O Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu, no dia 23 de fevereiro, um pedido de listagem dos nomes de jornalistas monitorados ilegalmente pela chamada “Abin paralela”. O requerimento foi feito em conjunto pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP).
A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) foi alvo da Operação Última Milha, realizada pela Polícia Federal (PF) em outubro de 2023, pelo uso ilegal de ferramentas de monitoramento da empresa israelense Cognyte, em especial o programa First Mile. Por meio de brechas de segurança das operadoras brasileiras, a ferramenta conseguia interceptar mensagens de texto, chamadas de voz e localização em tempo real sem autorização do usuário.
A investigação cumpriu 25 mandados de busca e apreensão e resultou na prisão de dois servidores da Abin. A PF suspeitava do uso do programa para monitorar opositores ao governo Bolsonaro. Dados revelaram que a Abin usou o First Mile mais de 60 mil vezes “para fins ilícitos de monitoramento de alvos de interesse político”. A operação mais recente da PF sobre o caso, a Vigilância Aproximada, teve como alvo o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-chefe da Abin no período de 2019 a 2022, e Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do ex-presidente.
“O impacto é a espionagem em si, o fato de você saber que você estava realizando o seu trabalho, exercendo a sua profissão e estava sendo alvo de uma investigação criminosa, por parte de um órgão no governo”, avalia Octávio Costa, presidente da ABI. “O objetivo é ameaçar mesmo, o objetivo é intimidar, coibir de você fazer o seu trabalho, coibir de você exercer a sua profissão”, pontuou.
No pedido feito ao presidente do STF, Luís Roberto Barroso, as entidades descrevem a liberdade de imprensa como um dos pilares da democracia e para os profissionais de comunicação – e, nesse contexto, o sigilo da fonte é instrumento essencial. A intenção do requerimento é verificar a extensão da espionagem e se houve o comprometimento da identidade de alguma fonte para que o caso seja judicializado.
A presidente da Fenaj, Samira de Castro, lembra o processo de “institucionalização da violência contra a imprensa” que marcou o governo Bolsonaro. Segundo relatório da instituição, citado no pedido, entre 2019 e 2022 o ex-presidente fez uma média de 142,5 ataques a veículos de comunicação e jornalistas.
“É necessário compreender, a partir dos nomes divulgados, quem são esses profissionais e por que eles foram monitorados. Certamente, teremos elementos para reforçar a necessidade de proteção ao direito constitucional do sigilo da fonte e garantia do livre exercício profissional”, justificou.
O presidente do SJSP, Thiago Tanji, considera que o escândalo de espionagem de jornalistas seria tão grave quanto a tentativa explícita de invalidar o resultado democrático das eleições, e que, por isso, deve agir judicial e criminalmente em função dos danos morais coletivos à categoria dos jornalistas e aos alvos do monitoramento ilegal.
“A gente acredita que é importante ter essa atuação diante das entidades ou dos órgãos de justiça competentes. Isso é uma maneira não só de publicizar a nossa posição, mas também defender algo que pra gente é essencial”, pontuou Tanji.
O STF já recebeu outros pedidos para revelar os alvos da Abin paralela, incluindo uma solicitação do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), visando descobrir a lista de deputados e senadores vítimas do esquema de monitoramento ilegal.
Em resposta à Agência Pública, o STF, por meio de sua assessoria de imprensa, informou que o processo está sob sigilo e que não há prazo definido para que o pedido das entidades seja atendido.