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Uma pitada de esperança e outra de coragem

Como não jogar a toalha frente à crise climática e as boas notícias que vêm da expansão das energias renováveis

Coluna
9 de outubro de 2025
17:00

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Tenho pensado muito nos últimos dias sobre esperança, sobre como se manter firme e não jogar a toalha mesmo quando as más notícias se acumulam e os prognósticos não são animadores. Refiro-me, claro, à crise climática, o assunto que domina minha vida profissional e, muitas vezes, também a pessoal. 

É bem fácil se abater pelo pessimismo, confesso, mas venho sendo fortemente impactada nos últimos tempos por mensagens que vão no sentido contrário disso – é o que eu quero compartilhar aqui hoje. Não, caro leitor, fica tranquilo que não tem nada a ver com positividade tóxica. 

Começou na semana passada, com a morte da primatologista britânica Jane Goodall, aos 91 anos. Eu apostaria que quem me acompanha por aqui já ouviu falar dela em algum momento da vida, em especial pelo trabalho seminal que ela fez estudando o comportamento de chimpanzés na Tanzânia. Uma pesquisa revolucionária que mostrou, para além da genética, como eles se parecem muito com a gente.

Eu sou fascinada por essa linha da ciência que mostra como animais são capazes de fazer coisas que a gente julga serem exclusivamente humanas e que dão uma boa redimensionada na nossa erradíssima ideia de que somos uma espécie muito superior a todas as outras, com direito de usufruir o planeta em prejuízo das demais. 

Mas mais do que a ciência, o que eu queria destacar da vida memorável da Jane é como ela foi incansável em promover a esperança por meio de palestras, conversas, ações em todos os cantos do planeta. Um compilado de suas ideias está no “Livro da Esperança, um guia de sobrevivência para tempos difíceis”.

Basicamente ela defende que o intelecto humano, a resiliência da natureza, o poder dos jovens e da paixão para promover mudanças, e o indômito espírito humano são o caminho para sairmos da enrascada em que a gente mesmo se meteu.

Jane não era iludida e, na mesma medida que dizia que temos um maravilhoso intelecto, dava um puxão de orelha ao dizer que não estamos agindo de modo inteligente. “Não somos inteligentes. Se você é inteligente, você não destrói sua única casa”, disse em entrevista à Mother Jones.

Ainda assim, ela pondera no livro: “É uma mistura de ganância, ódio, medo e desejo pelo poder que nos leva a utilizá-lo [o intelecto] de maneira equivocada. A boa notícia é que um intelecto capaz de criar armas químicas e inteligência artificial também consegue inventar maneiras de curar o mal que fizemos a esse pobre planeta.”

De modo que ter esperança não é um sentimento estático, um “se deus quiser, tudo vai dar certo”. É trabalhar ativamente para isso. Em uma entrevista para o New York Times ela disse que “esperança não é só um wishful thinking”, um pensamento positivo, mágico. E pediu, então, que as pessoas se imaginassem em um túnel longo e escuro com uma estrelinha no final representando a esperança.

“Não adianta ficar sentado no início do túnel desejando que essa esperança chegue até nós”, disse ela. “Temos que arregaçar as mangas. E temos que escalar, rastejar por baixo, contornar todos os obstáculos que se interpõem entre nós e a estrela.

Outra mensagem nessa mesma linha eu ouvi de uma especialista em políticas ambientais e climáticas que eu sempre consulto para ter uma ideia de quão perto ou longe (o mais comum, na maioria das vezes) estamos das ações necessárias. É a Natalie Unterstell, que fundou o Instituto Talanoa. Ela fez uma apresentação no Ted Talk no Rio de Janeiro em que disse uma frase muito boa, mais ou menos na seguinte linha: Nem otimismo, nem pessimismo, o que o clima pede é coragem. É desafiar as distopias.

Natalie comentava sobre o salto na transição energética que ocorreu nos últimos 10 anos e pedia para que as pessoas imaginassem o que poderíamos esperar para os próximos 10 anos nesse campo. 

De fato, dados muito impressionantes foram divulgados nesta semana mostrando o avanço das energias renováveis. Um levantamento do thinktank climático Ember mostrou que fontes solar e eólica cresceram tanto que, na primeira metade deste ano, pela primeira vez, elas ultrapassaram o carvão em geração de eletricidade. Em todo o mundo, foi gerado quase um terço a mais de energia solar nesse período, na comparação com o mesmo período de 2024. A eólica cresceu 7%.

O segundo relatório, da Agência Internacional de Energia, apontou que as renováveis devem dobrar a capacidade até 2030. É animador, sem dúvida, mas ainda precisa ser mais. O balanço global feito em 2023, por ocasião da Conferência do Clima de Dubai, definiu como meta que os países buscassem triplicar as fontes renováveis, além de dobrar a eficiência energética. 

E a gente ainda não tem visto uma redução total dos combustíveis fósseis. Uma outra pesquisa, também desta semana, publicada na revista Nature, apontou que a indústria de óleo e gás, que costuma alardear que seus lucros são importantes para promover a transição energética, ainda responde por somente 1,4% dos projetos de energias renováveis. 

Sim, é preciso coragem para mexer nos interesses desse setor. 

É nesse cenário que o videocast Bom Dia, Fim do Mundo começa uma nova temporada com esse tema crucial: esperança. Que mobiliza mesmo quando as chances estão contra – seja para denunciar um genocídio, seja para combater a destruição do planeta. Falamos sobre o legado da cientista Jane Goodall, a inédita meta de redução de emissões da China e se o clima positivo do governo nos últimos dias pode se refletir na COP30.

E fecho, então, esse texto, com a quarta mensagem que vi nos últimos dias e que me motivou a compartilhar tudo isso aqui nesta newsletter. De um encontro emocionante entre a atriz Fernanda Montenegro e a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, na Academia Brasileira de Letras. Elas se abraçam, Fernanda olha bem para Marina e diz, com muita convicção: “Tudo vai dar certo”.

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