Buscar
Agência de jornalismo investigativo
Checagem

Checamos os documentos que citam Temer divulgados pelo Anonymous

Grupo ativista publicou um post nas redes sociais com pacote de 600 páginas, que diz estabelecer relações entre o presidente e diversos políticos e empresários brasileiros

Checagem
3 de março de 2017
12:24
Este artigo tem mais de 7 ano
Michel Temer, citado em pacote de documentos divulgado pelo Anonymous Brasil (Foto: Beto Barata/PR)

“Divulgamos agora mais de 600 páginas de documentos que trazem uma série de atividades relacionadas ao presidente da República, Michel Temer, e seu amigo pessoal e ex-conselheiro oficial da República, José Yunes, acusado pela Lava Jato por recebimento de proprina pela Odebrecht.

Provamos nestes documentos relações entre offshores citadas no Panamá Papers e figuras proeminentes da elite econômica e política do Brasil.

Os papéis estabelecem elos entre Michel Temer, José Yunes, seu filhos e bancos investigados na Lava Jato, José Roberto Marinho (Globo), Antonio Augusto Amaral de Carvalho Filho (Grupo Jovem Pan), Alberto Domingues Von Ilhering de Azevedo (Track&Field) e diversos laranjas moradores da periferia de São Paulo. Todos se relacionam em CNPJ com filho de Yunes e offshore misteriosa dos Panamá Papers.” – Anonymous Brasil, em post no Facebook publicado para divulgar documentos obtidos pelo grupo ativista, em 24 de fevereiro.

Exagerado

Em uma semana marcada pela forte crise política gerada pelas delações da Operação Lava Jato, o grupo ciberativista Anonymous Brasil reuniu 37 documentos de empresas na tentativa de associar o presidente Michel Temer a diversos empresários e políticos brasileiros – alguns também citados na mesma investigação. O pacote foi divulgado nas redes sociais do grupo no dia 24 de fevereiro.

Entre os arquivos estão documentos da Tabapuã Investimentos e Participações, de Michel Temer; e da Yuny Incorporadora, empresa dos filhos do advogado e ex-assessor da Presidência, José Yunes. Yunes é citado na delação de Cláudio Melo Filho, executivo da Odebrecht, que o acusa de auxiliar no recebimento de propinas da empresa.

A divulgação dos documentos não pode ser considerada um vazamento, já que são arquivos públicos e estão disponíveis para consulta na Junta Comercial do Estado de São Paulo. Alguns documentos, inclusive, já tinham sido divulgados discretamente em dezembro, em portais na internet. O Truco – projeto de checagem da Agência Pública – checou as afirmações feitas pelo Anonymous no Facebook.

Post em que o grupo ciberativista Anonymous divulgou os documentos (Foto: Reprodução/Facebook)

O post começa com a seguinte afirmação: “Divulgamos agora mais de 600 páginas de documentos que trazem uma série de atividades relacionadas ao presidente da República, Michel Temer, e seu amigo pessoal e ex-conselheiro oficial da República, José Yunes, acusado pela Lava Jato por recebimento de propina pela Odebrecht.” A frase está correta, mas falta contexto. Dos 37 documentos reunidos pelo grupo, apenas seis fazem referência ao presidente Michel Temer – três são arquivamentos simples de sua empresa, Tabapuã Investimentos e Participações, na Junta Comercial; e três são declarações de bens feitas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nos anos de 2006, 2010 e 2014.

Nos documentos, a relação mais evidente que há entre o presidente Michel Temer e o advogado José Yunes são quatro imóveis de Temer em edifícios incorporados pela Yuny Incorporadora S/A. São eles duas salas no Edifício Lugano e dois escritórios no Edifício Spazio Faria Lima, ambos na cidade de São Paulo.

Na declaração de bens que Temer fez ao TSE para as eleições de 2014, constam, entre outros itens, os imóveis no Lugano no valor de R$ 190 mil cada. São declaradas também 9.900 quotas da empresa Tabapuã Investimentos e Participações Ltda. Em 2011, a Tabapuã incorporou em seu capital os dois escritórios no Spazio Faria Lima que também eram de propriedade de Temer. O valor registrado para cada escritório foi de R$ 1,1 milhão. A publicação do Anonymous apresenta ainda documentos referentes às atividades de José Yunes e seus filhos, Marcelo e Marcos Mariz de Oliveira Yunes, em diversas empresas do setor imobiliário.

Em seguida, o post do Anonymous faz a seguinte acusação: “Provamos nestes documentos relações entre offshores citadas no Panamá Papers e figuras proeminentes da elite econômica e política do Brasil.” Isso também está correto. De fato, a Greystone First Nominees Limited e a Shadowscape Corporation são empresas com sede em paraísos fiscais e são ou foram acionistas da Maraú Administração de Bens e Participações Ltda.

Em 2015, foi concedida à Maraú uma licença ambiental para construir um condomínio residencial de 12 terrenos, com área de aproximadamente 16 mil metros quadrados. O projeto fica na Praia de Algodões, município de Maraú, Bahia. Algumas figuras em seu quadro de acionistas são notórias no Brasil: José Roberto Marinho é também um dos donos das Organizações Globo; Antonio Augusto Amaral de Carvalho Filho, o Tutinha, é sócio do Grupo Jovem Pan; Alberto Domingues Von Ilhering de Azevedo é acionista da Track&Field. São acionistas da Maraú também os filhos de José Yunes, Marco e Marcelo Yunes. Ambas as offshores têm sede nas Ilhas de Man e Tortola, respectivamente, e constam nos arquivos reunidos na investigação jornalística Panamá Papers.

A principal conclusão do Anonymous, a respeito dos documentos, foi que eles mostram relações entre todos os citados: “Os papéis estabelecem elos entre Michel Temer, José Yunes, seu filhos e bancos investigados na Lava Jato, José Roberto Marinho (Globo), Antonio Augusto Amaral de Carvalho Filho (Grupo Jovem Pan), Alberto Domingues Von Ilhering de Azevedo (Track&Field) e diversos laranjas moradores da periferia de São Paulo. Todos se relacionam em CNPJ com filho de Yunes e offshore misteriosa dos Panama Papers.”

A partir da leitura dos arquivos reunidos pelo grupo, é possível estabelecer relações concretas entre alguns citados. Entretanto, é exagerado afirmar que os papéis revelam elos entre todas as pessoas a que o Anonymous fez referência.

É correto afirmar que José Yunes e seus filhos têm ligações formais com bancos investigados na Lava Jato. A Yuny Properties Gestão Patrimonial, de propriedade de Marcelo e Marco Mariz de Oliveira Yunes, controla outras duas empresas, a Yuny Incorporadora S/A e a Atua Construtora e Incorporadora S/A. Nos arquivos dessas empresas é possível verificar que os bancos Pine, Fibra e ABC – todos investigados pela Lava Jato – realizaram diversas operações de crédito com o grupo Yuny.

No caso das outras pessoas citadas na publicação – José Roberto Marinho, Antônio Augusto Amaral de Carvalho Filho e Alberto Domingues Von Ilhering de Azevedo – a relação com Michel Temer ou com os bancos investigados pela Lava Jato é indireta. Os nomes desses três empresários são relacionados à empresa Maraú Administração de Bens e Participações, o que comprova relação direta apenas com a família Yunes e com as offshores Greystone First Nominees Limited e Shadowscape Corporation. Não encontramos informações nos documentos que comprovassem a presença de “laranjas” nas empresas citadas nos arquivos reunidos pelo Anonymous.

Embora algumas das afirmações sobre os documentos feitas pelo Anonymous Brasil no post sejam verdadeiras, a conclusão a que o grupo ativista chegou aponta para um conceito verdadeiro (há relações entre vários dos citados) usando dados incorretos (algumas relações são indiretas e outras, envolvendo laranjas, não puderam ser comprovadas). Por isso, concluímos que o post pode ser classificado como exagerado.

Não é todo mundo que chega até aqui não! Você faz parte do grupo mais fiel da Pública, que costuma vir com a gente até a última palavra do texto. Mas sabia que menos de 1% de nossos leitores apoiam nosso trabalho financeiramente? Estes são Aliados da Pública, que são muito bem recompensados pela ajuda que eles dão. São descontos em livros, streaming de graça, participação nas nossas newsletters e contato direto com a redação em troca de um apoio que custa menos de R$ 1 por dia.

Clica aqui pra saber mais!

Quer entender melhor? A Pública te ajuda.

Truco

Este texto foi produzido pelo Truco, o projeto de fact-checking da Agência Pública. Entenda a nossa metodologia de checagem e conheça os selos de classificação adotados em https://apublica.org/truco. Sugestões, críticas e observações sobre esta checagem podem ser enviadas para o e-mail truco@apublica.org e por WhatsApp ou Telegram: (11) 99816-3949. Acompanhe também no Twitter e no Facebook. Desde o dia 30 de julho de 2018, os selos “Distorcido” e “Contraditório” deixaram de ser usados no Truco. Além disso, adotamos um novo selo, “Subestimado”. Saiba mais sobre a mudança.

Leia também

O presidente Michel Temer (PMDB), durante pronunciamento em resposta a denúncias

Gravação de Temer justifica impeachment?

Por

Checamos se há crime de responsabilidade na denúncia de que o presidente teria autorizado pagamento pelo silêncio de Eduardo Cunha e se omitido diante do relato da compra de um procurador

Lava Jato diminui no governo Temer

Por

Checamos dados sobre orçamento e agentes envolvidos na operação de 2014 até março deste ano; números contestam afirmação do ex-ministro da Justiça Alexandre de Moraes

Notas mais recentes

Ruralistas apostam em PECs para avançar sobre direitos indígenas no Congresso


Abin paralela: Órgãos de imprensa se unem e pedem ao STF lista de jornalistas monitorados


Gênio de Uberlândia: Suposto autor de estudo contra urnas apurou fraudes para governos


Projeto de senador do PT que dá porte de armas a agentes socioeducativos avança no Senado


Alunos trans não podem usar seus banheiros em escolas, decide Comissão de Direitos Humanos


Leia também

Gravação de Temer justifica impeachment?


Lava Jato diminui no governo Temer


Faça parte

Saiba de tudo que investigamos

Fique por dentro

Receba conteúdos exclusivos da Pública de graça no seu email.

Artigos mais recentes