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Caso Marielle avança, mas achar mandante ainda é desafio

Investigação da PF traz novidades, mas ainda não há provas sobre quem mandou matar vereadora e seu motorista

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26 de julho de 2023
06:00
Este artigo tem mais de 1 ano

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Entre investigadores policiais, é comum a noção de que a grande maioria dos casos de homicídio é resolvida no mesmo dia ou logo depois do crime. No sentido contrário, quanto mais distante da data do crime, mais difícil de resolvê-lo. Um levantamento recente do Instituto Sou da Paz feito em 11 estados brasileiros indicou que 70% dos casos de homicídio ficam sem solução, um número absurdo e aterrador. O Distrito Federal (DF) foi apontado como uma das unidades da Federação supostamente “mais eficientes”, no qual 90% dos homicídios são oficialmente “resolvidos”. No recorte sobre o DF, cerca de 92% dos casos foram encerrados num prazo de até dois anos. Isto é, o levantamento confirma que, quanto mais tempo passa, mais inviável a solução de um homicídio. 

O assassinato da então vereadora do Rio pelo Psol Marielle Franco já passou de cinco anos sem a descoberta do mandante do crime. Para desconsolo em especial dos familiares e amigos da vereadora e da segunda vítima, o motorista Anderson Gomes, segue faltando a peça final, quem determinou a execução covarde e fria cumprida na noite de 14 de março de 2018.

São muitas as explicações para as deficiências da investigação originalmente tocada pela Polícia Civil do Rio. Entre elas pode estar a decisão do Ministério Público (MP) do Rio de reagir, desde o segundo dia do crime, à hipótese de federalização do caso. A Procuradoria-Geral da República (PGR) na época cedeu às argumentações do MP fluminense e deixou de rapidamente ajuizar, no Superior Tribunal de Justiça (STJ), a federalização, tecnicamente chamada de Incidente de Deslocamento de Competência (IDC). Só a PGR poderia fazer tal pedido. Se o caso tivesse sido federalizado desde o princípio, com apoio do STJ, o inquérito já estaria nas mãos da Polícia Federal (PF) poucos dias depois dos assassinatos.

Mas o IDC só foi ajuizado um ano e meio depois, em setembro de 2019, em um dos últimos atos da então procuradora-geral da República Raquel Dodge. Em 2020, acompanhando o voto da relatora ministra do STJ Laurita Vaz, o tribunal rejeitou o pedido sob o argumento de que a investigação da Polícia Civil e do MP do Rio havia obtido avanços importantes. Assim, disse o STJ, não havia razão para retirar o caso dos policiais civis. Na ocasião, vale ressaltar, nem os familiares das vítimas queriam a federalização. Temia-se que Jair Bolsonaro pudesse influenciar os rumos da investigação caso ela migrasse para a Polícia Federal. Era um temor justificável, tendo em vista as declarações e pressões públicas que Bolsonaro fazia contra a direção da PF em torno do caso Adélio, por exemplo, ou das investidas sobre a PF do Rio no caso das rachadinhas que envolvia seu filho Flávio.

Mas o tempo passou, o governo federal mudou e, nesta segunda-feira (24), a PF divulgou importantes desdobramentos no caso ao desencadear uma operação que trouxe novas luzes à ação de um dos executores, o ex-policial militar Ronnie Lessa, e ao destino do carro utilizado no crime, entre outros pontos. A investigação da PF também coloca em xeque o trabalho da Polícia Civil do Rio. A polícia fluminense de fato identificou e prendeu Ronnie Lessa e seu parceiro, Élcio Queiroz, mas deveria vir a público explicar – sabemos que não vai – por que, ao longo de cinco anos, não chegou a essas outras provas que envolvem um bombeiro militar e outras pessoas.

A PF está com o caso há apenas quatro meses. Em 120 dias, os nove investigadores hoje mobilizados pela PF tiveram um sucesso que os policiais civis do Rio não atingiram em mais de 1.500 dias de apuração. É, no mínimo, estranho. Uma dúvida simples: não foi tentada uma delação premiada com um dos presos, Queiroz, que acabou se tornando o ponto de partida da atual investigação? A delação só foi assinada em junho passado.

Dito isso, é preciso ficar claro que o mais recente passo da investigação pouco ou nada trouxe a respeito dos mandantes do crime. Nesse tópico, seguimos sem novidades. Levando em conta as estatísticas, também cabe às autoridades do atual governo – que, obviamente, nada teve a ver com os percalços da investigação iniciada ainda durante o governo de Michel Temer (2016-2018) – não alimentar falsas esperanças que ninguém ainda sabe se um dia poderão de fato ser respondidas, conforme a Agência Pública apurou junto a fontes que têm acesso à investigação. A investigação trabalha com algumas linhas, mas ainda não conseguiu provas sobre o mandante.

É por isso que surpreendeu uma recente declaração feita pelo ministro da Justiça e da Segurança Pública, Flávio Dino, sobre os andamentos da investigação. Ele disse em entrevista à Pública, em 13 de julho último, que “acredito que vamos chegar a uma solução do crime”. Esse tipo de manifestação mediúnica, que tem mais a ver com vontade do que com realidade, mais atrapalha do que ajuda em uma investigação. Além de alimentar esperanças que poderão não ser atendidas, exerce uma pressão sobre os investigadores.

Cinco anos depois do crime, os investigadores precisam refazer meticulosamente tudo o que foi feito e o que não foi feito pela Polícia Civil do Rio. Isso leva tempo, paciência e certa paz no trabalho, o que os seus superiores, entre os quais está o ministro, deveriam entender. A gestão de Dino fez um movimento positivo e correto ao retomar e aprofundar o caso Marielle. Mas não pode ela mesma se enrolar na própria língua.

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