Representantes de órgãos públicos e entidades trabalhistas cobraram a aprovação de legislações mais rigorosas contra o trabalho escravo, durante seminário na Câmara dos Deputados nesta quinta-feira (23). O objetivo do evento foi debater políticas públicas para o enfrentamento do problema, como a PEC 14/2017, que torna o crime imprescritível e ganha força após os recentes resgates de trabalhadores em condições análogas à escravidão.
O diretor do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (SINAIT), Lucas Reis da Silva, afirmou que apesar de normas já estabelecidas pelo Estado brasileiro ajudarem no combate ao crime, ainda há “desafios” que precisam ser superados. Como exemplo, ele mencionou a regulamentação da Emenda Constitucional 81/2014, que trata da desapropriação de terras quando constatado trabalho escravo contemporâneo e a destinação da propriedade para a reforma agrária.
É o que acredita também a juíza do trabalho Maria Ines Corrêa de Cerqueira, presente no seminário: “Nós precisamos tirar terra e regulamentar esta questão no Congresso Nacional, para que essas pessoas, para quem vale a pena o trabalho escravo, percam as suas propriedades. Quando doer no bolso, quando a Justiça do Trabalho fixar indenizações relevantes para o trabalho escravo, isto talvez pare de acontecer”, disse à Agência Pública.
Para Luciana Leite, defensora da Biodiversidade e do Clima na Environmental Justice Foundation – Brasil (EJF), são necessários “esforços de fiscalização maiores” para resolver o problema. “Precisamos de investimentos, para a gente ter mais auditores, mais fiscais do trabalho, um efetivo maior em campo, um aparelhamento mesmo das instituições que são responsáveis por encontrar e resgatar esses brasileiros e brasileiras”, afirmou à Pública.
Ela apresentou um relatório elaborado pela EJF sobre o trabalho escravo na pecuária nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, onde o setor é responsável por 44% dos casos identificados de trabalho escravo entre 1995 e 2022. A análise da entidade revela que, apesar de uma redução dos números de registros nos últimos anos, isso não está relacionado à erradicação do crime, mas à diminuição das inspeções.
O seminário foi o primeiro organizado pela subcomissão “Casos de Trabalho Análogo à Escravidão no Brasil”, da Comissão de Trabalho da Câmara. O relator, deputado Bohn Gass (PT-RS), disse que um dos objetivos do colegiado é elencar todos os projetos que estão em tramitação na Casa que tenham proximidade com o tema, para que seja possível tentar dar celeridade às propostas. Também ressaltou a importância da “pressão e do diálogo que a sociedade precisa fazer sobre o parlamento”.
Autor do requerimento de criação da subcomissão, o deputado Rogério Correia (PT-MG) afirma que o objetivo do colegiado é “dar força ao Ministério do Trabalho” que, em sua visão, retomou o combate “mais sistemático” ao trabalho escravo, em contraposição à gestão de Jair Bolsonaro (PL).
“Essa comissão vai deixar um legado de um levantamento histórico sobre isso e um reforço às medidas necessárias de combate ao trabalho escravo. E o que é fundamental para isso é determinação política e, ao mesmo tempo, ter consequência. Aqueles que forem denunciados por trabalho escravo têm que ser punidos, e dar condições àqueles que foram submetidos a esse tipo de trabalho a ter um outro trabalho, para que eles não sejam de novo vítimas desse tipo de ação”, declarou Correia à Agência Pública.