Às vésperas da COP30, uma nova pesquisa revela que, mesmo diante da polarização política, a maioria dos brasileiros reconhece a gravidade da crise climática. Os dados mostram um amplo consenso: de direita à esquerda, a maior parte da população apoia a demarcação de terras indígenas e reconhece que a ação humana é responsável pelas mudanças climáticas.
A Agência Pública teve acesso, com exclusividade, ao recorte do levantamento “Atitudes Climáticas num País Polarizado”, realizado pela organização More in Common em parceria com o Instituto Quaest, referente às atitudes climáticas. A maioria dos entrevistados, reconhece a importância da demarcação de terras indígenas para a preservação ambiental, pauta frequentemente alvo de disputas políticas no Congresso. Entre os conservadores, 69% concordam com essa medida, número que sobe para 92% entre os progressistas.

O estudo ouviu 10 mil pessoas em todo o país e dividiu a população em seis segmentos: progressistas militantes, esquerda tradicional, desengajados, cautelosos, conservadores tradicionais e patriotas indignados.
Mesmo entre os grupos mais à direita, há reconhecimento quase unânime de que a ação humana é responsável pelas mudanças climáticas: entre os progressistas militantes, 96% concordam com essa afirmação; entre os patriotas indignados, o índice chega a 84%, aponta o estudo.

Para Gabriela Feitosa, coordenadora de projetos e parcerias da More in Common, o resultado revela que o país é mais complexo do que o retrato polarizado costuma sugerir. “Olhar só pelo voto não explica o Brasil. Nessa grande planície, nesse meio, existem posições menos duras, mais ‘dialogáveis’. A pesquisa mostra que há um espaço de convergência, ainda que ofuscado pela disputa ideológica”, explica.
Já Helena Vieira, também coordenadora da pesquisa, afirma que o tema ambiental tem sido capturado pelo debate moral que domina o cenário político. “As guerras culturais atravessaram o meio ambiente. Ele passou a ser visto como parte de um pacote progressista — junto de temas como feminismo ou diversidade —, e isso gera rejeição em segmentos que antes se mostravam mais neutros”, observa.

Leis ambientais são vistas como empecilho para desenvolvimento
O levantamento também revela contradições. Embora a maioria priorize a proteção ambiental em dilemas como a expansão do agronegócio ou a exploração de petróleo, parte significativa dos entrevistados considera que as leis ambientais atrapalham o desenvolvimento econômico, percepção compartilhada por 22% dos progressistas e 54% dos conservadores.

Para o cientista político André César, essa ambiguidade reflete um “paradoxo informacional”: “Há pouca educação ambiental e excesso de desinformação. Isso leva parte da população a enxergar a legislação como entrave, quando, na verdade, ela é essencial para equilibrar economia e sustentabilidade”, afirma.
A advogada em direito ambiental e urbanístico Beatriz Kowalski destaca a necessidade de aprimorar o licenciamento e a fiscalização ambiental, tornando-os mais ágeis e próximos da população. “Educação e conscientização são ferramentas poderosas. A sustentabilidade deve ser incorporada como valor cívico, não apenas como tema técnico”, complementa.
A pesquisa mostra ainda que a confiança nas instituições ambientais é baixa. Mesmo entre os segmentos mais favoráveis à preservação, o Ibama inspira pouca credibilidade: apenas 49% dos progressistas militantes dizem confiar no órgão. Essa desconfiança cresce entre os grupos mais à direita, o que evidencia um desgaste institucional acumulado.
Para André César, “o Brasil entrou tardiamente no debate regulatório e ainda opera com um modelo defasado de governança ambiental. Modernizar as regras e reconstruir a credibilidade das instituições é urgente”.
Apesar das divergências, o estudo evidencia um ponto de convergência: quando confrontados entre economia e natureza, a maioria dos brasileiros escolhe a preservação. Segundo Kowalski, esse dado deve orientar a construção de políticas públicas mais integradas: “O meio ambiente precisa deixar de ser uma pauta de disputa e se tornar um projeto comum de país”, conclui.

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