Atendendo parcialmente a apelos da sociedade civil, em uma vitória da ala ambientalista, o governo Lula vetou 63 pontos do Projeto de Lei (PL) do Licenciamento, derrubando vários dos trechos considerados mais problemáticos – que ainda podem ser retomados pelo Congresso. Mas, se dependesse de uma parte do governo, o projeto teria sido aprovado na íntegra. É o que mostram pareceres obtidos pela Agência Pública via Lei de Acesso à Informação (LAI) junto aos ministérios da Agricultura e Pecuária (Mapa) e de Minas e Energia (MME).
Em 21 de julho, poucos dias após a aprovação do projeto pela Câmara, a Secretaria Especial para Assuntos Jurídicos da Casa Civil encaminhou ofício solicitando manifestação sobre o PL do licenciamento para 17 ministérios, além da Advocacia-Geral da União (AGU) e da Secretaria Especial de Análise Governamental da Casa Civil. Os órgãos deveriam se manifestar de maneira favorável à sanção integral; contrária, indicando veto parcial ou integral; ou informando que a matéria está fora de suas competências legais.
Por que isso importa?
- O PL do licenciamento, que se tornou a lei 15.190/2025, altera os processos de licenciamento ambiental no Brasil, diminuindo as exigências para liberar obras que podem ter impactos no meio ambiente e na população;
- Críticos do projeto apontaram que ele levaria a mais desastres ambientais como o rompimento de barragens, ou a instalação de empreendimentos poluidores. Os vetos de Lula mantiveram trechos como a aceleração do licenciamento para atividades e empreendimentos considerados “estratégicos”.
Críticos do projeto apontaram que ele levaria a mais desastres ambientais como o rompimento de barragens, ou a instalação de empreendimentos poluidores. Os vetos de Lula mantiveram trechos como a aceleração do licenciamento para atividades e empreendimentos considerados “estratégicos”.
No Ministério de Minas e Energia, foram produzidas notas técnicas por ao menos dez departamentos ou subsecretarias. Todas elas se manifestaram positivamente à sanção, sem apontar a necessidade de vetos.
Um dos departamentos, ligado à Secretaria Nacional de Transição Energética e Planejamento, apontou “potencial risco de judicialização”, mas considerou que tal risco “não justificaria a recomendação de vetos”.
Já a Subsecretaria de Sustentabilidade, que fez análise aprofundada do projeto, defendeu vários dispositivos que eram criticados por especialistas e acabaram vetados pelo governo, incluindo ampliação da autonomia de estados e municípios, restrições a consultas a povos indígenas e quilombolas, flexibilização da Lei da Mata Atlântica e limitação de condicionantes ambientais a impactos diretos.
Com base nas notas técnicas e em parecer da Consultoria Jurídica, que considerou não haver nenhuma inconstitucionalidade no texto aprovado pelo Congresso, o MME encaminhou manifestação positiva à Casa Civil.
Já no caso do Ministério da Agricultura e Pecuária, foi fornecida apenas uma nota técnica, produzida pela Coordenação de Cooperação para o Desenvolvimento Sustentável. O órgão defendeu a sanção integral do PL do licenciamento, afirmando que “a flexibilização dos critérios para licenciamento pode agilizar o processo, reduzindo a burocracia e permitindo que os projetos sejam implementados de forma mais eficiente, sem comprometer a proteção ambiental”. A ampliação da autonomia de estados e municípios, vetada por Lula, também foi defendida na nota.
A Pública recorreu, pedindo a manifestação de outros departamentos do ministério, mas não houve resposta até a publicação. Não há, entretanto, nenhuma menção a apontamentos do MAPA na mensagem de veto enviado por Lula ao Congresso, o que indica que o ministério não se opôs a nenhum ponto do projeto.
Outros ministérios não responderam o que recomendaram sobre PL do Licenciamento
A demanda por manifestação dos ministérios é praxe sempre que um projeto de lei ou outra medida do Congresso vai para a sanção presidencial, sendo direcionada para todas as pastas que tenham relação com a temática em questão. É, em tese, a partir das opiniões técnicas dos ministérios que o presidente toma sua decisão.
Além de Mapa e MME, a Pública também pediu acesso aos pareceres internos formulados pelos ministérios do Meio Ambiente (MMA) e Transportes e pela Casa Civil.
O MMA prorrogou o prazo de atendimento em 10 dias e não forneceu as informações até a publicação. A pasta de Transportes negou acesso em duas instâncias, primeiro afirmando que o pedido era “genérico” e exigiria “trabalho adicional” e depois alegando que tratava-se de documento preparatório, por ainda não ter ocorrido a sanção; o novo recurso ainda não foi respondido.
Já a Casa Civil, com base em entendimento adotado pela gestão Bolsonaro, negou acesso alegando que “os pareceres jurídicos que embasaram a decisão presidencial de sanção e veto são protegidos pelo sigilo advogado cliente”. Foi apresentado recurso, ainda não respondido.
Com frequência, os ministérios produzem notas técnicas sobre projetos de lei mesmo durante a tramitação no Congresso. Em 2023, por exemplo, a Pública mostrou que o Ministério de Minas e Energia apoiou uma medida que enfraquecia a Lei da Mata Atlântica, com modificações inclusive no licenciamento ambiental de obras. O trecho em questão acabou sendo derrubado no Senado.