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Com 370 mil habitantes, a pequena Belize tem sido usada por cartéis mexicanos como ponto de trânsito para o tráfico de cocaína

Reportagem
25 de outubro de 2011
11:18
Este artigo tem mais de 13 ano

Eu conheci Bobby na minha última noite em Belize, na véspera da comemoração de 30 anos da independência daquele país.

Eu estava parado diante de um mercadinho chinês, esperando pelos fogos de artifício. A maior parte dos 10.000 habitantes de Corozal, pequena cidade de Belize, estava reunida na praça cívica do outro lado da rua.

“Ei, tá tudo OK? Você parece assustado”.

A pergunta vinha de um homem que estava sentado em um caixote na entrada do mercado, bebendo uma Heineken.

“De onde você é, mano?”, ele perguntou.

EUA, eu disse. E, não, não estava assustado, mas observando a cena. Olhava a família chinesa vendendo cervejas para jovens através das barras de metal do mercadinho, me perguntando se não havia mais oportunidades na vibrante economia chinesa do que nessa cidadezinha sonolenta ao sul da fronteira de Belize com o México.

O homem estava bem vestido e falante. “Bobby”, ele disse, estendendo a mão.

Bobby era de Roatán, uma ilha caribenha que faz parte de Honduras, e jogava conversa fora tão bem em inglês quanto em espanhol. “Três filhos”, disse, mostrando as fotos no seu celular. Disse que andava lendo muitas novelas de John Grisham recentemente, já que não estava trabalhando muito.

“Que tipo de trabalho se faz por aqui” – perguntei.

“Contrabando” – ele respondeu.

É claro que fiquei intrigado.

Camponeses à mercê dos Zetas

Eu estava em Belize há cinco dias, escrevendo sobre o aumento de tráfico de drogas através deste país. Os cartéis de drogas mexicanos recentemente reforçaram sua presença na América Central, buscando abrir novas rotas de tráfico para o multimilionário comércio de cocaína desde as montanhas da América do Sul até os Estados Unidos.

Alguns dias antes a administração Obama havia adicionado Belize à sua “lista negra” de países considerados produtores ou passagem para o tráfico de drogas.

Este ano o governo americano prometeu mais de 200 milhões de dólares para países centro-americanos em assistência de segurança. Mas os políticos da região querem mais, afirmando que sua soberania e estabilidade estão sendo ameaçadas pelo poder dos cartéis.

Até agora em Belize as coisas não estão tão ruins quanto na vizinha Guatemala que, de acordo com DEA, o departamento antidrogas americano, é o percurso favorito até o México para os traficantes.

A presença dos cartéis na Guatemala é marcada pelo grupo mais temido do México, os Zetas. Acredita-se que em maio os Zetas tenham matado 27 pessoas em um rancho no estado Peten, na Guatemala – bem na fronteira com Belize. As vítimas foram degoladas e ameaças foram escritas com sangue nas paredes.

Não que reine a paz absoluta em Belize.  Em Belize City, cidade portuária com maior população do país – 70.000 pessoas – violentas gangues ajudaram a empurrar a taxa de homicídios do país para 100 somente este ano. Se continuar neste passo, será um recorde histórico para Belize.

Os bairros do sul da cidade estão tomados pela Guerra entre Bloods e Crips — gangues importadas pelos belizenses deportados dos EUA, exatamente como a rivalidade entre a gangue “Mara Salvatrucha”, formada por salvadorenhos, e  a “18 th Street”, a mais poderosa em Los Angeles, dos EUA.

Um motivo para o aumento violência, segundo me disse o chefe policial de Belize: grandes traficantes estão colocando mais cocaína nas ruas, já que têm pago seus contatos locais com o produto bruto, e não mais com dinheiro.

Voltando a Corozal….

“Este lugar é tranquilo”, diz Bobby. “Mas tem muita coisa em trânsito. Eles apenas não estão se matando tanto”.  Bobby me contou então que trabalhava nas docas.

Eu havia conversado com policiais e militares belizenses, além de agentes anti drogas americanos sobre o crescente papel do país como rota do tráfico.

Ao pousar com seus aviões carregados de drogas em Belize ou atravessar até Honduras em lanchas, os narcotraficantes conseguem evitar as patrulhas do México. E como país menos populoso e com menos aparatos de defesa da América Central, a preocupação é que Belize seja dominado pelos cartéis mexicanos.

Militares de Belize me disseram que também aumentou o número de camponeses plantando maconha, sob a proteção — ou as ordens — dos Zetas fortemente armados da outro lado da fronteira com a Guatemala.

Durante anos os camponeses da Guatemala têm cruzado a fronteira com Belize para desmatar florestas e plantar. Mas recentemente esses locais ganharam um ar mais pesado: traficantes gravam mensagens sinistras nas árvores, como “Estamos te observando”, assinando, simplesmente, com a letra Z.

“Eles vêm até a fronteira e cortam as árvores”, me disse o sargento Marcos Villagran durante uma patrulha recente na fronteira. O alto e esguio comandante carregava um rifle americano M4 — um presente do governo americano, bem como o Ford F350 que levava sua unidade policial através da floresta. “O problema aqui tem a ver com terra. E com o cumprimento da lei”, ele disse.

Mas o Bobby, aquele que eu conheci diante da loja chinesa em Corozal, foi a primeira pessoa que conheci em Belize que já havia contrabandeado o bagulho.

Enquanto a família chinesa continuava a mandar ver na venda cervejas, o Bobby me contou sobre as “mercadorias” que ele já viu chegarem a Corozal. Ele ajudou a descarregar pacotes de cocaína em diversas ocasiões – e se lembrava de um carregamento tão grande que calculara valer 40 milhões de dólares.

“Eu mesmo levava os embrulhos”, ele disse, reclamando que os traficantes só lhe pagavam 1.500 dólares pelo trabalho.

Foi quando Bobby me perguntou se eu queria conhecer alguns dos seus sócios. Eu disse que preferia deixar pra lá. Sou um escritor, eu lhe disse. Não um comprador de drogas. Não um agente da DEA.

Nós nos sentamos por mais alguns minutos, ele tomando sua Heineken e eu engolindo minha água mineral. Bobby parecia um cara legal, mas então ele começou a perguntar mais sobre o que eu estava fazendo em Corozal. Achei que era hora de ir embora. E lhe disse que estava voltando para a praça para ver os fogos de celebração da independência, à meia-noite.

Dei-lhe um aperto de mão e saí em direção à praça, ziquezagueando dentre a multidão, tentando me misturar a ela – para o caso de Bobby ainda estar me olhando. “Melhor voltar ao hotel e assistir aos fogos de artifício pela janela”, pensei. “Vai que ele se arrepende e decide que falou demais…”.

Clique aqui para ler a reportagem original em inglês.

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