BAKU – A 29ª Conferência do Clima da ONU (COP29), que ocorre até o fim desta semana em Baku, no Azerbaijão, entra na reta final de olho nos sinais que podem ser enviados pela cúpula do G20, que é realizada no Rio, e com o objetivo principal de entregar um novo mecanismo de financiamento climático global. Para isso, foi requisitada a ajuda do Brasil para facilitar e destravar as negociações.
Na abertura dos trabalhos nesta segunda-feira (18), o presidente da conferência, Mukhtar Babayev, ministro da Ecologia e dos Recursos Naturais do Azerbaijão, ecoou um sentimento que vem ganhando tração nos últimos dias: “Nós não podemos ser bem- sucedidos sem [o G20], e o mundo está esperando ter notícias deles”.
Foi um apelo para que o grupo dos 20 países mais ricos do mundo mandem algum sinal de que estão comprometidos de modo substancioso com a causa climática de maneira a destravar as negociações em Baku.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, já tinha, no domingo, mandado uma mensagem nesse sentido ao se dirigir aos chefes de Estado que estão no Rio. Preocupado com a COP29, que teve início sob a sombra da eleição de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos e corre risco de não chegar a um acordo, Guterres pediu que eles assumam a liderança desse processo.
“Eu apelo ao senso de responsabilidade de todos os países do G20. Agora é hora de os países com maiores economias e maiores emissões liderarem pelo exemplo. Falhar não é uma opção”, disse.
Era uma referência ao grande nó da conferência em Baku, que é estabelecer o chamado novo objetivo coletivo quantificado (NCQG, na sigla em inglês). Na prática, é preciso definir em Baku não só quem vai pagar para ajudar os países pobres a adotar medidas de redução de emissões – assim como a se adaptarem aos das mudanças climáticas que já estão acontecendo – como também quanto recurso vai ser colocado na mesa e como ele vai ser distribuído.
O regime climático já tem um acordo nesse sentido. Adotado em 2009 e iniciado em 2020, ele prevê que os países ricos mobilizem 100 bilhões de dólares por ano até 2025, mas há controvérsias se ele chegou a ser cumprido de fato em algum momento. Em Baku, se espera que esse valor se torne não apenas muito mais vultoso como também mais transparente.
Ao longo da primeira semana, esta foi uma das discussões mais intensas da COP, mas o cerne do problema ainda está longe de ser resolvido. Países em desenvolvimento deixaram claro o que querem: 1,3 trilhão de dólares de financiamento climático por ano, transparência sobre os recursos, definição de que uma parcela será proveniente de fontes públicas e no formato de doação ou concessional (com juros mais baixos que os de mercado) e, claro, que somente os países desenvolvidos tenham obrigações nesse sentido.
Países desenvolvidos, como Alemanha e França, querem que a base de doadores seja ampliada, incluindo emergentes como China e Arábia Saudita, por exemplo. Essa contenda, que vem marcando forte presença ao longo de todo o ano nas negociações climáticas, também apareceu no G20.
Essa é uma não discussão para os países em desenvolvimento, mas o impasse segue. O embaixador brasileiro André Corrêa do Lago, que chefia os negociadores brasileiros nas conferências do clima, voou de Baku para o Rio de Janeiro para poder acompanhar como a pauta vai se refletir no documento final da cúpula do G20.
Antes de viajar, ele já tinha frisado que a expansão da base não tem como ser aceita pelos países em desenvolvimento. “Tendo em vista que os países desenvolvidos não cumpriram com essa primeira tentativa que foi feita nos cinco anos anteriores [de mobilizar 100 bilhões de dólares por ano], é muito difícil achar que seja razoável que creiam que a solução é incorporar novos países que, nas regras da Convenção [do Clima da ONU] e nas regras do Acordo de Paris, não têm obrigação de fornecer esses recursos”, disse em coletiva de imprensa na semana passada.
De acordo com o embaixador, os países em desenvolvimento até podem oferecer recursos de modo voluntário e eventual, mas a obrigação cabe às nações desenvolvidas. “Portanto, o que está acontecendo é que está sendo respondida uma pergunta de uma maneira que não é uma resposta. O que se aguarda é que os países desenvolvidos estabeleçam quais são os recursos que eles vão assegurar para os países em desenvolvimento”, disse.
“E isso num contexto em que os países desenvolvidos insistem que há uma imensa urgência climática, com a qual nós concordamos plenamente. No entanto, no momento de falar de recursos, a urgência climática não se aplica, ou seja, não há urgência de conseguir recursos para que se consiga urgentemente que os países em desenvolvimento possam contornar os seus desafios de mudança do clima”, complementou.
Enquanto aguardam o resultado do G20, que deve sair no início da tarde desta terça no Brasil, as negociações em Baku continuam. Até porque a maioria dos países aqui presentes não está representada entre os mais ricos no Rio e quer ter voz sobre o problema que os atinge majoritariamente.
Para ajudar a chegar a um bom resultado, a presidência da conferência adotou uma medida inédita e pediu, nesta segunda-feira, a ajuda do Brasil e do Reino Unido para destravar as negociações. Ao abrir a segunda semana de negociações, o presidente Mukhtar Babayev convidou os dois países a dar apoio e conselhos a fim de “assegurar um pacote de resultados ambicioso e equilibrado”.
É normal nessas conferências, na etapa final de negociações, quando ministros de Estado entram em campo, que nos tópicos mais complexos (além do NCQG, há outros em jogo) sejam escolhidos facilitadores desses processos. Em geral são dois, um de um país desenvolvido, outro, de uma nação em desenvolvimento, para cada item da agenda que esteja mais travado.
A diferença agora é que, em vez de atuarem em pontos específicos, os representantes de Brasil e Reino Unido atuarão sobre todo o conjunto de negociações em andamento nesta COP. Normalmente cabe às presidências dessas conferências tentar aparar as arestas, superar dificuldades e propor soluções para que se chegue a acordos. O Azerbaijão, porém, não tem tradição diplomática, e o tema do financiamento é particularmente espinhoso. De onde se imagina que a ajuda foi requisitada porque um acordo está difícil.
Os dois países foram convidados porque o Brasil vai hospedar a próxima COP, em Belém, no ano que vem. E o Reino Unido foi o último país desenvolvido a receber uma COP, em 2021, na cidade de Glasgow, na Escócia. As duas nações apresentaram na semana passada suas novas metas climáticas.
A repórter viajou a Baku a convite do Instituto Arapyaú e do ClimaInfo.