A lavradora jurada de morte Nilcilene Miguel de Lima recebeu um recado do crime organizado do sul do Amazonas no dia 1 de março. Ao descer da viatura da Força Nacional, acompanhada de dois policiais, ela encontrou o seu cachorro morto com um tiro no ouvido estirado perto do portão.
“Eu tô apavorada, não tem condição de ficar aqui”, ela disse, por telefone, na manhã desta sexta-feira, 2 de março. Jurada de morte, a lavradora tem proteção ostensiva pelo Programa de Proteção dos Defensores de Direitos Humanos desde outubro do ano passado.
Nem nove homens armados ao seu redor podem lhe garantir segurança em uma área dominada por madeireiros e grileiros, sem presença do Estado. Nilcilene enfrenta ameaças desde 2009, quando fez as primeiras denúncias de roubo de madeira e invasão de terras no assentamento do qual é líder (leia matéria completa aqui).
Quem achou o cachorro foi Raimundo Oliveira, marido dela. “Ele ficou em pânico, nao quis nem tirar o corpo do lugar de tanto medo. Agora tá cheio de urubu lá em casa”. O vira-lata “Chorinho” era o mais bravo dos quatro cachorros da casa e o primeiro a latir e correr para o portão quando alguém se aproximava.
Nilcilene teve que passar três dias fora e Raimundo ficou sozinho, sem a escolta. O casal acha que a ausência dos homens da Força Nacional foi notada pelos agressores. “Está muito perigoso. O Raimundo não está mais dormindo sozinho em casa. Quando eu saio, ele tem que se esconder na casa de alguém porque está correndo risco de vida”.
Assustados, Raimundo e Nilcilene não dormiram na noite passada. Ficaram ouvindo a movimentação dos madeireiros na estrada. “Fazia tempo que eu não via eles tirarem tanta madeira daqui. A serra comeu a noite toda, passaram mais de dez caminhões na estrada de casa”, diz Nilcilene.
Com o aumento das chuvas desse período, as estradas de terra que levam ao assentamento ficaram intransitáveis. A viatura da Força Nacional quebrou e Nilcilene foi obrigada a passar três noites na cidade de Acrelândia, onde fica a base da equipe policial. Por isso, Raimundo ficou sozinho em casa.
” Os madeireiros aproveitaram que a estrada está ruim e falaram pros produtores (os lavradores do assentamento) que eles consertam, desde que o povo pague com madeira. E o povo aceitou, tá todo mundo deixando eles pegarem madeira para consertar a estrada. No assentamento dá para ver as toras de árvore empilhadas. “.
O casal se preocupa com o momento em que o governo retirar a escolta. Os contratos do Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos duram três meses. O primeiro venceu em janeiro, mas a Comissão Pastoral da Terra intercedeu pela prorrogação.
“Se a escolta for embora, a gente tem que ir junto, se não eles vão me matar”.
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