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Todos os homens do presidente: Compare 13 mulheres candidatas ao STF aos favoritos de Lula

Sociedade civil indicou 13 mulheres para vaga de Barroso, mas favoritos ao cargo são homens; analisamos os currículos

Reportagem
22 de outubro de 2025
12:00
Cadeira vazia com toga no STF
Reprodução: Jures

Em mais de 134 anos de história, dos 172 magistrados que já passaram pela Corte, apenas três eram mulheres, 1,7% do total. Nunca uma negra foi ministra do Supremo Tribunal Federal (STF). Por isso, o presidente Lula lida com uma pressão crescente para indicar uma mulher negra para a vaga do ex-ministro Luís Roberto Barroso, que anunciou seu pedido de aposentadoria no início de outubro. A Agência Pública comparou os currículos de 13 candidatas indicadas por organizações da sociedade civil frente os nomes de homens apontados como favoritos a receber indicação do presidente.

O comparativo revela que as candidatas têm, em média, cinco anos a mais de carreira e ostentam paridade nos quesitos formação acadêmica e publicações editoriais. Do grupo de mulheres, seis têm doutorado, três têm mestrado e as outras são advogadas e bacharéis em direito. Entre os três homens mais especulados, dois são doutores: o Advogado-geral da União, Jorge Messias, e o Ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas. Dantas é o único com pós-doutorado. Já o senador Rodrigo Pacheco é advogado e bacharel em direito. As candidatas variam entre 35 e 66 anos, enquanto os homens alternam de 45 a 49.

Compare 13 candidatas aos três especulados para vaga de ministro do STF

A Pública fez a análise a partir da lista de candidatas publicada pela iniciativa Nós, composta pelas organizações Justa, Themis e Fórum Justiça. “É uma reação rápida a uma flagrante afronta à expectativa de redução das desigualdades no Supremo”, explicou a advogada e diretora executiva da Justa, Luciana Zaffalon.

“É [para] deixar o mais evidente possível que não é por falta de excelentes candidatas, que reúnem atributos dos mais brilhantes nas áreas técnicas, de circulação no âmbito jurídico, de circulação política, [e] com trajetória de compromisso com os valores constitucionais, que a nomeação deixará de ser feita”, concluiu. A organização é um centro de pesquisa e incidência que busca promover a gestão mais democrática das instituições judiciais.

Por que isso importa?

  • Mulheres são mais da metade da população, mas menos de 2% do STF, instituição máxima da Justiça, que, de forma recorrente, decide sobre os direitos dessa população.
  • É preciso verificar o discurso político de autoridades que dizem lutar pela redução de desigualdades e garantir que suas ações seja correspondente, quando há chance.

“As mulheres já são praticamente metade da categoria [jurídica]. E a representação delas em todos os mecanismos de liderança e de gestão é sempre muito minoritária. O Supremo é um exemplo evidente, flagrante, disso”, acrescenta a advogada e integrante do conselho diretor da Themis Denise Dora.

Se as apostas se confirmarem, entretanto, Cármen Lúcia deve seguir sendo a única mulher da corte até ao menos 2028, data da aposentadoria obrigatória do ministro Luiz Fux, a menos que algum magistrado deixe o cargo antes do previsto e abra uma nova vaga. No momento, o atual Advogado-geral da União, Jorge Messias, tem sido apontado nos bastidores como a escolha de Lula.

Desde que assumiu seu terceiro mandato, o presidente já fez duas nomeações, ambas de homens: o ex-advogado do presidente Cristiano Zanin, indicado em junho de 2023 para a vaga de Ricardo Lewandowski, hoje ministro da Justiça, e o ex-governador do Maranhão Flávio Dino, indicado em dezembro de 2023 para o lugar de Rosa Weber. Weber substituiu a primeira mulher da história da corte: Ellen Gracie, indicada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em outubro de 2000.

Barroso participou de sua última sessão na corte no dia 17 de outubro e deixa o tribunal após tê-lo presidido entre setembro de 2023 e 2025. A Constituição define que um ministro do STF deve ser brasileiro nato, ter entre 35 e 69 anos, notável saber jurídico e reputação ilibada. Os indicados pelo presidente depois precisam ser aprovados pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e pelo plenário do Senado Federal.

Após a indicação e aprovação para o cargo, o ministro ou ministra pode atuar no STF até completar 75 anos, quando ele é obrigado a se aposentar, a chamada aposentadoria compulsória. A maior parte das mulheres indicadas pela sociedade civil tem entre 35 e 58 anos. Três têm mais de 60 anos. As treze candidatas são brasileiras, mas uma delas nasceu na Síria.

Na ordem, as ministras substitutas do Tribunal Superior Eleitoral, Edilene Lôbo e Vera Lúcia Santana, e a promotora de justiça do Ministério Público da Bahia, Lívia Sant’Anna Vaz

Além de mulher, negra

Para Zaffalon, é necessário desnaturalizar “a apresentação de apenas homens nas listas de cotados, de melhores apostas e de possíveis indicações”. “Como se pode ter essa tranquilidade de, num contexto de desigualdade como esse, começar a lançar a lista e cogitar nomes apenas de homens?”, questiona.

“A gente tem três cenários. Ou a gente fica como a gente estava, com duas mulheres [brancas] quando o Lula assumiu a presidência, ou o presidente assume a possibilidade histórica que tem diante de si de trazer um avanço civilizatório e ter a primeira ministra negra no Supremo Tribunal Federal, ou ele assume a vanguarda do atraso e mantém essa redução de desigualdade ainda menor”, acrescenta.

Das 13 mulheres indicadas pelas organizações, nove são negras. Entre elas, estão as ministras substitutas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Edilene Lôbo e Vera Lúcia Santana, além da juíza auxiliar no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Karen Luise Vilanova, e da promotora de justiça no Ministério Público da Bahia (MPBA), Lívia Sant’Anna Vaz. Outras organizações, como o Movimento Mulheres Negras Decidem, também enviaram listas com juristas negras para embasar a escolha de Lula. A maior parte dos nomes se repete.

Denise Dora ressalta que indicar uma mulher negra ao Supremo teria efeitos práticos no dia a dia das pessoas. “Tanto a experiência de fazer leis quanto a experiência de aplicar e implementar as leis é uma experiência de poder. Se você leva uma demanda para o sistema de justiça, a maneira como os integrantes, os servidores de carreira desse sistema, vão lidar com a sua demanda, e vão tratar ela com cuidado ou com menos cuidado, com discriminação ou sem discriminação, é muito relevante para a vida das pessoas. E o que a gente vê? Que as demandas que chegam das mulheres e da população negra no sistema de justiça são regular e estruturalmente maltratadas”.

Edição:
Currículo Lattes/Instagram/Reproduçã

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