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Governo britânico ameaça entrar na embaixada do Equador; chanceler equatoriano diz que pode ir a Tribunal de Haia

Reportagem
15 de agosto de 2012
20:24
Este artigo tem mais de 12 ano

“Esta é uma decisão soberana, protegida pelo direito internacional”, afirmou o chanceler equatoriano Ricardo Patiño após anunciar a decisão de conceder asilo político ao fundador do WikiLeaks  Julian Assange na manhã desta quinta-feira, em Quito.

Ao explicar a decisão, Patiño disse que o governo equatoriano considera Assange um “profissional de comunicação reconhecido internacionalmente pela sua luta a favor de liberdade de expressão”, e que há “sérios indícios de intenção de retaliação” pelo país que produziu os documentos vazados. O governo equatoriano tem “certeza de que é possível a extradição de Assange para um país fora da União Europeia” e encontrou “evidências jurídicas mostram que, se extraditado para os Estados Unidos, o fundador do WikiLeaks não teria um julgamento justo” e poderia ser “submetido a tratamento cruel e degradante”.

Patiño explicou que o Equador manteve diálogo de alto nível com Reino Unido, Suécia e Estados Unidos a respeito do caso do australiano. “Pedimos garantias que uma vez terminado o processo na Suécia, Assange não seja extraditado a um terceiro país. Por tristeza e apesar de repetidos intercâmbios de textos, o Reino Unido em nenhum momento demonstrou querer alcançar compromissos políticos, apenas repetindo o conteúdo de textos legais”.

Segundo Patiño, o Equador ofereceu às autoridades suecas para que interrogassem Assange dentro da embaixada, “para não interferir nos procedimentos” judiciais. A Suécia não aceitou a oferta. “Por outro lado, abrimos a possibilidade de que oferecessem garantias de que não haveria extradição depois do processo”. Novamente, nenhuma garantia foi dada. Segundo o chanceler, o Equador cosiderou que a justiça sueca teria tido “atitudes contraditórias” com o direito de legítima defesa.

O chanceler equatoriano também disse ter buscado informações sobre eventuais processos a Assange nos Estados Unidos. “A resposta foi que não poderiam oferecer informações sobre Assange pois este é um assunto bilateral entre Equador e Reino Unido”.

Tribunal de Haia

O pronunciamento de Ricardo Patiño teve início com um forte  protesto contra a carta enviada na quarta-feira por autoridades britânicas, afirmando que o Reino Unido poderia prender Julian dentro da embaixada.

Patiño afirmou que as convenções internacionais sobre o direito ao exílio se sobrepõe às leis nacionais e sugeriu que o Equador pode buscar o Tribunal de Justiça de Haia caso o Reino Unido se negue a dar um salvo-conduto para que Assange saia da embaixada rumo ao Equador.

“O direito ao asilo é um direito humano fundamental, com normas imperativas respeitadas pelo direito internacional. Não é possível haver disposições em contrário”, disse, completando que “a convenção de Viena autoriza os estados a demandar o seu cumprimento perante a Corte Internacional de Justiça” mesmo contra a vontade do Estado que está sendo demandado.

Pelo Twitter, o Ministério do Exterior do Reino Unido declarou estar “desapontado com o discurso do Ministro do Exterior do Equador, que concedeu asilo político a Assange”. O Ministério ainda defende que a obrigação legal de extraditar o fundador do WikiLeaks para a Suécia permanece, uma vez que foram esgotadas todas as possibilidades de recurso perante a corte britânica. “A decisão do governo equatoriano não muda nosso compromisso com a extradição e nós permanecemos comprometidos em negociar uma solução que nos permita levar a cabo nossas obrigações de acordo com o Ato de Extradição”, complementou o Ministério via redes sociais.

Reino Unido: podemos prender Assange dentro da embaixada 

Em uma carta enviada nesta quarta-feira ao Ministério do Exterior do Equador, o governo britânico deixou claro que não permitirá que o fundador do WikiLeaks Julian Assange deixe a embaixada, mesmo se conseguir asilo político no país latinoamericano – e que está preparado para tomar medidas drásticas para extraditar o australiano.

Por volta da meia-noite desta quarta-feira, horário britânico, um grupo de policiais londrinos se concentrou em frente à embaixada onde Assange se encontra desde junho, quando pediu asilo político.

O comunicado oficial, divulgado pelo ministro do exterior equatoriano Ricardo Patiño  – que o classificou como “uma ameaça explícita” –  diz que “em caso de receber uma petição de salvo-conduto para o Sr. Assange, depois do asilo ser concedido, esta será negada, de acordo com as nossas obrigações legais”.

“Devemos reiterar que consideramos que o uso contínuo de instalações diplomáticas feito desta maneira é incompatível com a Convenção de Viena e insustentável, e que já deixamos claro as sérias implicações disso para nossas relações diplomáticas. Vocês devem estar cientes de que há base legal no Reino Unido – Lei sobre Instalações Diplomáticas e Consulares de 1987 (Diplomatic and Consular Premises Act 1987) – que nos permitiria tomar ações para prender o Sr. Assange nas próprias instalações da Embaixada”, diz a carta.

“Sinceramente esperamos não ter que chegar a esse ponto, mas se vocês não podem resolver o assunto da presença do Sr. Assange em suas instalações, esta possibilidade se abre para nós”.

A carta foi enviada após o Guardian publicar declarações anônimas de fontes governamentais do Equador dizendo que o presidente Rafael Corrêa havia decidido conceder asilo político a Assange.

O ministro Patiño afirmou, em nota, que o governo de Correa irá solicitar uma convocatória do Conselho de Ministros de Relações exteriores da UNASUL e uma assembleia extraordinária da OEA, “eventos em que esperamos uma resposta comum perante esta ameaça a um Estado americano.”

Em uma conferência de imprensa na noite de quarta-feira, Patiño afirmou que “O Equador rejeita nos termos mais enfáticos” a ameaça britânica “de que eles podem invadir a nossa embaixada em Londres se não entregarmos Julian Assange”.

Segundo ele, isso seria uma atitude “imprópria para um país democrático, civilizado e que cumpre a lei”. “Se a medida anunciada pela comunicação oficial britânica for levada a cabo, será interpretada pelo Equador como uma ação inaceitável, não-amigável e hostil e como um ataque à nossa soberania. Isto nos forçaria a responder”, disse o ministro. “Não somos uma colônia britânica”.

Um comunicado oficial da embaixada do Equador em Londres disse que o governo equatoriano está “profundamente chocado pelas ameaças do governo britânico contra a soberania da embaixada equatoriana e com a sugestão de que podem entrar à força na embaixada”. “É uma clara violação da lei internacional estabelecida pela Convenção de Viena”.

“Bullying”

A carta do Reino Unido começa em tom de surpresa: “Estamos conscientes das, e surpreendidos pelas, reportagens nos meios de comunicação, nas últimas 24h, dizendo que o Equador estaria prestes a tomar a decisão de conceder asilo político ao Sr. Assange”. Segundo a carta, uma reunião entre representantes diplomáticos dos dois países estaria marcada para quinta-feira, dia 16: “Dadas as declarações feitas ontem, em Quito, sobre uma decisão iminente, devemos inferir que esta reunião será a última para acordar um texto conjunto?”, pergunta a carta.

“Como já dissemos anteriormente, devemos cumprir com nossas obrigações legais de acordo com a decisão relativa à Ordem de Prisão Europeia e à Lei de Extradição de 2003 (Extradiction Act 2003), de prender o Sr. Assange e extraditá-lo à Suécia. Seguimos comprometidos em trabalhar com vocês, amigavelmente, para resolver este assunto. Mas devemos ser absolutamente claros ao dizer que isso significa que em caso de receber uma petição de salvoconduto para o Sr. Assange, depois do asilo ser concedido, esta será negada, de acordo com as nossas obrigações legais”.

Em entrevista à Pública, o porta-voz do WikiLeaks Kristinn Hrafnsson diz ser compreensível que o governo equatoriano tenha respondidos em termos tão fortes à carta. “É uma ação de bullying contra uma nação soberana”, diz ele. Segundo ele, a avaliação do WikiLeaks é que a Lei sobre Instalações Diplomáticas e Consulares de 1987 não dá diretro ao Reino Unido para invadir uma embaixada. “É uma atitude surpreendente que esta ameaça seja enviada pouco antes do Equador anunciar a sua decisão. Estão obviamente tentando influenciar na decisão do governo de Correa”, disse.

“Eu espero que as autoridades britânicas baixem o tom destas ameaças e negociem com as autoridades equatorianas, parece ser o melhor a fazer”, diz Hrafnsson.

Assange teve seu pedido de extradição à Suécia, onde é investigado por crimes sexuais, referendado pela Corte Suprema britânica em junho. Desde então, ele está na embaixada do Equador pedindo asilo político no país.

Assista à movimentação diante da embaixada por livestream.

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