O plano de trabalho da Comissão Especial sobre Inteligência Artificial, que vai discutir o chamado PL da IA (PL 2238/23), gerou críticas entre parlamentares. Dividida em quatro fases, a programação prevê dez audiências públicas com especialistas e representantes da sociedade civil, setor produtivo e órgãos públicos, mas não foi além de uma apresentação de slides com poucos tópicos sobre temáticas, deixando de fora questões como os impactos no meio ambiente e mercado de trabalho, o que foi considerado por deputados e especialistas um indicativo de falta de clareza e amplitude.
Para o diretor do Instituto de Pesquisa em Direito e Tecnologia do Recife, organização integrante da Coalizão Direitos na Rede (CDR), André Fernandes, o documento apresentado carece de detalhes sobre a condução dos debates. “Eles parecem meio que bem perdidos. Apresentou um ‘PowerPoint’, como se isso trouxesse uma oficialidade, uma formalização de um processo, mas o que estava dentro do documento não dizia muita coisa”, afirma Fernandes.
O diretor também avaliou que, embora o discurso da comissão mencione a intenção de promover um debate amplo e multissetorial, no plano e requerimentos apresentados haveria a predominância de representantes alinhados a interesses empresariais. “A gente viu um privilégio tanto de atores diretamente ligados ao setor privado, como de atores que podem estar nominalmente como sociedade civil, mas ao fim e ao cabo defendem o interesse do setor privado”, complementou Fernandes.
A comissão foi instalada para debater o PL 2338/23, que regulamenta o uso da IA no Brasil. A proposta, aprovada pelo Senado no fim de 2024, foi apresentada por Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e resulta de um ano e três meses de trabalho da Comissão Temporária de Inteligência Artificial (CTIA).
“Um tema que nos preocupa muito é em relação ao mercado de trabalho. Quando a gente fala de inteligência artificial, nós temos, evidentemente, um impacto muito grande […] Também pensar em algum especialista em relação ao meio ambiente, porque existe todo um debate do consumo de água e energia com relação aos centros utilizados de data center, que é muito importante do ponto de vista ambiental e de emergências climáticas”, disse a deputada Fernanda Melchionna (Psol-RS).
Questionado sobre a inclusão de discussões ambientais e de mercado, o relator, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), afirmou que os temas podem ser abordados nas audiências sobre infraestrutura ou competitividade, embora a informação não conste no plano apresentado.
A presidente da comissão, deputada Luisa Canziani (PSD-PR), e o relator afirmaram que as definições sobre a condução dos debates serão tomadas em reuniões preparatórias antes das audiências.

Prazo apertado
O parecer final da comissão deve ser apresentado até 25 de novembro, com deliberação prevista até dezembro de 2025. Parlamentares demonstraram preocupação com o cronograma, considerado apertado diante da quantidade de audiências e seminários, nacionais e internacionais, programados.
“Temos sim que ouvir a sociedade, temos que fazer essas audiências, sim, porém, calendário apresentado, para ser concluído em 25 de novembro, [nesse mês] já estamos tratando o orçamento [para 2026]”, disse o deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG).
A deputada Jandira Feghali (Psol-RJ) ressaltou a preocupação com a possibilidade do debate ser prolongado para o próximo ano, especialmente, em período eleitoral. “Nós precisamos dar uma regulação ética para esse tipo de uso da tecnologia, garantindo os direitos fundamentais, os direitos autorais que são muito importantes”, complementou Feghali. “É um tema muito importante para a democracia nas eleições.”
“Tem várias áreas onde a IA está atravessada como sistema, e a gente às vezes nem percebe que ela está ali. [Sem a regulação] a gente perde esse escudo de garantias e direitos que a sociedade precisa”, alerta André Fernandes sobre os reflexos da não conclusão do debate no prazo estimado.