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São João das Bets: empresas de apostas avançam na festa junina de Campina Grande

Bet 7k se tornou uma das principais patrocinadoras do evento que recebe mais de 3,5 milhões de pessoas

Reportagem
26 de junho de 2025
04:00
Apresentação de quadrilha no São João de Campina Grande (PB), na Praça do Povo, centro da cidade
Tomaz Silva/Agência Brasil

Na 42ª edição do Maior São João do Mundo, em Campina Grande, Paraíba, uma marca disputa atenção com o forró e as bandeirolas coloridas. A Bet 7K, plataforma de apostas e cassino online, tornou-se um dos nomes mais visíveis do evento. Neste ano, ela é uma das três principais patrocinadoras da festa junina.

Com início em 30 de maio e programação até 6 de julho, a festa atrai milhares de pessoas diariamente ao Parque do Povo. Segundo dados da Prefeitura de Campina Grande, a edição deste ano deve movimentar mais de R$ 740 milhões na economia local. A estimativa é que mais de 3,5 milhões de pessoas frequentem o evento.

“É viciante. A gente acha que uma hora vai dar certo, que vai conseguir recuperar o que perdeu, mas só vê o dinheiro escapando”, conta uma frequentadora da festa à Agência Pública. A mulher, que preferiu não ter seu nome divulgado, disse que começou a apostar por influência de uma amiga que dizia ganhar com frequência. “Uma amiga ganhava e me incentivava a jogar também, mas eu só perdia e cheguei a ficar sem dinheiro”, relata.

Na festa, a 7K tem estande próprio, camarote, jogos e ações de cadastro para ganhar brindes como copos e chapéus, além de outdoors pelas ruas e avenidas da cidade.

A Pública entrou em contato com a Prefeitura de Campina Grande, a Arte Produções — responsável pela organização do evento — e a empresa Bet 7K para questionar o valor investido no patrocínio. Até o momento, nenhuma das partes retornou com uma resposta.

A falta de transparência repete o padrão do patrocínio de outras festas, como o Carnaval. Em fevereiro, a Pública mostrou que casas de apostas estavam bancando carnavais pelo país sem que as empresas ou mesmo as prefeituras divulgassem os valores.

Por que isso importa?

  • As bets, como são chamadas as casas de apostas, estão dominando festas como as juninas e o Carnaval pelo Brasil, sem divulgar valores nem pelas prefeituras nem pelas empresas.
  • A Organização Mundial de Saúde classifica vício em apostas como transtorno grave.

Bets avançam sobre São João

Não é a primeira vez que uma empresa do setor de apostas patrocina o São João de Campina Grande. Em 2024, a Vai de Bet se apresentou como uma das principais patrocinadoras do evento, tendo o cantor Gusttavo Lima como “garoto-propaganda”. Meses após o encerramento do evento, tanto a plataforma quanto o artista foram alvo de investigação por suposto envolvimento em uma organização criminosa ligada à jogos ilegais. O inquérito, no entanto, foi arquivado em 9 de janeiro de 2025.

Agora, em 2025, as bets operam em um mercado regulado. Como um “feliz ano novo” do setor, a regulamentação do mercado de apostas fixas entrou oficialmente em vigor no dia 1º de janeiro deste ano. A Bet 7K é uma das autorizadas a atuar no país.

Para quem ainda não associa o nome à plataforma, a imagem de um rosto familiar ajuda. O jogador de futebol Hulk, Givanildo Vieira de Sousa, natural de Campina Grande, estrela campanhas da marca e reforça a ligação entre a empresa e o evento.

Ano passado, uma reportagem do Estadão mostrou que a 7K teria um curso que ensinaria pessoas a criarem depoimentos falsos de ganhadores com a aposta. Nas aulas, as pessoas aprenderiam e forjar conversas no WhatsApp comemorando ganhos com a aposta, construir robôs e até usar o ChatGPT para gerar anúncios que redirecionaram para jogo do tigrinho e outros.

Em 2025, além de patrocinar o São João de Campina Grande, a 7K também está em festas juninas de Petrolina e Surubim, em Pernambuco; São Luiz e Imperatriz, no Maranhão; e em Belém do Pará.

“Eu não conhecia [a Bet]. Só conheci através de um joguinho aqui no Parque do Povo para ganhar o chapéu [um dos brindes oferecidos pela 7K] e quando me cadastrei, vi que era uma casa de apostas”, contou Ana Paula, auxiliar de secretaria e turista vinda de João Pessoa.

Ana relata que já obteve bons ganhos em outras plataformas, mas evita grandes perdas ao interromper as apostas quando percebe uma sequência negativa. Ela admite que, após conhecer a 7K durante a festa, ficou interessada em experimentar a plataforma. “Foi a primeira coisa que eu pensei. Quando eu tiver com dinheiro, vou botar um pouquinho lá, apostar, depositar pelo menos uns 30 reais pra ganhar os giros grátis e ver o que é que dá”, afirma. 

Guilherme Araújo, estudante de computação, critica o patrocínio e afirma que os anúncios incentivam as pessoas a apostarem. “Dar espaço de publicidade num evento tão grande para esse tipo de coisa é prejudicial para a sociedade”, disse.

A mesma visão é compartilhada por Andreza Farias, também estudante de computação. Ela observa que a empresa mantém diversos estandes na festa, onde o principal objetivo é cadastrar novos usuários na plataforma, o que, segundo ela, estimula ainda mais a participação da população. “Uma festa do porte do Parque do Povo não deveria ter patrocínio de nenhuma bet. Tem que ter incentivo público e não de empresa de apostas”, acrescentou.

Edição:

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Victoria Freitas/Agência Pública
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