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Baianas que tradicionalmente vendiam acarajé no estádio de Salvador, atualmente em reformas para a Copa, temem não reaver seus postos durante o megaevento

Reportagem
19 de outubro de 2012
09:00
Este artigo tem mais de 12 ano

No princípio, era o acarajé. E sempre foi assim para Maryjane Bomfim dos Santos, a única das oito baianas no Estádio Octávio Mangabeira, a Fonte Nova, em Salvador, a vender o quitute na arquibancada do Esporte Clube Bahia. Foi com o acarajé que Maryjane, mãe solteira, criou os quatro filhos e construiu metade da casa em que mora, e que ainda não conseguiu terminar.

“Não fui eu que escolhi. Fui criada pela tia Omília Maria de Jesus, a baiana da Fonte Nova. Ela já era vendedora e me batizou. Fui criada praticamente dentro da Fonte Nova, desde os 12 anos. Hoje tenho 51 anos, 39 anos de carteira”, conta, se referindo às carteiras da Associação das Baianas de Acarajé e Vendedoras de Mingau, a Abam, e da Superintendência dos Desportos do Estado da Bahia, a Sudesb.

Seu ponto fixo na Fonte Nova não existe mais. Em 2007, a arquibancada desabou durante um jogo entre Bahia e Vila Nova e o estádio foi fechado. Só vai reabrir depois que terminar a reconstrução nos padrões recomendados pela FIFA, para abrigar os jogos da Copa do Mundo de 2014.

Para dona Maryjane e suas sete companheiras, trabalhar durante a Copa no estádio que por tantos anos acolheu com entusiasmo seus acarajés seria uma maravilha. E um belo reforço no caixa: “Estou cheia de dívida”, conta, entre risadas. Desde que perdeu o ponto no estádio, ela vende doces na praia para sobreviver e ajudar a pagar as faculdades de dois filhos.

Mas é bem provável que dona Maryjane e suas companheiras não consigam realizar o trabalho de suas vidas durante a grande festa do futebol, em 2014.

A FIFA controla o serviço de alimentação e bebidas a ser oferecido nas áreas dos estádios onde ocorrerão os jogos da Copa do Mundo e abriu uma licitação para os fornecedores da Fonte Nova e dos outros 11 estádios-sede, em janeiro deste ano.

Como as vendedoras tradicionais não podiam se candidatar à licitação – apenas empresas – agora torcem para que sejam contratadas pela empresa vencedora. Mas, embora o “toque regional” seja um dos critérios apresentados para o fornecimento de alimentação de acordo com o documento da FIFA, não se sabe se as baianas do acarajé estão nos planos dos que disputam a licitação.

“O serviço vai ser feito por uma empresa que não se sabe de que estado vai ser. E essa empresa vai ter uma própria cozinheira, que também não se sabe quem. Por que não colocar as oito baianas que já eram de lá?”, questiona Rita Ventura, presidente da Abam. “Não vão contratar aquelas que estavam lá [no estádio] há 40 anos, vão querer contratar estrela que aparece na televisão. Temos muitas baianas de nome, que estão na mídia sempre”, especula Rita.

O único posicionamento que a Abam e suas associadas obtiveram da FIFA foi feito através de um comunicado em resposta à uma matéria veiculada pelo jornal A Tarde sobre o assunto. Nele, a FIFA reafirma a importância do oferecimento de especialidades locais em cada estádio e informa: “a nomeação da concessionária principal está programada para ser finalizada no próximo mês, por isso só poderemos oferecer mais detalhes a respeito depois disso”.

Apesar da incerteza, Maryjane acredita que ainda vai trabalhar no seu querido estádio na Copa do Mundo: “Se for permitido, como vai ser em nome de Jesus, que a gente tenha nosso cantinho, vai ser uma maravilha tanto pra gente como pro turista que vem comer o acarajé. Tá na mão de Deus e dos poderosos. Sou pequena pra saber disso”.

 

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