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Alertas de desmatamento da Amazônia entre agosto e maio sobem 9%, um indício de inversão da queda dos últimos anos

Reportagem
6 de junho de 2025
19:03

Os alertas de desmatamento da Amazônia monitorados pelo sistema Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), aumentaram 92% no mês de maio, na comparação com o mesmo mês do ano passado — foram de 500 km2 para 960 km2. É o segundo mês consecutivo de alta em 2025.

Na somatória de alertas registrados entre agosto do ano passado a maio deste ano, a alta é de 9,1% em relação ao período anterior, acionando o sinal de alerta de que a curva de desmatamento, que vinha sendo de queda desde 2023, pode estar se invertendo de novo.

O dado divulgado nesta sexta-feira, 6 de junho, pelo Inpe e pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima indicou um outro fator de preocupação sobre a Amazônia. Pela primeira vez desde o início da série histórica do Deter, o colapso de áreas da floresta por ação das queimadas teria sido mais relevante para o dado de perda da vegetação do que o chamado corte raso, quando todas as árvores são retiradas – com o uso de motosserra e correntão, por exemplo, em que o solo fica realmente exposto.

E a COP30 com isso?
  • O aumento do desmatamento na Amazônia é um sinal que as mudanças climáticas e os incêndios de vários anos podem estar levando áreas da floresta ao colapso;
  • Tudo isso impacta as estratégias de combate ao fogo e ao desmatamento e dificulta ainda mais que o país alcance as metas de zerar o desmatamento da Amazônia até 2030.

O corte raso sempre foi o fator preponderante para a redução da Amazônia, mas, de acordo com os técnicos do Inpe e dos analistas do MMA, os incêndios dos últimos dois anos, em especial os de 2024, foram tão intensos que passaram a desempenhar um papel mais importante do que jamais teve.

Os 960 km2 de perda observada pelo satélite no mês de maio foram compostos, de acordo com os técnicos, em 48% por desmatamento com solo exposto e em 51% por queimadas que alteraram a composição da floresta. Uma proporção atípica. Em geral, a maior parte se deve ao desmatamento com solo exposto.

Não é fogo atual. Isso seria resultado dos incêndios que ocorreram no ano passado ou até mesmo antes, mas cujo impacto na cobertura da mata, de acordo com os técnicos do Inpe, puderam ser vistos somente agora pelo satélite, neste período em que começa a seca na Amazônia e diminui a ocorrência de nuvens.

Como se trata de uma floresta tropical úmida, quando ocorre incêndio na Amazônia – iniciado na maioria das vezes pelo ser humano –, a floresta é danificada, mas tem chance de se regenerar se não voltar a queimar num curto período de tempo. Mas nos últimos anos, o fogo foi tão intenso, que partes da floresta não foram apenas degradadas.

“Agora vemos que as florestas incendiadas no segundo semestre do ano passado colapsaram” disse João Paulo Capobianco, secretário-executivo do MMA, em entrevista coletiva sobre os dados.

De acordo com Claudio Almeida, coordenador do Programa de Monitoramento do Inpe, por colapso eles querem dizer que as áreas de floresta que foram queimadas sofreram um impacto tão “intenso e dramático” que elas deixaram de “ter papel de floresta”. Quando o dossel da área em questão foi reduzido a 30% do que era originalmente, isso acaba entrando como “desmatamento por degradação progressiva” no monitoramento do Deter.

Segundo Almeida, não é a primeira vez que essas perdas de vegetação relacionadas ao fogo aparecem no Deter, mas é a primeira vez que alcançam uma proporção tão grande, de 51%, no dado do mês. Em maio do ano passado, por exemplo, que também se seguiu aos grandes incêndios de 2023, a proporção das queimadas no desmatamento daquele mês foi de 21%. A maior, até então, tinha sido de 32%, em maio de 2023. Mas antes disso não tinha passado de 14%, em maio de 2018.

Após a coletiva, em entrevista à Agência Pública, Almeida disse que o dado só apareceu agora, em maio, porque depois das queimadas do ano passado, veio a temporada de chuva na Amazônia, permitindo o crescimento de uma vegetação arbustiva nas florestas queimadas, que acabam confundindo um pouco a visualização do satélite.

Mas com o início da temporada seca, essa vegetação tende a morrer, deixando mais fácil a visualização das áreas em que a estrutura florestal realmente colapsou.

“Minha hipótese é que o incêndio florestal de 2024 foi tão intenso, já que as temperaturas estavam muito altas e as florestas estavam muito mais secas, que o impacto acabou sendo muito maior do que a gente jamais tinha visto”, disse. Em 2024, a Amazônia sofreu com uma seca histórica, apontada como resultado das mudanças climáticas, e foi batido o recorde de área queimada, cerca de 40 mil km2.

Na coletiva, Capobianco frisou que o dado relativo ao mês de maio não é, em sua maioria, do desmatamento no sentido mais estrito, de corte raso, que é normalmente o foco dos mecanismos de fiscalização e controle.

Mas reconheceu que isso acende o sinal de alerta de que vai ser preciso ajustar as ações para evitar ainda mais que o fogo ocorra. E de que as mudanças climáticas trazem um desafio extra. “Nós vamos seguir enfrentando o desmatamento super firmemente, mas isso não é mais suficiente [para conter a perda da Amazônia]”, afirmou à Pública.

Para Capobianco, o agravamento dos incêndios vai exigir um tipo de não que não era a realidade na Amazônia. “Historicamente, os incêndios na Amazônia eram principalmente em áreas já abertas [desmatadas]. Isso mudou.” No segundo semestre do ano passado, 24% dos incêndios ocorreram em área de floresta em pé.

Já é de se esperar que esses dados negativos acabem impactando a taxa oficial de desmatamento deste ano, que costuma ser concluída pelo Inpe em novembro. Depois de dois anos de queda, é possível que haja uma alta na taxa de 2025 – dado que deverá sair às vésperas da realização da Conferência do Clima da ONU no Brasil, a COP30.

Questionado sobre se o dado não poderá ser interpretado como uma perda de controle bem no momento em que o Brasil tenta se apresentar como um líder climático, o secretário defendeu que o combate ao problema das queimadas na Amazônia vai depender também do esforço internacional de conter as mudanças climáticas.

“Se nós não trabalharmos o entendimento da corresponsabilidade internacional com o fato de as florestas tropicais estarem se tornando mais suscetíveis a incêndios, menos resilientes, como é que nós vamos enfrentar essa questão? É um desafio monumental, é um desafio que transcende a capacidade institucional de cada país.”

Edição:
Rogério Cassimiro/MMA

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