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Proposta quer proteção constitucional à natureza, como já fazem Equador e Bolívia, mas enfrentará resistência ruralista

Reportagem
6 de janeiro de 2025
04:00

“Não há planeta B.” A frase dita pela deputada federal Célia Xakriabá (PSOL-MG) retrata a preocupação urgente com a degradação do meio ambiente e justifica a Proposta de Emenda Constitucional (PEC), de sua autoria, que pretende tornar a natureza sujeito de direitos fundamentais. A mudança significa imputar ao poder público o dever de defendê-la e preservá-la. A PEC dos Direitos da Natureza estabelece ainda a imposição de sanções penais e administrativas a quem agir contra os direitos a ela garantidos.

Com 40% assinaturas das 171 necessárias para que a PEC entre em tramitação, a deputada está otimista, mesmo diante de um Congresso com uma forte bancada ruralista. “Não existe vacina para as questões climáticas, isso está na mudança de consciência. […] O Congresso Nacional precisa tomar essa medida para não ser ‘futurocida’”, afirma.

A PEC conta com o apoio de organizações não governamentais como a Avaaz, comunidade internacional de mobilização social que tem como um de seus projetos a petição para reconhecimento do ecocídio. “O Brasil vive a oportunidade histórica de se posicionar como um verdadeiro líder climático. A aprovação desta PEC vai mostrar que estamos realmente comprometidos com o futuro das pessoas e do planeta”, enfatiza a coordenadora de campanhas da Avaaz Bia Calza.

A PEC dos Direitos da Natureza segue a tendência já adotada em países como Equador e Bolívia. Algumas cidades brasileiras já reconhecem a natureza como detentora de direitos, a exemplo de Bonito (MT) e Florianópolis. 

Segundo o procurador-geral da capital catarinense, Zany Leite Jr., 70% da ilha de Florianópolis está preservada. Em 2019, uma emenda na Lei Orgânica do município alterou a redação do art. 133, prevendo diversidade e harmonia com a natureza e proferindo a titularidade de direito.

“Eu vejo essa lei como importante no aspecto sociológico e ideológico para ilustrar a concepção antropocêntrica do direito, que é muito voltado para o homem, e passe a ter também uma visão biocêntrica ou ecocêntrica, mais voltado para a natureza”, afirmou o procurador. Segundo ele, desde que está à frente do órgão ainda não houve registro de punição a agressores do meio ambiente com base no dispositivo.

Dificuldades de aprovação desde a origem

Mesmo com apoio, a PEC dos Direitos da Natureza deve enfrentar dificuldades no Congresso. “A PEC pode zerar as legislações vigentes, considerando que cria uma nova prioridade, por isso acho muito difícil ela ser aprovada da forma que está, embora esteja bem fundamentada”, opina a advogada Paolla Alves, do escritório João Domingos Advogados, que representa clientes ligados ao agronegócio.

Para o advogado constitucionalista e cientista político Pedro Chaves Beff, do escritório Chaves e Azevedo, a PEC vem em um momento de discussão internacional muito forte sobre a pauta do clima. No entanto, há pelo menos dois elementos a considerar.

“Há a dimensão jurídica propriamente dita, a partir das prerrogativas próprias do procedimento legislativo para aprovação, mas existem também as barreiras políticas. Como a gente tem uma Câmara e um Senado com uma bancada ruralista, representativa do agronegócio muito forte, eu vejo que politicamente é difícil de passar”, avalia.

União e urgência

A deputada Célia Xakriabá entende que o desafio de fazer a PEC passar está pautado na importância do debate. “Ter uma legislação ambiental na Constituição Federal dá um respaldo diferenciado. […] A questão é por que as pessoas ficaram tão distantes da terra e das questões ambientais? Parece que meio ambiente é só árvore. Na verdade, a questão ambiental somos nós”, declarou, lembrando que a proposta reforça a luta ativa contra as mudanças climáticas no Brasil, no ano em que o país presidiu o G20, e vem no contexto da proposta de criação do Conselho de Mudança do Clima nas Nações Unidas e às vésperas da COP30, em 2025.

Xakriabá é uma das quatro mulheres indígenas eleitas para a Câmara dos Deputados. Ela é mestra em desenvolvimento sustentável pela Universidade de Brasília (UnB), doutoranda em antropologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e uma das fundadoras da Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade. A deputada destaca o papel de povos originários na proteção de 83% da biodiversidade.

“Povos indígenas representam 20% da solução para barrar a crise climática, e povos com comunidades tradicionais, a exemplo da comunidade quilombola, representam 30%. […] Então reconhecer esses elementos como sujeitos de direito é reconhecer a continuidade de um planeta”, ressaltou.

Edição:
Divulgação/Câmara dos Deputados

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