções contra Alexandre de Moraes e membros do STF.
  • Além disso, o deputado licenciado é alvo de inquérito pela sua atuação nos EUA, o que pode levar a denúncia e eventual condenação.

O inquérito contra o parlamentar, que se licenciou do cargo em 20 de março de 2024, após decidir morar nos EUA por um período ainda indefinido, foi aberto nesta segunda-feira, 26 de maio, pelo STF.

O pedido da PGR à Corte ocorreu após o secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, afirmar em audiência no Parlamento americano, em 21 de maio, que está analisando a possibilidade de aplicar punições a Alexandre de Moraes, com base na Lei Magnitsky.

A declaração foi feita em resposta a uma pergunta do deputado republicano Cory Mills sobre a possível aplicação da legislação, que prevê sanções econômicas contra pessoas envolvidas em violações de direitos humanos ou corrupção. “O senhor consideraria sancionar o ministro da Suprema Corte Alexandre de Moraes sob a Lei Magnitsky?”, perguntou Mills. Rubio respondeu: “Isso está sob análise e há uma grande possibilidade de que isso aconteça”.

Reunião antecedeu a fala contra Moraes no Congresso dos EUA

Uma semana antes desta audiência, Mills, que preside o subcomitê de inteligência das relações internacionais no Capitólio, havia se reunido com Paulo Figueiredo, Eduardo Bolsonaro e o presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados, Filipe Barros (PL-PR). “Essa interação que dá resultado no mundo real, não fica apenas no boca a boca”, disse Eduardo Bolsonaro em vídeo gravado após o encontro, que ocorreu em 14 de maio.

Eduardo destacou ainda a proximidade entre Mills e Marco Rubio, já prevendo o que viria a acontecer na audiência, no dia 21 de maio. “Vale lembrar também que ele [Mills] é uma pessoa que se relaciona com o poder executivo aqui nos EUA. Não deve demorar para ter encontros, inclusive, com o Secretário de Estado Marco Rubio”, afirmou. “Fiquei realmente impressionado porque foi uma reunião com grau de objetividade muito grande. E um deputado já familiarizado com a situação do Brasil, o que mostra que todo esse trabalho de formiguinha, de bater de porta em porta, já surtiu efeito”, acrescentou Paulo Figueiredo, no vídeo.

Uma semana depois, Rubio mais uma vez se referiu a sanções que podem alcançar o Brasil, apesar de não ter citado o país. No X, ele mencionou a América Latina, dizendo que na região, “na Europa, ou em qualquer lugar, os dias de atitudes passivas com quem trabalha para minar os direitos dos americanos acabaram”.

No mesmo dia, em comunicado oficial, ele se estendeu: “Hoje estou anunciando uma nova política de restrição de vistos que se aplicará a cidadãos estrangeiros responsáveis pela censura da expressão protegida nos EUA. É inaceitável que autoridades estrangeiras emitam ou ameacem emitir mandados de prisão contra cidadãos ou residentes dos EUA por postagens em redes sociais feitas em plataformas americanas enquanto estão fisicamente presentes em solo americano”.

Rubio ressaltou ainda, que é “inaceitável que autoridades estrangeiras exijam que plataformas de tecnologia dos EUA adotem políticas globais de moderação de conteúdo ou se envolvam em ações de censura que vão além de sua autoridade e alcancem os EUA”. “Não toleraremos violações da soberania americana, especialmente quando essas violações comprometerem o exercício do nosso direito fundamental à liberdade de expressão”.

Juntos nos EUA contra o Brasil

No dia em que o deputado Cory Mills e o secretário de Estado Marco Rubio mencionaram a possibilidade de aplicar a Lei Magnitsky contra Alexandre de Moraes, o deputado brasileiro Filipe Barros sugeriu, por meio das redes sociais, que a provocação de Rubio durante a audiência teria sido fruto da articulação dos bolsonaristas.

No entanto, em entrevista concedida ontem à Agência Pública, Barros afirmou ter “convicção” de que a fala de Rubio foi motivada pelas decisões de Moraes que afetaram cidadãos e empresas dos EUA. “Não é uma reação ao processo de 8 de janeiro. É uma reação às violações cometidas, por meio do ministro Alexandre de Moraes, contra os direitos de cidadãos e empresas norte-americanas.”

Segundo Barros, nos encontros em que participou com a presença de Mills e do deputado republicano Brian Mast foi debatido “o contexto político como um todo”. “E eu percebi nas duas conversas a preocupação deles com a jurisdição norte-americana”, reforçou.

A Pública apurou ainda que Filipe Barros, junto à comitiva de parlamentares brasileiros da Frente Parlamentar do Livre Mercado, que também esteve nos Estados Unidos no início de maio, se reuniu com representantes da SpaceX, empresa do bilionário Elon Musk — que, coincidentemente, ontem anunciou que vai deixar seu cargo na equipe dedicada a cortes de custos no governo dos EUA.

Segundo uma fonte que participou do encontro e pediu anonimato, havia forte indignação entre os interlocutores norte-americanos: “Eles estão com muita raiva porque o STF mexeu no bolso deles e não vão deixar barato. Esse era o clima na reunião”, relatou a fonte, referindo-se ao bloqueio de R$ 18,3 milhões das contas da Starlink e do X (ex-Twitter) por descumprimento de decisões judiciais brasileiras.

Ainda de acordo com essa fonte, embora as articulações de Eduardo Bolsonaro e Paulo Figueiredo tenham influência, “a disputa principal do governo americano é, de fato, em defesa das big techs atingidas por decisões do ministro Moraes”.

Em fevereiro de 2025, Paulo Figueiredo chegou a sugerir em uma conversa com Elon Musk, no X, o uso da Lei Magnitsky contra Alexandre de Moraes. Na ocasião, Musk respondeu: “Interessante”.

Herdeiro de Olavo de Carvalho

A proposta de utilizar a legislação dos EUA contra Moraes ecoa uma antiga ideia do ideólogo Olavo de Carvalho, falecido em 2022. Em 26 de agosto de 2020, Olavo escreveu no X: “A Lei Magnitsky é a maior ou única esperança de um Brasil livre de comunolarápios”.

Pouco mais de quatro anos depois, Figueiredo disse em um dos vídeos no seu canal do YouTube que fica “absolutamente radiante de estar dando seguimento às ideias do professor Olavo de Carvalho”.

“Você acha que Olavo morreu? Olavo não morreu não, Olavo vive através de nós”, destacou.

Figueiredo segue uma trajetória semelhante à de Olavo de Carvalho. Assim como seu professor, começou a ter visibilidade com atuação em veículos da grande mídia. Enquanto Carvalho começou escrevendo colunas para grandes jornais, como a Folha de S. Paulo, Figueiredo ficou anos na rádio Jovem Pan.

Ele teria usado, inclusive, seu espaço na Jovem Pan, além de suas redes sociais, para pressionar o comando do Exército a aderir o golpe, conforme a acusação da PGR no processo da trama golpista.

Figueiredo atualmente tem um programa no YouTube em que comenta sobre política. Ele mora nos Estados Unidos desde 2016. Olavo de Carvalho viveu 17 anos no país. Ainda seguindo os caminhos do “guru”, Figueiredo vende um curso sobre política e história alinhado às ideias da extrema-direita, que foi oferecido a sete deputados bolsonaristas às vésperas da posse de Donald Trump, em janeiro. “Parabéns ao Paulo Figueiredo pelo seu curso “O Fim da América. Esse comentarista é alguém que cada vez mais merece ser ouvido com atenção”, escreveu no X Olavo de Carvalho em 23 de março de 2021.

Edição:
Reprodução Redes Sociais
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