Buscar

O fotógrafo da Agência Pública visitou a comunidade de Jacarezinho, no Maranhão, onde o líder Edvaldo foi executado em abril deste ano

Ensaio
1 de julho de 2022
12:00
Este artigo tem mais de 2 ano

No dia 29 de abril de 2022, o quilombola Edvaldo de Pereira Rocha, 52 anos, foi executado por 8 tiros disparados por dois homens em uma moto – um suspeito foi preso no último dia 4 de junho. Líder da comunidade de Jacarezinho, na zona rural de São João Soter, Edvaldo foi o sétimo quilombola assassinado no Maranhão nos últimos dois anos em razão de conflitos fundiários. Ele lutava contra a expansão de soja no Matopiba – fronteira agrícola entre Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia -, que vem provocando degradação ambiental, expulsão das comunidades e violência.

O fotógrafo João Paulo Guimarães visitou a comunidade de Jacarezinho, conversou com os moradores e com os familiares de Edvaldo. Também trouxe uma carta da viúva, Maria da Cruz Souza, que relembra aqui a vida do marido e a injustiça de sua morte:

“Edvaldo. Eu lembro de tudo, como começou a nossa vida de casal há 30 anos quando começamos a morar aqui em Jacarezinho. A gente era bem novinho e se amava demais. Lembro-me que éramos muito felizes com nossos filhos, mesmo com muitas dificuldades, éramos felizes. Juntos tivemos 11 filhos, três faleceram porque Deus quis levar e criamos juntos 8 que nos dão muito orgulho. 

Comunidade de Jacarezinho está localizada no Matopiba, região ameaçada pela degradação ambiental e violência

Lembro-me que morávamos em uma casinha de taipa bem simples, mas que era nossa. Tínhamos criação de porco, galinha e tinha um plantio de mandioca. Quando não tinha arroz, você fazia a farinha e o nosso alimento era, muitas das vezes, farinha com carne ou com feijão. Era tudo que a gente precisava, pra nós e pra nossos filhos. Eu ia pro Cocal, lugar onde a gente pegava o coco babaçu, daí eu extraia o coco o dia todo e no final da tarde voltava pra casa pra vender e poder comprar comida.

Lembra Edvaldo? Eu trabalhava na roça e sempre que você podia, ia comigo extrair o coco. Até o arroz ficar no ponto de colheita nós extraímos o coco pra dar o sustento para os nossos filhos. 

Bar do Nezito onde Edvaldo foi assassinado

Aí você começou a viajar muito, pois virou fotógrafo por um bom tempo, e era daí também que saia um dinheiro bom para manter nossa família. Graças a isso, com o passar do tempo, as coisas foram melhorando. Me lembro também que depois dos nossos filhos já estarem grandinhos, nós contávamos essas histórias pra eles e eles riam e eu também das coisas que tu contava e do jeito que tu contava.

Edvaldo meu preto, você começou na luta pelo povo e as coisas ficaram mais difíceis pra nós. Mas nós sempre foi unido e se agarrava um no outro.

Hoje vai ser muito difícil conversar com eles a respeito de como foram criados porque agora é só eu pra contar e não sei se vou lembrar ainda de tudo na nossa vida. Hoje só ficou muita saudade, uma tristeza grande no peito e uma pergunta.

Por que fizeram isso com a nossa família?”.

João Paulo Guimarães/Agência Pública
João Paulo Guimarães/Agência Pública
João Paulo Guimarães/Agência Pública
João Paulo Guimarães/Agência Pública
João Paulo Guimarães/Agência Pública
João Paulo Guimarães/Agência Pública
João Paulo Guimarães/Agência Pública
João Paulo Guimarães/Agência Pública

Não é todo mundo que chega até aqui não! Você faz parte do grupo mais fiel da Pública, que costuma vir com a gente até a última palavra do texto. Mas sabia que menos de 1% de nossos leitores apoiam nosso trabalho financeiramente? Estes são Aliados da Pública, que são muito bem recompensados pela ajuda que eles dão. São descontos em livros, streaming de graça, participação nas nossas newsletters e contato direto com a redação em troca de um apoio que custa menos de R$ 1 por dia.

Clica aqui pra saber mais!

Se você chegou até aqui é porque realmente valoriza nosso jornalismo. Conheça e apoie o Programa dos Aliados, onde se reúnem os leitores mais fiéis da Pública, fundamentais para a gente continuar existindo e fazendo o jornalismo valente que você conhece. Se preferir, envie um pix de qualquer valor para contato@apublica.org.

Ensaios

O copyright das imagens publicadas nesta seção é dos fotógrafos aqui creditados. Os ensaios não estão disponíveis para republicação. Para entrar em contato com os autores das imagens envie um e-mail para contato@apublica.org.

Faça parte

Saiba de tudo que investigamos

Fique por dentro

Receba conteúdos exclusivos da Pública de graça no seu email.

Artigos mais recentes