O senador Romero Jucá (PMDB-RR) está certo ao afirmar que, em tese, todos os órgãos envolvidos nos procedimentos de licenciamento ambiental continuarão a analisar e precisarão autorizar as propostas de empreendimentos “estratégicos para o desenvolvimento nacional”, como define o Projeto de Lei do Senado nº 654 de 2015 (PLS 654/2015). Aprovada nesta semana pela Comissão Especial do Desenvolvimento Nacional – criada neste ano, justamente para acelerar a tramitação dos projetos da Agenda Brasil – a proposta segue direto para a análise da Câmara dos Deputados, a menos que seja aceito recurso do próprio Jucá para que seja votada também no plenário do Senado Federal.
De autoria do próprio Jucá, o texto limita a menos de um ano, entretanto, o prazo máximo para que instituições como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) concluam todos os estudos e defiram ou não, com ou sem condicionantes, pedidos de construção de rodovias, hidrovias, ferrovias, aeroportos, portos, e obras ligadas ao setor energético e de telecomunicações.
O prazo torna inviável, em muitos casos, que as análises possam ser feitas com a profundidade e segurança necessárias, dando ouvido e voz a todas as pessoas impactadas. Nestes casos, o PLS 654/2015 propõe que a falta de manifestação do poder público em um prazo máximo de aproximadamente oito meses implique concordância com o empreendimento, que passaria a estar automaticamente autorizado. Já no modelo atual de licenciamento, desrespeitado, a pressão política para o andamento de certas obras acaba por abrir brechas para que unidades comecem a operar, como é o caso da usina de Belo Monte, acumulando o descumprimento de dezenas ou centenas de exigências dos órgãos públicos – ou, como definiu o Instituto Socioambiental (ISA), para que sejam concedidas “licenças com inadimplência”.
Advogado do ISA, Maurício Guetta alerta que os órgãos ambientais “não têm condições institucionais para dar cumprimento às normas de forma célere e eficiente”, mesma preocupação demonstrada pelo senador Cristovam Buarque (PDT-DF). “O projeto diz que o descumprimento de prazos implica a aquiescência ao processo de licenciamento. Aqui, abre uma porta para que, com qualquer ineficiência de um dos órgãos, o projeto seja aprovado mesmo que seja nocivo ao meio ambiente”, apontou o parlamentar. Como argumentou em voto em separado o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), estudos relativos a impactos hidrológicos de barragens somente podem ser realizados após a observação de pelo menos um ciclo hidrológico de um ano de monitoramento e registros. “O estabelecimento de prazos excessivamente enxutos bem como a incorporação de uma ‘licença ambiental integrada’, podemos afirmar, na prática tornará inócuo o processo de licenciamento ambiental em si”, apontou Rodrigues.
Assim, ao eliminar para as obras “estratégicas” a necessidade das três licenças (prévia, de instalação e de operação) previstas no modelo atual, instituindo uma licença ambiental integrada, e também por encurtar prazos, o projeto acaba retirando em alguns casos e, na contramão do que defende Jucá, o direito de manifestação por parte do Ibama, da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). A menos que, junto com o PLS 654/2016, o governo federal anuncie concursos para reforçar os quadros dos órgãos – medida que, em tempos de crise econômica e ajuste fiscal, parece altamente improvável.
O projeto de Jucá tem sido questionado desde antes da sua proposição, quando ainda era um dos princípios genéricos da Agenda Brasil – conjunto de medidas propostas neste ano pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que ajudariam a promover a retomada do crescimento –, mas foi preciso que acontecesse o trágico desastre ambiental de Mariana (MG), com o rompimento da barragem de rejeitos da Samarco/Vale/BHP Billiton, para que Jucá excluísse do texto inicial a simplificação dos procedimentos para empreendimentos voltados à exploração de recursos naturais, como a mineração.