O som estridente do jingle “Éder Mauro é meu prefeito” estoura nos alto-falantes da avenida João Paulo II, na região central de Belém, em uma campanha que gera suspense internacional: se for eleito, o candidato pró-garimpo será anfitrião da COP30 do Clima da ONU, prevista para acontecer na capital paraense em novembro do próximo ano.
Aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que foi a Belém no fim de junho para demonstrar apoio à sua candidatura, Éder Mauro (PL-PA) está no terceiro mandato na Câmara dos Deputados, onde mantém posições contrárias à proteção ambiental. Na corrida pela prefeitura em Belém, está em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, atrás de Igor Normando (MDB).
Ao longo da gestão bolsonarista, Mauro levou garimpeiros a Brasília para tentar legalizar a atividade, que explodiu no período, especialmente no Pará, elevando o desmatamento e a contaminação por mercúrio na região.
A fama, no entanto, vem da defesa aberta da violência policial. Ex-delegado da Polícia Civil do Pará, ele admite a autoria de assassinatos: “Matei muita gente”, já declarou aos microfones da Câmara dos Deputados. Na corregedoria da Polícia Civil, o nome do deputado aparece em 53 processos – boa parte deles arquivada – envolvendo acusações de tortura, extorsão e execuções.
Trocando a expressão sisuda por sorrisos a cada vez que é surpreendido por celulares e câmeras, o candidato não chega a parar o trânsito durante um “adesivaço”, acompanhado pela Pública no final de agosto. É a movimentação de bandeiras erguidas por cabos eleitorais no canteiro central da avenida que chama atenção de quem começa a “sextar” nos bares e lojas de conveniência da esquina com a travessa Antônia Baena.
Cercado por apoiadores, Mauro pede que sua equipe abaixe o som das caixas por cerca de 5 minutos, durante os quais aceita conversar com a reportagem.
Segundo ele, uma prefeitura bolsonarista não deve representar obstáculos ou embaraços à realização da COP30, levada a Belém por seus opositores – o governador Helder Barbalho (MDB) e o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
“Não existe isso. Tenho oposição a eles como deputado, não penso como eles, mas como gestor e prefeito, pode ter certeza, por questões institucionais, vou sentar com o governador para tratar da COP30 e Belém, assim como vou sentar com o presidente Lula. O relacionamento será o melhor possível”, afirma.
“A COP30 é uma grande oportunidade para sentar à mesa com cientistas e políticos do mundo todo, para discutir soluções para os problemas que a própria natureza traz ou o homem traz”, diz, deixando aberta a interpretação de que a crise climática poderia não ser causada pela ação humana.
Embora a causa antropogênica do aquecimento global seja um consenso científico, a questão é a principal dúvida levantada por negacionistas do clima. Questionado se concorda com as posições de líderes bolsonaristas que negam o aquecimento global, o candidato tergiversa. “Todo brasileiro, de esquerda ou direita, se você pergunta para ele: você quer que derrube árvore? Ele não quer”, afirma.
No Climômetro, o levantamento feito pela Pública com os candidatos das capitais, Mauro também evitou se distanciar do tema da COP ao dizer que, se eleito, pretende priorizar ações para combater as mudanças climáticas. Mas afirmou que não concorda nem discorda de que a população que se preocupa com as mudanças climáticas deveria votar nele.
Éder Mauro respondeu ao Climômetro. Confira sua resposta aqui.
“O que eu coloco pra você de ideológico é que a gente não pode apenas tratar a questão ambiental sem falar do progresso e sem que o homem do campo seja prejudicado. É mais uma questão de conversar e tratar o problema e fazer com que a COP30 seja um grande sucesso, sem prejudicar o homem do campo”, ressalva.
O agronegócio – citado por Mauro através do eufemístico “homem do campo” – tem contado com seu apoio na Câmara dos Deputados, onde ele figura entre os três parlamentares mais antiambientais da casa, sendo o líder do ranking entre os deputados federais paraenses. A avaliação é do Ruralômetro, monitor da Repórter Brasil que mediu a atuação de deputados federais entre 2019 e 2022 nos temas socioambientais.
Além de ter votado a favor de pautas antiambientais – como o PL da regularização fundiária, apelidado de “PL da grilagem”, e o projeto do marco temporal das terras indígenas –, Mauro é autor de pelo menos três projetos de lei que ameaçam a proteção ambiental.
No PL 2.974/2021, ele propõe que o Estado pague uma pensão indenizatória a ocupantes de regiões da Amazônia nos anos 1970, onde hoje passam as rodovias BRs 163 e 230.
O deputado também defende, no PL 5.246/2019, que os municípios possam fazer o licenciamento ambiental de lavras garimpeiras – o modelo, que enfraquece a fiscalização, vigora apenas no estado do Pará.
Ainda na esteira dos projetos pró-garimpo, Mauro propôs no PL 5.822/2019 que a atividade seja permitida em reservas extrativistas, alvo recorrente de invasões por garimpeiros.
Apesar da atuação ruralista contra a proteção ambiental no Congresso, o agronegócio já sofre prejuízos bilionários por conta de eventos climáticos extremos, como as enchentes no Rio Grande do Sul no último maio e, atualmente, a seca na Amazônia.
Questionado sobre a necessidade do setor se comprometer com a agenda climática diante dos prejuízos já presentes, o candidato se reposiciona.
“Com certeza. Você vê a questão do Rio Grande do Sul: lá atrás foi feito um estudo, que precisaria ter sido financiado, que dizia que era preciso tomar as providências prévias para que não acontecesse o que aconteceu. Mas a presidente do PT [Dilma Rousseff] na época não quis dar importância pra isso. O governo federal ainda não deu a atenção que deveria dar”, responde.
“Não só pela questão do agro. Todos nós, tanto do Rio Grande do Sul como nós aqui do Pará, do Norte, com a questão da seca, pra você ver que sofremos problemas da seca, temos que pensar seriamente em problemas climáticos que ocorrem não só por ação natural, como pela ação do homem também e possamos nos prevenir para que isso não aconteça”, continua, repetindo a indefinição sobre a causa dos desastres climáticos ser antropogênica ou natural.
O volume das caixas de som volta a subir e a reportagem consegue fazer uma última pergunta: essa fala sobre a necessidade de pensar os problemas climáticos implica uma revisão de posicionamento?
“Não. Meu discurso nunca foi contrário ao que falei hoje”, afirma. “O que acontece é que opositores de esquerda plantam essa narrativa de que somos contra o meio ambiente, de que somos homofóbicos, isso e aquilo”, continua.
“Não tenho nada contra a questão do meio ambiente. O que a gente não pode aceitar é que o homem do campo que precisa derrubar uma árvore pra fazer a plantação dele tenha problema por causa disso”, conclui, sem definir se o que considera um problema para o homem do campo é a resposta da lei ou do clima.