Os agentes da repressão que combatiam os guerrilheiros do PCdoB na região do Araguaia, na primeira metade dos anos 1970, eram conhecidos como “doutores” e, embora suas identidades verdadeiras fossem reveladas aos poucos, sempre se soube que eram militares. O tenente-coronel da reserva Sebastião Rodrigues de Moura, o major Curió, por exemplo, era chamado de doutor Luchini.
Algumas dessas identidades, no entanto, permanecem desconhecidas e podem esconder surpresas, como a participação de policiais civis de São Paulo na repressão do Araguaia. Esse seria o caso do doutor Silva ou Carlos, mais tarde identificado por ex-soldados e camponeses como o senador do PTB e ex-superintendente da Polícia Federal Romeu Tuma, falecido em 2010. Na época da Guerrilha do Araguaia (1972-1975), ele integrava o Departamento de Ordem Política e Social (Dops) de São Paulo, órgão responsável pela repressão aos militantes de oposição à ditadura civil-militar instalada em 1964.
A Pública entrevistou um ex-mateiro, três ex-soldados e um ex-funcionário do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) – todos eles moradores da região do Araguaia – que afirmam que Tuma esteve na região no período entre 1972 e 1976. O ex-senador teria sido visto nas bases de Bacaba e Xambioá e na sede do DNER (Departamento Nacional de Estradas e Rodagem), locais onde guerrilheiros e camponeses eram torturados e mortos.
Abel Honorato de Jesus, o Abelinho, trabalhou como mateiro do Exército e, por isso, morou um tempo na base de Bacaba. Ele conta ter visto o “doutor Silva” muitas vezes. A primeira teria sido no segundo semestre de 1972, na própria base. “Ele vinha de helicóptero para todas as missões que aconteciam lá. Mas também vi ele no DNER”, diz. Na época, o DNER era conhecido como Casa Azul.
Abelinho acredita que a função do “doutor Silva” era “embalar e resgatar os corpos” dos guerrilheiros mortos nas operações. “Ele vinha para as operações das mortes”. Segundo o ex-mateiro, Tuma “mandava no pessoal do Dops que fazia a bravura, que batia. Era ele que mandava”, garante.
DESPACHANTES MORTOS
O ex-soldado Manoel Messias Guido Ribeiro servia na base de Xambioá e afirma ter visto o “doutor Silva” pela primeira vez em maio de 1974. “Ele chegou num avião Búfalo [da FAB]. O doutor Luchini [Curió] também estava lá. Ele e o Luchini não falavam com quase ninguém”. Guido diz que sempre que havia um prisioneiro na base, “Silva” aparecia. Ele também afirma ter visto o ex-delegado na sede do DNER e no Quartel 52 Bis “E a história que existia era que ele que preparava os corpos para dar despacho. Diziam assim: ‘O doutor Silva está despachando os mortos hoje’”.
Outro ex-soldado, Antonio Adalberto Fonseca, corrobora a afirmação do colega. Segundo ele, quando o “doutor Silva” aparecia em algum lugar, “era porque ia morrer ou já tinha morrido gente, ou na Bacaba, ou em Xambioá, São Geraldo ou Casa Azul”, sustenta. O ex-soldado Fonseca afirma que a primeira vez que viu Tuma foi em 1974, na base de Xambioá. “Ele usava roupa de civil, calça jeans, camiseta branca e camisa de linho por fora”.
Guido relata que a primeira vez que viu um guerrilheiro foi também em maio de 1974, quando Daniel Ribeiro Callado, o Doca, foi preso em Xambioá. “Eu cheguei lá e ele estava amarrado num pau, em frente ao comando. Ele estava machucado, tinha sido torturado. Estava calmo, falava baixo”. O ex-soldado conta que o guerrilheiro era um homem simpático, de cabelo liso, e que estava bronzeado. “Conversamos muito, perguntei a ele o que era ser guerrilheiro, e ele disse que estava atrás de liberdade”.
Guido garante que nessa ocasião Romeu Tuma esteve no local. “Chegaram, tiveram uma reunião no comando e voaram de novo para o lado de Marabá”. Depois, conta Guido, Daniel foi levado para a serra das Andorinhas, onde seria assassinado. Outros testemunhos que constam no processo do Araguaia confirmam a presença de Daniel em Xambioá mas o episódio de sua morte tem outra versão, apresentada por um militar à juíza Solange Salgado em sigilo. O guerrilheiro teria sido preso em Araguatins, após atravessar o rio Araguaia. Em seguida, teria sido levado para a base militar em Bacaba, onde morreria em julho de 1974.
ALGEMADO E BRANCO
Guido também teria visto Romeu Tuma no S2, Serviço de inteligência do Exército. “Entrei lá para levar um material para o sargento Cleiton. Quando entrei numa sala, tinha um cidadão algemado e branco numa cadeira e o Silva estava lá”.
Todos os entrevistados que afirmam ter visto Tuma na região do Araguaia na época da guerrilha descobriram seu nome e função verdadeiros na década de 1980, quando o viram na televisão como chefe da Polícia Federal. “Quando eu vi ele na tevê, pensei: ‘ah, olha o doutor Silva’”.
O livro “Habeas Corpus – Que se apresente o corpo”, da Secretaria dos Direitos Humanos, também faz referência à presença do ex-senador no local: “Segundo relatos recentes de moradores coligidos pela ouvidoria do GTT, existe a menção de que o conhecido delegado Romeu Tuma teria comandado uma equipe deslocada para o Araguaia para promover a remoção de cadáveres usando o nome de Delegado Silva”.
Em sua atuação na região do Araguaia, o pesquisador Paulo Fonteles Filho, do Grupo de Trabalho do Araguaia (GTA), ouviu o relato de Abelinho e outros ex-mateiros que identificaram o ex-senador Romeu Tuma como um dos ‘doutores’ que combatiam a guerrilha. Seu relatório consta do processo que investiga o desaparecimento dos guerrilheiros do Araguaia.
Em 2009, o Ministério Público Federal ajuizou ação civil contra Romeu Tuma com a acusação de ocultação de cadáveres de militantes políticos durante a ditadura militar (1964-1985). Segundo o processo, desaparecidos políticos foram sepultados nos cemitérios de Perus e Vila Formosa, em São Paulo, de forma “ilegal” e “clandestina”, com a cumplicidade do Instituto Médico Legal (IML) e da prefeitura local.
A ação ressalta a participação nas operações de agentes do Dops paulista, comandado por Tuma entre 1977 e 1983. O MPF alegou a existência de documentos que comprovam a ocorrência de interrogatórios sob tortura na instituição e que demonstram que o ex-senador tinha conhecimento das várias mortes ocorridas sob a tutela de policiais comandados por ele mas não as comunicou aos familiares dos mortos.
AUTORIDADES
Quem também afirma ter conhecido o ex-delegado Romeu Tuma no Araguaia, mas com o nome de “doutor Carlos”, é o ex-militar e ex-motorista do Exército Valdim Pereira de Souza: “Eu dirigi bastante para ele e para o Curió. Os dois eram os chefões lá. A gente achava que eles eram autoridades porque quando eles chegaram no quartel, vinham de helicóptero, que pousava no meio do pátio”. Valdim teria conhecido Tuma em 1975, após o final da guerrilha. Ele conta que entre os soldados, “doutor Carlos” era conhecido como ‘cara de cavalo’, devido ao formato de seu rosto. “Ele tinha uma cara grandona”.
Os destinos de “doutores” eram os mais variados, e o objetivo era sempre buscar um prisioneiro para levar para o quartel do batalhão 52 bis ou para o DNER. “Não dava para ver se o preso era morador ou guerrilheiro, porque eles iam vendados, com capuz, e alguns algemados”.
Valdim também relata que na época da “Operação Limpeza”, em 1976, o“doutor Carlos” estava sempre por lá. “Mas ele não demorava muito. Aí sumia, passava um tempo e aparecia de novo”.
João Mendes Vilarins é mais um dos moradores da região do Araguaia que afirma ter conhecido Romeu Tuma como “doutor Carlos”. Ele trabalhava como pedreiro e carpinteiro do Incra quando teria visto Tuma pela primeira vez na sede do instituto, em 1975. Vilarins afirma que foi contratado para reformar uma casa no bairro do Novo Horizonte, em Marabá, onde a Polícia Federal se instalaria. “A casa era para ele trabalhar lá. Reformamos o prédio e ele foi para lá. Na casa, eles tinham umas argolas chumbadas no chão para prender gente”. No período da reforma, ‘doutor Carlos’ teria ido duas ou três vezes na casa. “Depois, não vi mais ele. Só muitos anos depois, na tevê, primeiro como chefe da Polícia Federal e depois como deputado federal”.
DIRETOR DO DOPS
Romeu Tuma ingressou em 1951 na Polícia Civil de São Paulo, e em 1967 tornou-se delegado. Dois anos depois, passou a trabalhar com no Serviço de Inteligência do Dops, que passou a dirigir em 1977. Exerceu o cargo até 1983. Apesar do órgão ter se notabilizado por ser um local de torturas, Tuma dizia desconhecer a existência de tais práticas na unidade, bem como de assassinatos e desaparecimentos.
Em 1983, com a extinção do Dops, assumiu o cargo de superintendente da Polícia Federal em São Paulo e levou consigo os arquivos do órgão de repressão. Em 1986, tornou-se diretor da Polícia Federal em Brasília. Anos depois, foi acusado de “arrumar” os arquivos do Dops antes se serem tornado públicos, retirando documentos importantes para o esclarecimento de crimes. As fraudes teriam ocorrido quando o ex-presidente Fernando Collor de Mello se propôs a entregar, ao governo de São Paulo, os arquivos do Dops. Na época, o arcebispo de São Paulo, dom Paulo Evaristo Arns, afirmou ter recebido denúncias de que os arquivos estavam sendo esvaziados, motivando uma vigília de vítimas e famililares de vítimas da ditadura em frente à sede da PF, em São Paulo. À época, alguns familiares como Suzana Lisbôa, constataram que havia arquivos inteiros esvaziados, entre eles o que mantinha a etiqueta “colaboradores” e “Araguaia”.
VÍDEO: 5 MIL CRUZEIROS POR CABEÇA
Leia mais: “O terrorismo de Estado persiste até hoje”, diz juíza
em que aconteceu a repressão aos militantes do PCdoBPor Tatiana Merlino, de Marabá (PA)Os agentes da repressão que combatiam os guerrilheiros do PCdoB na
região do Araguaia, na primeira metade dos anos 1970, eram conhecidos
como “doutores” e, embora suas identidades verdadeiras fossem
reveladas aos poucos, sempre se soube que eram militares. O
tenente-coronel da reserva Sebastião Rodrigues de Moura, o major
Curió, por exemplo, era chamado de doutor Luchini.
Algumas dessas identidades, no entanto, permanecem desconhecidas e
podem esconder surpresas, como a participação de policiais civis de
São Paulo na repressão do Araguaia. Esse seria o caso do doutor Silva
ou Carlos, mais tarde identificado por ex-soldados e camponeses como o
senador do PTB e ex-superintendente da Polícia Federal Romeu Tuma,
falecido em 2010. Na época da Guerrilha do Araguaia (1972-1975), ele
integrava o Departamento de Ordem Política e Social (Dops) de São
Paulo, órgão responsável pela repressão aos militantes de oposição à
ditadura civil-militar instalada em 1964.
A Pública entrevistou um ex-mateiro, três ex-soldados e um
ex-funcionário do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
(Incra) – todos eles moradores da região do Araguaia – que afirmam que
Tuma esteve na região no período entre 1972 e 1976. O ex-senador teria
sido visto nas bases de Bacaba e Xambioá e na sede do DNER
(Departamento Nacional de Estradas e Rodagem), locais onde
guerrilheiros e camponeses eram torturados e mortos.
Abel Honorato de Jesus, o Abelinho, trabalhou como mateiro do Exército
e, por isso, morou um tempo na base de Bacaba. Ele conta ter visto o
“doutor Silva” muitas vezes. A primeira teria sido no segundo semestre
de 1972, na própria base. “Ele vinha de helicóptero para todas as
missões que aconteciam lá. Mas também vi ele no DNER”, diz. Na época,
o DNER era conhecido como Casa Azul.
Abelinho acredita que a função do “doutor Silva” era “embalar e
resgatar os corpos” dos guerrilheiros mortos nas operações. “Ele vinha
para as operações das mortes”. Segundo o ex-mateiro, Tuma “mandava no
pessoal do Dops que fazia a bravura, que batia. Era ele que mandava”,
garante.Despachando mortos
O ex-soldado Manoel Messias Guido Ribeiro servia na base de Xambioá e
afirma ter visto o “doutor Silva” pela primeira vez em maio de 1974.
“Ele chegou num avião Búfalo [da FAB]. O doutor Luchini [Curió] também
estava lá. Ele e o Luchini não falavam com quase ninguém”. Guido diz
que sempre que havia um prisioneiro na base, “Silva” aparecia. Ele
também afirma ter visto o ex-delegado na sede do DNER e no Quartel 52
Bis “E a história que existia era que ele que preparava os corpos para
dar despacho. Diziam assim: ‘O doutor Silva está despachando os mortos
hoje’”.
Outro ex-soldado, Antonio Adalberto Fonseca, corrobora a afirmação do
colega. Segundo ele, quando o “doutor Silva” aparecia em algum lugar,
“era porque ia morrer ou já tinha morrido gente, ou na Bacaba, ou em
Xambioá, São Geraldo ou Casa Azul”, sustenta. O ex-soldado Fonseca
afirma que a primeira vez que viu Tuma foi em 1974, na base de
Xambioá. “Ele usava roupa de civil, calça jeans, camiseta branca e
camisa de linho por fora”.
Guido relata que a primeira vez que viu um guerrilheiro foi também em
maio de 1974, quando Daniel Ribeiro Callado, o Doca, foi preso em
Xambioá. “Eu cheguei lá e ele estava amarrado num pau, em frente ao
comando. Ele estava machucado, tinha sido torturado. Estava calmo,
falava baixo”. O ex-soldado conta que o guerrilheiro era um homem
simpático, de cabelo liso, e que estava bronzeado. “Conversamos muito,
perguntei a ele o que era ser guerrilheiro, e ele disse que estava
atrás de liberdade”.
Guido garante que nessa ocasião Romeu Tuma esteve no local. “Chegaram,
tiveram uma reunião no comando e voaram de novo para o lado de
Marabá”. Depois, conta Guido, Daniel foi levado para a serra das
Andorinhas, onde seria assassinado. Outros testemunhos que constam no
processo do Araguaia confirmam a presença de Daniel em Xambioá mas o
episódio de sua morte tem outra versão, apresentada por um militar à
juíza Solange Salgado em sigilo. O guerrilheiro teria sido preso em
Araguatins, após atravessar o rio Araguaia. Em seguida, teria sido
levado para a base militar em Bacaba, onde morreria em julho de 1974.Algemado e branco
Guido também teria visto Romeu Tuma no S2, Serviço de inteligência do
Exército. “Entrei lá para levar um material para o sargento Cleiton.
Quando entrei numa sala, tinha um cidadão algemado e branco numa
cadeira e o Silva estava lá”.
Todos os entrevistados que afirmam ter visto Tuma na região do
Araguaia na época da guerrilha descobriram seu nome e função
verdadeiros na década de 1980, quando o viram na televisão como chefe
da Polícia Federal. “Quando eu vi ele na tevê, pensei: ‘ah, olha o
doutor Silva’”.
O livro “Habeas Corpus – Que se apresente o corpo”, da Secretaria dos
Direitos Humanos, também faz referência à presença do ex-senador no
local: “Segundo relatos recentes de moradores coligidos pela ouvidoria
do GTT, existe a menção de que o conhecido delegado Romeu Tuma teria
comandado uma equipe deslocada para o Araguaia para promover a remoção
de cadáveres usando o nome de Delegado Silva”.
Em sua atuação na região do Araguaia, o pesquisador Paulo Fonteles
Filho, do Grupo de Trabalho do Araguaia (GTA), ouviu o relato de
Abelinho e outros ex-mateiros que identificaram o ex-senador Romeu
Tuma como um dos ‘doutores’ que combatiam a guerrilha. Seu relatório
consta do processo que investiga o desaparecimento dos guerrilheiros
do Araguaia.
Em 2009, o Ministério Público Federal ajuizou ação civil contra Romeu
Tuma com a acusação de ocultação de cadáveres de militantes políticos
durante a ditadura militar (1964-1985). Segundo o processo,
desaparecidos políticos foram sepultados nos cemitérios de Perus e
Vila Formosa, em São Paulo, de forma “ilegal” e “clandestina”, com a
cumplicidade do Instituto Médico Legal (IML) e da prefeitura local.
A ação ressalta a participação nas operações de agentes do Dops
paulista, comandado por Tuma entre 1977 e 1983. O MPF alegou a
existência de documentos que comprovam a ocorrência de interrogatórios
sob tortura na instituição e que demonstram que o ex-senador tinha
conhecimento das várias mortes ocorridas sob a tutela de policiais
comandados por ele mas não as comunicou aos familiares dos mortos.Autoridades
Quem também afirma ter conhecido o ex-delegado Romeu Tuma no Araguaia,
mas com o nome de “doutor Carlos”, é o ex-militar e ex-motorista do
Exército Valdim Pereira de Souza: “Eu dirigi bastante para ele e para
o Curió. Os dois eram os chefões lá. A gente achava que eles eram
autoridades porque quando eles chegaram no quartel, vinham de
helicóptero, que pousava no meio do pátio”. Valdim teria conhecido
Tuma em 1975, após o final da guerrilha. Ele conta que entre os
soldados, “doutor Carlos” era conhecido como ‘cara de cavalo’, devido
ao formato de seu rosto. “Ele tinha uma cara grandona”.
Os destinos de “doutores” eram os mais variados, e o objetivo era
sempre buscar um prisioneiro para levar para o quartel do batalhão 52
bis ou para o DNER. “Não dava para ver se o preso era morador ou
guerrilheiro, porque eles iam vendados, com capuz, e alguns
algemados”.
Valdim também relata que na época da “Operação Limpeza”, em 1976,
o“doutor Carlos” estava sempre por lá. “Mas ele não demorava muito. Aí
sumia, passava um tempo e aparecia de novo”.
João Mendes Vilarins é mais um dos moradores da região do Araguaia
que afirma ter conhecido Romeu Tuma como “doutor Carlos”. Ele
trabalhava como pedreiro e carpinteiro do Incra quando teria visto
Tuma pela primeira vez na sede do instituto, em 1975. Vilarins afirma
que foi contratado para reformar uma casa no bairro do Novo Horizonte,
em Marabá, onde a Polícia Federal se instalaria. “A casa era para ele
trabalhar lá. Reformamos o prédio e ele foi para lá. Na casa, eles
tinham umas argolas chumbadas no chão para prender gente”. No período
da reforma, ‘doutor Carlos’ teria ido duas ou três vezes na casa.
“Depois, não vi mais ele. Só muitos anos depois, na tevê, primeiro
como chefe da Polícia Federal e depois como deputado federal”.Diretor do Dops
Romeu Tuma ingressou em 1951 na Polícia Civil de São Paulo, e em 1967
tornou-se delegado. Dois anos depois, passou a trabalhar com no
Serviço de Inteligência do Dops, que passou a dirigir em 1977. Exerceu
o cargo até 1983. Apesar do órgão ter se notabilizado por ser um local
de torturas, Tuma dizia desconhecer a existência de tais práticas na
unidade, bem como de assassinatos e desaparecimentos.
Em 1983, com a extinção do Dops, assumiu o cargo de superintendente
da Polícia Federal em São Paulo e levou consigo os arquivos do órgão
de repressão. Em 1986, tornou-se diretor da Polícia Federal em
Brasília. Anos depois, foi acusado de “arrumar” os arquivos do Dops
antes se serem tornado públicos, retirando documentos importantes para
o esclarecimento de crimes. As fraudes teriam ocorrido quando o
ex-presidente Fernando Collor de Mello se propôs a entregar, ao
governo de São Paulo, os arquivos do Dops. Na época, o arcebispo de
São Paulo, dom Paulo Evaristo Arns, afirmou ter recebido denúncias de
que os arquivos estavam sendo esvaziados, motivando uma vigília de
vítimas e famililares de vítimas da ditadura em frente à sede da PF,
em São Paulo. À época, alguns familiares como Suzana Lisbôa,
constataram que havia arquivos inteiros esvaziados, entre eles o que
mantinha a etiqueta “colaboradores” e “Araguaia”.