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Agência de jornalismo investigativo
Crônica

As vozes de Wall Street

Nossa repórter foi até o centro financeiro dos EUA para ouvir o que os ocupantes de Wall Street querem. Eles querem diálogo.

Crônica
10 de outubro de 2011
16:22
Este artigo tem mais de 13 ano

Orlando Jones, um pedreiro de 52 anos do Bronx, agora tem o seu próprio cantinho na Liberty Square, em Wall Street. Ele montou uma cadeira dessas de praia perto dos degraus de pedra que levam à entrada do parque, e conversa com quem estiver a fim de sentar e prosear um pouco.Para ele, as pessoas estão se juntando em Wall Street para trocar idéias.

“Há uma necessidade de comunicação hoje em dia. Quando eu venho para cá, não vejo as pessoas falando freneticamente nos seus celulares. Agora elas estão conversando”.

Orlando conta que foi levado a montar sua cadeirinha de praia em Wall Street porque já não via outra solução. “Eu nunca estudei. Aprendi a ler aos 21 anos de idade, e sempre trabalhei. Mas agora, você tem ideia de quanto está difícil achar um emprego? Eu sempre dei um jeito de ganhar a vida. Mas não agora”.

Milhares de norte-americanos têm histórias semelhantes. Mas aqui no movimento Occupy Wall Street, nem todo mundo está na mesma situação.

John Lowe é um arquiteto bem sucedido de 48 anos, nascido em Nova York, que tem um bom emprego.

“A cada dia que estou aqui estou perdendo uma diária de trabalho. É claro que é uma escolha difícil. Tenho a sensação que o aluguel vai atrasar este mês…”, ele diz, com um sorriso brincalhão.

John está sentado ao lado de Orlando próximo aos degraus de pedra. Há uma semana, John e Orlando eram completos estranhos, mas a busca por encontrar uma solução para a crise financeira os uniu. Eles vêm de mundos diferentes, mas hoje em dia compartilham um profundo desgosto com o jeito que as coisas estão.

Orlando acredita que “Wall Street foi construído de modo que alguns poucos lucrassem. Vamos ter que quebrar esse muro. É como o muro de Berlim, sabe? Vamos derrubar e começar tudo de novo”.

Nesse momento John diz a seu novo amigo que não concorda com a raiva a Wall Street. “Ah não, precisamos de instituições que levantem dinheiro. O que eu não concordo é que essas instituições agora estejam dando dinheiro só para uns poucos”.

São essas contradições de pontos de vista e diferenças políticas que são a essência do movimento Occupy Wall Street, segundo Ryan Venier, de 22 anos. “Isso aqui é menos um movimento que um agrupamento para reflexão”.

Ryan critica, como muitos aqui reunidos, a inabilidade da mídia em retratar o Occupy Wall Street como um encontro pela comunicação. Ele explica que manifestantes de todo o mundo se reúnem aqui não para fazer demandas políticas específicas, mas para chamar à atenção da mídia que “já basta”: “A mídia nos retrata como hippies loucos, mas tem gente de todo tipo aqui”.

É verdade. No meio da multidão está por exemplo o corretor de ações aposentado Robert Halper, que trabalhou por muitos anos em Wall Street e que agora se junta ao grupo de manifestantes.

O cenário é colorido por pôsteres anarquistas e socialistas, e de dentro de um saco de dormir azul salta uma pequena jovem de 20 anos para dizer que é, na realidade, uma conservadora.

“Veja, eu sou economicamente conservadora mas reconheço que, do jeito que as coisas vão, não teremos futuro”, diz Casey Higgins, de Richmond, na Virginia.

Ela decidiu entrar num ônibus rumo a Nova York com uma amiga, mesmo contra a vontade dos pais. A sua mãe trabalha na loja de departamentos JCPenny e o pai é analista de sistemas. Mas, não importa o quanto trabalhem, eles não vão conseguir pagar pela educação de Casey.

“O meu sonho é ir para a faculdade, mas do jeito que as coisas vão eu não vou conseguir pagar  ela educação superior até eu ter 25 anos”, diz Casey.

Sem dinheiro para arcar com a educação superior, as oportunidades vão se tornando mais restritas para a geração de Casey.

“Meus pais e outras pessoas ficam dizendo que estamos apenas reclamando, e que se trabalharmos duro vamos conseguir concretizar algo, mas nós estamos aqui porque vemos que isso não é mais possível. O espírito americano ainda está vivo e estamos aqui porque acreditamos nele”.

Casey diz que a desigualdade social nos Estados Unidos está aumentando rapidamente. “Eu por exemplo estou em algum lugar dentro da classe média agonizante”, diz ela.  “É como uma lágrima: a classe alta está acima, se tornando menor, enquanto a classe media está abaixando, tornando a base da lágrima mais grossa”.

Os manifestantes aqui de Wall Street estão dizendo que não podem mais ficar sentados enquanto a base da lágrima fica mais e mais grossa.

Matt Erickson tem 27 anos e também chegou ao fundo da lágrima. Seu pai trabalhava para uma metalúrgica chamada North Western Steel e assim ele pôde criar Matt com uma condição de classe média. Mas agora os tempos mudaram. “Naquela época, se você se candidatava a 5 empregos, recebia 4 convites para entrevistas. Agora as pessoas se candidatam a 100 vagas e nada”.

Hoje, Matt trabalha como terceirizado em uma pequena empresa que faz carpintaria em Illinois. Ele não recebe os benefícios que teria com carteira assinada, mas foi o único trabalho que conseguiu desde 2009, quando foi demitido do cargo de operador de máquinas em uma fábrica por chegar atrasado 3 vezes. “Eles acharam um motivo para me demitir e reduzir os custos. Eu não recebi nenhum benefício quando saí”.

Matt Erickson deixou sua pequena cidade em Illinois para se unir ao protesto de Wall Street logo no início, em 17 de setembro. No nono dia da ocupação, ele foi um dos que participaram da marcha que saiu da Liberty Plaza até a Union Square.

“No caminho a polícia estava pegando e detendo as pessoas”, lembra. “Eu ouvi gritos e quando me virei, bem na minha frente, vi um grupo de meninas que estavam sentindo dor depois de serem atingidas pela polícia”. A polícia Nova-Iorquina usou spray de pimenta para dispersar os protestantes.

No dia 1 de outubro, houve mais um encontro violento com a polícia. Rebekkah Olson, uma estudante de 19 anos, foi presa durante a marcha – junto com 700 pessoas.

“Eu marchei junto com centenas de pessoas desde a ponte do Brooklyn, e havia uma barricada policial esperando por nós no caminho. Eles nos detiveram e nos colocaram em camburões para nos levar até a cadeia”. Segundo ela, o protesto era pacífico, mas a polícia não.

O tenente Bhoj, da polícia nova-iorquina, responsável por fazer a segurança da Liberty Plaza ao lado de uma fila de policiais diz que não viu nenhuma violência. E não diz mais nada. “Não tenho permissão para falar dos confrontos”.

Enquanto isso, perto do saco de dormir azul de Casey, o arquiteto John Lowe define bem o grupo de pessoas que está se aglomerando em Wall Street: “Todo mundo está aqui”, diz ele. “Os velhos, os novos e os do meio”.

De fato, pouco adiante está Ward Morehouse, de 82 anos, mostrando que nunca se é velho demais para sair às ruas e protestar.

Ele é um ex-professor universitário e autor de diversos livros. “Eu fui detido muitas e muitas vezes por desobediência civil e planejo continuar mostrando minha opinião”.

Seu amigo Trent Schroyer, de 75 anos, professor no Rampo College de Nova Jersey, entra na conversa para dizer que está aqui “para conhecer pessoas e trocar ideias”.

Trent é mais um daqueles que garantem que a ocupação Wall Street é acima de tudo uma ação para compartilhar ideias. Ao seu lado, proveniente de outro mundo e outra geração, a jovem Moses Appleton, de 24 anos, diz que “uma comunidade que troca idéias constrói assim a ação”.

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