Manifestantes preparados para o ataque, munidos com máscaras de gás e estilingues, desceram a rua que liga o Congresso ao Supremo Tribunal Federal (STF) sem enfrentar resistência da Polícia Militar do Distrito Federal, responsável pela segurança pública da Esplanada. A situação foi registrada por câmeras e drones do STF e recém disponibilizadas pelo Tribunal e acessadas pela Agência Pública.
O vídeo mostra um ônibus da Tropa de Choque da Polícia Militar separando os manifestantes, que já haviam tomado o Congresso, da rua que leva para a Praça dos Três Poderes, onde estão o Palácio do Planalto e o STF.
O veículo, do tipo Centurion, é utilizado para lançar bombas de gás e outros materiais de dispersão de multidão. Contudo, de acordo com as imagens, ele não atuou para conter as centenas de golpistas bolsonaristas. Após cerca de 12 minutos da gravação, sem resistência, os manifestantes ultrapassam a barreira. As imagens mostram ainda alguns policiais militares observando a movimentação sem agir.
Já de frente ao Supremo, as imagens captaram os manifestantes arrancando os gradis e começando a quebrar as vidraças. Nesse momento, foram repreendidos por poucos agentes da Polícia Judicial, que utilizou bombas de gás e munição não letal para barrar os manifestantes por cerca de 40 minutos. Os vídeos mostraram que os manifestantes reagiram à resistência policial e tentaram tirar satisfações com os policiais judiciais.
A Pública apurou, entretanto, que após a percepção de que não seria possível proteger o prédio principal do STF dos manifestantes, a Polícia Judicial recuou e decidiu impedir a entrada dos mesmos aos anexos, onde ficam os gabinetes dos ministros.
Após a retirada das forças de segurança do prédio principal, os vídeos mostram que os manifestantes puderam andar calmamente pelo ambiente e não encontraram resistência para destruir o patrimônio público. Além de danificarem obras de arte, os golpistas quebraram câmeras de segurança — é assim que termina a maior parte dos vídeos gravados no circuito interno — e houve ainda tentativas de atear fogo ao prédio.
Como demonstração de transparência, a Pública divulga na íntegra e sem cortes todas as imagens até agora divulgadas pelo STF, Planalto e Congresso Nacional em nosso canal do Youtube. No caso do STF, são 23 vídeos de câmeras internas e externas, além de imagens, que foram disponibilizadas pela corte — parte dos vídeos segue em sigilo.
Horas antes da disponibilização das imagens, a Pública revelou que o STF estava se amparando em uma resolução interna para não ceder o acesso às imagens via Lei de Acesso à Informação. A reportagem recorreu ao pedido, já que a resolução interna não pode ter mais força do que a Lei Federal. Pouco depois parte dos vídeos foi cedida à imprensa.
PM, Polícia Judicial e até PF foram acionadas durante a invasão
A Agência Pública ouviu diversas críticas à atuação da PM por interlocutores que circulam no STF, como a existência de uma suposta “falta de comando” nas tropas. A reportagem também ouviu relatos que apontaram que os policiais militares que estavam na Praça dos Três Poderes não agiram ativamente para proteger os prédios, tendo supostamente ficado parados enquanto os manifestantes ocupavam mais espaço e se aproximavam. Algumas imagens mostram cenas parecidas às relatadas.
Uma imagem mostra um servidor do STF levando capacetes aos policiais. De acordo com apuração da reportagem, os equipamentos seriam entregues aos policias militares, que não estariam equipados corretamente, o que teria levado, inclusive, a ferimentos em alguns deles. Por contarem com os equipamentos, policiais judiciais não teriam se ferido.
Entretanto, não foram disponibilizados os vídeos completos que poderiam revelar a completude da atuação de todas as forças de segurança envolvidas no dia, sob a justificativa de conterem informações pessoais das pessoas que trabalham no Tribunal. Dessa forma, não é possível atestar a conduta das outras forças de segurança durante a invasão.
Além da PM e da Polícia Judicial, a Polícia Federal também participou da proteção ou retomada do prédio. Dados sobre o efetivo de policiais judiciais que trabalharam no dia da invasão não foram divulgados pelo Tribunal. A reportagem apurou que, após o início dos ataques, o efetivo teria dobrado em função de novas convocações.
Fontes ouvidas afirmaram à reportagem que não havia sido repassada qualquer informação do real risco de ataque naquele dia por parte do Centro Integrado de Operações de Brasília, órgão subordinado à Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal, e responsável por planejar a segurança em grandes manifestações. Relatório acessado pela reportagem mostra que autoridades públicas apostaram que não haveria deslocamento de ônibus para Brasília, como ocorreu.