É mais ou menos isso que diz a nova versão do projeto de lei do Código Florestal Brasileiro, o substitutivo do Senado, com votação na Câmara prevista para março.
Dentre outras medidas escandalosas, há um artigo que permite o desmatamento de Áreas de Preservação Permanente (APP’s) para a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016:
“A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de Preservação Permanente somente ocorrerá nas hipóteses de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental previstas nesta Lei”. Por interesse social o código define: “a implantação de infraestrutura pública destinada a esportes, lazer e atividades educacionais e culturais ao ar livre em áreas urbanas e rurais consolidadas”.
Para a gente entender melhor a gravidade do tema, é importante dizer que o CONAMA define que as APP’s têm a “função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem estar das populações humanas”. Como exemplo estão as áreas de mananciais, as encostas com mais de 45 graus de declividade, os manguezais e as matas ciliares.
Estas áreas são tão importantes que a lei de crimes ambientais (9.605/98) prevê que qualquer intervenção não autorizada em APP’s é passível de pena de detenção de um a três anos e multa de até R$ 50.000,00 por hectare danificado. Tudo isso vai abaixo em nome dos megaeventos se o novo Código Florestal for aprovado como está.
Para o professor do Departamento de Ciências Florestais da Universidade de São Paulo, Pedro Henrique Santin Brancalion, isso colocará em risco não só o meio ambiente mas as próprias obras. “Construir em área de declive, por exemplo, onde geralmente há trombas d’agua que se deslocam em períodos de chuvas podem criar situações de tragédia como as que a gente vê na região serrana do Rio.
A instabilidade do solo também gera riscos. APP’s não são os locais mais seguros para se construir. Isso sem falar nos danos à natureza, pensando apenas na segurança das pessoas”. O professor aponta outra falha do projeto neste sentido: “Há um artigo que permite a construção de casas populares em manguezais. São áreas super instáveis! Pode porque é a população de baixa renda que vai morar ali?”
No dossiê preparado por movimentos sociais e divulgado pela Pública “Mega-eventos e violações de Direitos Humanos no Brasil”, é feita uma denúncia que mostra o quanto o projeto pode agravar a situação de populações vulneráveis que vivem nestas áreas. Segundo o documento, além do desmatamento já estar acontecendo, pessoas estão sendo retiradas de APP’s para que depois os locais recebam empreendimentos de interesse do mercado através da mudança na legilação estadual ou municipal:
“O Plano Diretor de Porto Alegre (…) já vem sendo descaracterizado e desvirtuado por leis complementares que submetem a cidade aos empreendimentos associados à Copa 2014, (…). Foram realizadas alterações no zoneamento ampliando índices construtivos e reduzindo áreas de APP”. Ainda segundo o dossiê, alterações urbanísticas sem estudos de impacto ambiental também já estão sendo feitas no Rio de Janeiro e Salvador.
Raquel Rolnik, relatora da ONU para o direito à moradia adequada, pronunciou-se sobre assunto no ano passado escrevendo na revista Carta Capital que “o que acontece em Porto Alegre mostra, na verdade, que a Copa de 2014 está sendo usada como motivo para que se altere o regime urbanístico das cidades brasileiras sem critérios, sem estudos e sem os processos de discussão públicos e participativos necessários.”
Pedro Henrique Santin engrossa este coro: “Todo o processo de discussão do novo código não foi feita de forma democrática: “É preciso que a população se mantenha atenta e cobre que o projeto de lei seja bem pensado. Depois de aprovado não haverá muito a se fazer”.
Veja a última versão do Projeto de Lei
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