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Pagos para estudar? Plano do Governo de bolsa para alunos do Ensino Médio encalhou no MEC

11 de outubro de 2023
04:00
Este artigo tem mais de 1 ano

A proposta é simples: estudou, recebeu. Um projeto previsto concebido visando ainda o ano de 2023 recompensaria financeiramente estudantes com até 21 anos, do 9º ano do ensino fundamental ao 3º ano do ensino médio. Ao longo do trajeto escolar, os jovens só poderiam acessar 40% do montante a cada ano, mas teriam acesso ao prêmio caso concluíssem o ensino médio. A iniciativa, do Ministério da Fazenda, mira diretamente na redução da evasão de alunos e foi apresentada ao Ministério da Educação (MEC) no primeiro semestre deste ano, mas, até agora, não passou por uma validação e não tem prazo para sair do papel — e terá um caminho mais duro para achar espaço no orçamento a partir do ano que vem.

Segundo apurou a Agência Pública, o investimento no programa, nomeado temporariamente de Poupança Educa+ ou Poupança Jovem, custaria R$ 3 bilhões aos cofres públicos em 2024, caso a opção fosse a de já começar remunerando os alunos dos quatro anos letivos simultaneamente. A segunda opção seria focar inicialmente no 9º ano fundamental e no 1º ano médio, apontados como os de maior evasão escolar atualmente, e progredir a cobertura anualmente.

Pagando bem…

A remuneração prevista para cada ano concluído pelos alunos seria de R$ 700 no 9º ano fundamental, R$ 800 no 1º médio, R$ 900 no 2º e R$ 1000 no 3º. Além disso, os estudantes poderiam receber do governo federal R$ 500 extras, caso tivessem desempenho acima da média de seu estado no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

O pagamento não excluiria incentivos suplementares feitos por prefeituras ou governos estaduais para esse mesmo fim. Não ficou definido se o estudante precisaria prestar conta dos gastos, mas, inicialmente, os valores seriam de uso livre.

De acordo com o doutor em economia pela Universidade de Princeton e ex-ministro-chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República do governo Dilma Marcelo Neri, financeiramente falando, um programa do tipo “é um incentivo válido e vai na direção correta, no sentido de desafiar os estudantes na questão motivacional”. Para ele, o ideal seria que programas mensais complementares se somassem ao esforço de viabilizar a manutenção dos alunos na escola.

…que mal tem?

De acordo com o estudo Consequências da violação do direito à educação, de 2021, promovido pelo do Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa), o Brasil perde R$ 220 bilhões por ano com a interrupção dos estudos, cifra que compõe estimativas de um prejuízo social futuro, bem como a expectativa de empregabilidade, rendimentos e longevidade da população jovem. A cifra toma por base o ano de 2018, quando aproximadamente 557 mil adolescentes não teriam concluído os estudos. A perda representa cerca de 3% do PIB nacional.

Por outro lado, a estimativa é de um incremento de até 10% no salário médio de um egresso do Ensino Médio por cada ano concluído. Daí a necessidade de frear a evasão escolar, em especial após o período de pandemia.

“A adesão à escola permanece. O que merece atenção é a permanência dos estudantes, principalmente dos anos finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, pela necessidade de se inserirem no mercado de trabalho e contribuírem com o orçamento familiar no pós-pandemia”, avalia a Doutora em educação Edileuza Fernandes Silva.

A educadora destaca que evasão escolar tem motivos diversos, inclusive familiares e curriculares, que vão além do financeiro. “Não devemos considerar [uma política como essa] uma recompensa. O estudante tem direito à educação de qualidade. Se [a grade escolar] não está motivando, é preciso encontrar os motivos e trabalhar a partir deles”.

Sem explicação

Quando concebido no primeiro semestre pelo Ministério da Fazenda, o programa tinha a premissa de ser colocado em prática ainda em 2023, para evitar limitações por parte do Congresso ou necessidade de compensações no orçamento e passar ao largo da Lei de Responsabilidade Fiscal, já que seria considerado um braço dos programas Auxílio Brasil e Alimenta Brasil. Segundo o art. 4º da Emenda Constitucional 126/22, nesses casos, ficariam “dispensados da observância das limitações legais quanto à criação, à expansão ou ao aperfeiçoamento de ação governamental, inclusive quanto à necessidade de compensação”. Ainda assim, o projeto ficou retido no MEC.

Procurado, o Ministério da Fazenda se resumiu a indicar que o MEC seria o responsável por tratar sobre o programa, enquanto o Ministério da Educação não se manifestou sobre o assunto e não informou os motivos do projeto não sair do papel e o que ficou acordado entre os ministros Fernando Haddad e Camilo Santana.

Ideia é o que não falta

Por fora da corda esticada entre dois ministérios, um terceiro elemento é indiretamente trazido para a discussão. O Projeto de Lei 54/21, de autoria da deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP), é uma versão mais “modesta” do Poupança Educa+, chegou a ser apensado com outras propostas de remuneração de estudantes de baixa renda, mas nunca ganhou tração suficiente para ser aprovado no Congresso.

Tabata diz que é importante que o governo reconheça para a necessidade de diminuir a evasão escolar, que “custa bilhões ao país” e que conseguiu aprovar requerimento de urgência para votar o PL 54, que “poderia entrar em orçamento ainda em 2023”. “Temos conversas constantes com as lideranças do Congresso e Ministros para ampliar esse debate. É uma pauta crucial para o Brasil e ter esse apoio e atenção do governo é uma peça-chave para sua evolução”, avalia.

Pilotos de projetos que remuneram estudantes foram desenvolvidos localmente em Brasília, no Rio de Janeiro, em Niterói (RJ), em Alagoas e em oito municípios de Minas Gerais e outros 77 do Piauí, mas nunca foi nacionalizado. Iniciativas semelhantes tiveram sucesso em reduzir a evasão escolar entre 7,9% e 15% em pilotos internacionais desenvolvidos em Bogotá (Colômbia) e New Brunswick (Canadá).

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