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Tropa bolsonarista acua Motta enquanto jornais apertam Moraes

Defesa de “liberdade de expressão” de Bolsonaro por jornalões e ataque de deputados ao STF joga água no moinho de Trump

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8 de agosto de 2025
17:00

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Sentada na cadeira da presidência da Câmara, com uma tiara de flores nos cabelos loiros e roupas brancas, a catarinense Julia Zanatta (PL) exalava santidade com a filha de 4 meses no colo, impedindo qualquer tentativa de remoção da ocupação ilegítima. O clima estava tenso naquela noite de quarta-feira (6) quando, finalmente, Hugo Motta (Republicanos) resolveu retomar seu posto em sessão marcada para às 20h30.

Zanatta não foi a primeira a destronar simbolicamente o deputado Hugo Motta, enquanto o incauto presidente visitava alegremente obras no município de Patos (PB), governado há décadas por sua família. Nos dois dias de “obstrução física” do plenário – ou seja, “na marra” – deputados do Novo e do PL se revezaram na ocupação da Mesa. Com os rumores de intervenção da Polícia Legislativa para acabar com a baderna, a bebê era o escudo.

Motta chegou ao plenário perto das 22 horas, depois de negociações mediadas pelo deputado Arthur Lira (PP-AL), mas ainda teve que esperar um bom tempo para Marcel van Hattem (Novo-RS) ceder o lugar. Cercado por bolsonaristas e gritos por anistia, enquanto a maioria dos deputados pediam em coro do plenário para que eles descessem dali, Motta enfim fez um discurso breve, que só não foi totalmente irrelevante por ter sido proferido do assento presidencial retomado. 

Van Hattem disse à repórter Bela Mengele que só levantou da cadeira de Motta depois que os deputados Nikolas Ferreira (PL-MG) e Zucco (PL-RS), segundo ele responsáveis pelas “tratativas que estavam costurando com os líderes do PP, União Brasil e PSD”, garantiram que o acordo havia sido firmado. “A anistia e fim do foro privilegiado passam a ter apoio do PL, Novo, União PP e PSD”, disse Van Hattem, versão que não destoa muito do que foi apurado pela repórter Thais Bilenky, de que Motta teria liberado o centrão para negociar a anistia aos golpistas de 8 de janeiro.

Na quinta-feira (07), Motta negou ter incluído a anistia no acordo e prometeu até punir os que participaram do motim, mas o fato é que apesar de recuperar o posto e ganhar até um pedido de desculpas do deputado Sóstenes Cavalcante, um dos líderes da tropa de choque, o presidente da Câmara perdeu autoridade; o foro privilegiado, prerrogativa do Supremo Tribunal Federal (STF), está em risco; e a anistia, embora impopular, voltou às manchetes no momento em que o presidente dos Estados Unidos pune comercialmente o Brasil e joga a Lei Magnitsky contra o ministro Alexandre de Moraes, sob protesto de organizações internacionais de direitos humanos. 

Eduardo Bolsonaro, o filho 03, com estadia nos Estados Unidos financiada por confessos 2 milhões de reais do pai e ainda deputado, embora tenha ultrapassado seu período de licença na Câmara dos Deputados, voltou a fazer ameaças. Desta vez, com novas sanções de Donald Trump, agora contra os presidentes do Senado e da Câmara, caso não coloquem em votação a saída de Alexandre de Moraes (!) do STF e a anistia dos golpistas – de olho no livramento do pai. 

Na mesma semana, tornou-se visível a virada da chamada grande imprensa, aquela que concentra o PIB no setor da comunicação, que até então posava de patriota. Enquanto a Globo batia na tecla de que Lula estava sendo teimoso e deveria ligar para Trump, apesar das evidências de que o presidente americano não apenas não pretende conversar como faz exigências políticas humilhantes para o Brasil, os jornalões, liderados pela Folha de S.Paulo, passaram a espinafrar Moraes, alegando que ele teria ferido o direito de “livre expressão” de Bolsonaro ao impedir o uso das redes sociais pelo ex-presidente. 

Não vou aqui avaliar juridicamente as decisões de um ministro do STF, apoiado pelos colegas como mostrou a incisiva entrevista de Gilmar Mendes. Também não pretendo julgar os posicionamentos ideológicos de veículos de comunicação. Mas vamos lembrar que Moraes já havia proibido o uso das redes pelo ex-presidente, antes de decretar a prisão domiciliar de Bolsonaro por infringir medida cautelar, sem provocar a mesma indignação. Aliás, entre os juristas, há aqueles que concordam e os que discordam desta decisão, o que recomenda cautela ao emitir juízos taxativos sobre o suposto abuso de Moraes. 

Fica a pergunta: será a vontade de enfraquecer Lula, com a popularidade aumentada pela dignidade sustentada diante da agressão anti-democrática de Donald Trump, ou o receio de perdas econômicas para si e para anunciantes provocadas pelo tarifaço, que atingiu o agro em cheio, que comoveu os empresários da comunicação?

Condenar enfaticamente Moraes no momento em que um presidente de um país estrangeiro ataca o ministro por levar adiante um processo recheado de provas – como a própria imprensa reconhece – contra um ex-presidente que tentou dar um golpe de Estado no país não pode ser apenas irresponsabilidade. É intenção. 

O histórico dos “democratas” da comunicação em defesa do golpe de 1964, apoiado pelos Estados Unidos, não recomenda a credibilidade dos defensores da “liberdade de expressão” nesse momento. Menos ainda quando se unem à extrema direita, dentro e fora do Brasil, para questionar o STF e a postura altiva do governo brasileiro diante de Trump. Nós já vimos esse filme, e ele não acaba bem.

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