Quando Jayne Medeiros de Souza, de 24 anos, acordou na manhã de quarta-feira, 10 de dezembro de 2025, a cidade de São Paulo enfrentava as maiores rajadas de vento sem chuva de sua história, que chegaram a quase 100 quilômetros por hora, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (InMet). O café da manhã mal pôde ser preparado, quando a luz acabou e, junto dela, o fornecimento de água. Logo depois, os ventos levaram o telhado de sua casa, situada no bairro do Jardim Helena, no extremo leste da capital paulista. E até às 13h desta sexta-feira, 12, dois dias depois, Souza ainda estava sem luz, sem água e sem teto.
O Jardim Helena é conhecido pelas cheias do Rio Tietê, que inundam as ruas do bairro e deixam os moradores ilhados por dias, como mostrou a reportagem da Agência Pública, em fevereiro deste ano. Desta vez, não foram as enchentes que deixaram a vida dos moradores mais difícil, e sim os quase três dias sem água e sem luz no bairro.
Souza disse que pelo menos outros dois vizinhos também tiveram as telhas arrancadas pelo vendaval e outros moradores do entorno ainda estão sem eletricidade e abastecimento de água. Ela, portanto, tem recorrido à irmã, que mora a 10 minutos de distância, para que não seja ainda mais prejudicada. “Eu tenho comprado marmitex [para almoçar]”, contou Souza. “É difícil [ficar nessa condição], eu me sinto frustrada”, desabafou.
A ventania fez com que o Corpo de Bombeiros recebesse mais de 1,6 mil chamados para ocorrências que envolviam quedas de árvores na capital e na região metropolitana, até o dia 10. No mesmo dia, a Enel divulgou que 2,2 milhões de clientes foram afetados pelas quedas de energia.
Por que isso importa?
- O vendaval recorde que atingiu São Paulo deve ser mais frequente com a crise climática, situação que afeta todo o Brasil com o aumento de eventos climáticos extremos como ventanias, chuvas e secas.
- Empresas privadas e o poder público precisam desenvolver e adaptar planos para lidar com mais eventos extremos.
A manicure Marcilene dos Santos Geraldo, de 36 anos, acordou às 8h de quarta-feira, em meio ao vendaval, preparou um café e, assim que abriu a torneira para lavar a louça, ela se surpreendeu: não havia água. “Não deu tempo nem da gente se preparar, quando veio o comunicado [no dia seguinte] já não tinha mais água”, disse.
“Eu me sinto impotente, eles simplesmente desligaram a água e a gente é quem tem que lutar […] hoje, por exemplo, ninguém tomou banho aqui”, reclamou a manicure.
O comunicado emitido pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) chegou ao conhecimento da manicure 24 horas depois e, ainda assim, pelo celular da filha dela.
A Pública questionou à Sabesp se houve interrupção no fornecimento de água antecipada ou se houve algum comprometimento nas bombas de distribuição para os moradores do Jardim Helena, mas a companhia não havia respondido até a publicação desta reportagem.
Já sobre a falta de abastecimento no geral, a empresa respondeu que “a falta de eletricidade impede o bombeamento de água para as residências. A empresa esclarece ainda que bairros vizinhos à lista de regiões afetadas também são impactados, já que os reservatórios e estações de bombeamento paralisados atendem a várias áreas do entorno”. A reportagem também questionou sobre a falta de geradores para manter o fornecimento de água, pergunta que não foi respondida.

Enel SP: falta de energia gerou pico de reclamações contra empresa
Em apenas dois dias, o número de reclamação contra os serviços da Enel Distribuição SP, empresa responsável pela distribuição de energia no estado de São Paulo, mais que quadruplicou, passando de 99 em 8 de dezembro para 445 no dia 10, segundo dados do site Reclame Aqui, obtidos com exclusividade pela Pública.
O aumento no número de reclamações se deu no momento em 2,2 milhões de pessoas foram afetadas pela falta de energia na capital e grande São Paulo e a demora no restabelecimento da eletricidade, que ainda atinge 680 mil usuários, segundo a própria Enel, que alega ainda não ter prazo para normalizar 100% do serviço.
Semáforos ainda permanecem apagados em diversas regiões de São Paulo e de acordo com a concessionária, os bairros mais afetados pela ausência de eletricidade foram Ipiranga, Centro, Mooca, Vila Prudente, Campo Limpo, Jabaquara, Vila Andrade e Limão.
O portal G1 apurou que técnicos do Tribunal de Contas da União (TCU) recomendaram à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) avaliasse a possibilidade de intervenção na concessionária Enel, pela má qualidade dos serviços prestados.
Em junho de 2024, a Câmara Municipal de São Paulo abriu uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para cobrar respostas acerca dos serviços prestados pela concessionária, referentes aos apagões de outubro de 2023, que deixaram milhões de paulistanos sem eletricidade. Na ocasião, a Enel apresentou um plano com uma série de melhorias e a CPI se deu por encerrada.
A Enel também já foi alvo de CPI na Assembleia Legislativa do Ceará, em virtude da rotina de interrupções de energia e da insatisfação da população cearense com os serviços prestados. Os blecautes rotineiros, que afetam meio milhão de pessoas semanalmente, foi revelado pela Pública, em reportagem publicada pela Pública. No caso, a concessionária disse que investiria R$ 7,4 bilhões em melhorias.

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