De olho
Votações ameaçam causar impacto de R$ 36,7 bilhões nos cofres públicos
A semana que passou foi tranquila para a presidente Dilma Rousseff quanto à “pauta-bomba” do seu autodeclarado oposicionista presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Mas os próximos dias de atividade legislativa podem revelar a impermeabilidade da situação política, com possíveis aprovações de medidas que levam a um rombo de R$ 36,7 bilhões aos cofres públicos.
O peemedebista deve colocar para apreciação do plenário projeto de lei complementar (25/2007) que trata do Supersimples. O dispositivo modifica o Estatuto da Micro e Pequena Empresa e ajusta os valores para enquadramento no regime tributário do Supersimples, de R$ 360 mil para R$ 900 mil (receita bruta por ano), para microempresas, e de R$ 3,6 milhões para R$ 14,4 milhões (receita bruta por ano) para pequenas empresas.
O texto também estabelece a criação da Empresa Simples de Crédito, em que investidores podem aplicar recursos diretamente em pequenos negócios, uma forma de aumentar o volume de crédito disponível às micro e pequenas empresas. O Ministério do Planejamento calculou que, se a medida for aprovada, o aumento da faixa de concessão causará um impacto de R$ 11 bilhões na arrecadação.
O veto presidencial sobre reajuste salarial de 56% ao Judiciário também deverá ser votado. As Casas legislativas devem se juntar para apreciar o veto que, se derrubado, irá desfavorecer o ajuste fiscal do governo, pois resultará em um rombo de R$ 25,7 bilhões às contas públicas.
Uma medida que poderia amenizar os possíveis efeitos de itens aprovados na “pauta-bomba” aguarda na fila do Senado. Adiada pela terceira vez consecutiva, prevê-se a votação de projeto de lei que pretende repatriar dinheiro remetido ao exterior sem a devida declaração à Receita Federal. Estima-se que o total não declarado no exterior chegue a US$ 200 bilhões, dez vezes mais do que o governo espera angariar com as medidas do arrocho fiscal.
Também deverão entrar na pauta da Casa legislativa propostas compreendidas pelo Pacto Federativo. Estão prontas para apreciação medidas provisórias que criam os fundos de custeio (compensatório e de infraestrutura) e matéria que estabelece alíquotas de ICMS nas operações e prestações interestaduais. O assunto sempre reacende a discussão sobre a competição entre estados e municípios – a já mencionada guerra fiscal – e a distribuição de nacos do bolo tributário concentrado nas mãos da União.
Truco, Guimarães!
“Pessoalmente, sou favorável a uma nova forma de financiamento da saúde, mas o governo nunca discutiu isso ou a CPMF.” – José Guimarães (PT-CE), líder do governo na Câmara, em entrevista a jornalistas, na quinta-feira (27)
O governo estuda enviar uma proposta de emenda constitucional que traria de volta a CPMF, segundo reportagem publicada no Estadão. A medida faria parte de um pacote de ações para elevar as receitas do governo no orçamento do ano que vem, mas sua apresentação estaria condicionada ao impacto político. Em debate na Comissão Mista de Orçamento do Congresso na terça-feira (25), o ministro da Saúde, Arthur Chioro, chegou a dizer que o Sistema Único de Saúde (SUS) era subfinanciado. Em junho, durante o 5º Congresso do PT, o presidente do partido, Rui Falcão, defendeu a volta do imposto ou de algo semelhante.
Perguntamos:
- O governo estuda a volta da CPMF ou de um imposto semelhante para financiar a saúde?
- Como esse novo imposto funcionaria?
- O governo delegou ao senhor, como líder, a tarefa de apresentar o projeto e arcar com os custos políticos disso?
“Quero lamentar, por outro lado, a irresponsabilidade deste governo federal, que paga a esses recrutas [do serviço militar obrigatório], a título de salário bruto, R$ 642, uma importância abaixo do salário mínimo.” – Jair Bolsonaro (PP-RJ), no plenário, na terça-feira (25)
O soldo destinado a recrutas do Exército, da Marinha e da Aeronáutica é mesmo de R$ 642. Isso não quer dizer que o pagamento esteja irregular, como insinuou o deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ). O direito constitucional do trabalhador de receber pelo menos um salário mínimo não vale para os militares.
A questão foi analisada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2008, por meio do julgamento de um recurso de um recruta contra a União. Na época, a corte decidiu que o pagamento inferior ao salário mínimo era constitucional. “Praças que prestam serviço militar inicial obrigatório não tinham, como não têm, o direito a remuneração, pelo menos equivalente, ao salário mínimo em vigor, afigurando-se juridicamente inviável classificá-los, por extensão, como trabalhadores na acepção que o inciso IV do artigo 7º da Carta Magna empresta ao conceito”, justificou o relator, Ricardo Lewandowski, em seu voto.
Segundo o ministro do STF, os militares se enquadram em um regime jurídico próprio, diferente daquele dos servidores civis. Não podem, por exemplo, fazer greves ou serem filiados a partidos políticos. A única obrigação do governo federal, por isso, seria fornecer “as condições materiais para a adequada prestação do serviço militar obrigatório nas Forças Armadas”. A decisão transformou-se na Súmula Vinculante 6, mecanismo que obriga todos os juízes do país a seguirem o que o STF determinou.
Os recrutas, no entanto, recebem hoje um o valor muito mais próximo do salário mínimo. Segundo o Ministério da Defesa, também é paga uma gratificação por habilitação, que aumenta o soldo em 12%. A quantia equivale a R$ 77,04. O valor total chega, portanto, a R$ 719,04. Como o salário mínimo atualmente está em R$ 788, a diferença é de R$ 68,96. O valor do soldo também tem sido reajustado ano a ano. Em 2012, era de R$ 492. Passou a R$ 537 em 2013, para R$ 588 em 2014 e chegou a R$ 642 este ano. Os recrutas têm também direito a assistência médica das Forças Armadas.
“PRB, 10 anos de prática ilesa da democracia! (…) Sem mácula, sem malícia, sem ambições desvairadas, sem corrupção! (…) Hoje o nosso partido pode se apresentar ao Brasil como um partido ficha limpa, que não tem medo do povo.” – Marcelo Crivella (PRB-RJ), senador, no plenário, em sessão solene de homenagem ao PRB na Câmara, na terça-feira (25)
O PRB não pode dizer que é um partido “sem máculas”. Na última eleição, pelo menos cinco candidatos a deputado federal e um a deputado estadual da legenda foram impedidos de se candidatar por terem sido enquadrados na Lei da Ficha Limpa.
Foram barrados o ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto (MG), condenado por irregularidades no processo seletivo de funcionários da Secretaria de Saúde e na contratação de empresa de publicidade sem licitação, entre outras, na época em que era prefeito de Uberaba; Orlando Palheta Lobato (PA), que teve as contas reprovadas pelo Tribunal de Contas do Estado do Pará quando dirigia a Federação dos Pescadores do Pará; Roberto Ramalho Tavares (SP), ex-prefeito de Itapetininga (SP); Ronaldo Resende Ribeiro, ex-prefeito de Oliveira (MG); Rubens Sanchez Proença (SP), condenado por estelionato; e Zé Carlos da Pesca (BA), que teve as contas rejeitadas pelo Tribunal de Contas do Estado da Bahia por irregularidades, quando era gestor da Federação dos Pescadores do Estado da Bahia.
Há outros casos que envolvem políticos do partido. O deputado federal Beto Mansur (PRB-SP) é acusado de manter 46 trabalhadores em situação análoga à escravidão em uma de suas propriedades, no interior de Goiás. No grupo, havia sete menores de 18 anos. Em 2014, o caso rendeu uma condenação do Tribunal Superior do Trabalho (TST) ao parlamentar: uma indenização de R$ 200 mil por dano moral coletivo. Mansur responde ainda a outros inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF) por trabalho escravo, crime de responsabilidade e crime praticado por funcionário público contra a administração em geral.
No fim do ano passado, o pastor Saulo Rodrigues, vereador do PRB em Ribeirão Preto (SP), foi condenado por estelionato a quatro anos e dois meses de prisão, por participar do esquema da Máfia das Ambulâncias. Ele firmou convênios com o Ministério da Saúde para a compra de equipamentos de saúde. Segundo a Justiça, em dois deles os valores estavam superfaturados. O pastor Marcos Roberto Abramo, que era deputado estadual em São Paulo pelo PP, saiu do partido e tornou-se vereador em Betim (MG), pelo PRB, foi condenado também por participar do esquema.
Em maio deste ano, compras e aquisição de serviços feitas de modo irregular, sem licitação, fizeram a prefeita de Anapurus (MA), Cleomaltina Moreira Monteles (PRB), ser condenada a cinco anos e dez meses de detenção. Além desses casos, há várias outras denúncias contra políticos do partido que ainda aguardam julgamento.
“Quero dizer da nossa alegria de, ao lado da presidenta Dilma, que está dando continuidade à obra, termos inaugurado essa primeira fase [do Projeto de Integração do Rio São Francisco]. São 77,8% das obras já construídas.” – Fátima Bezerra (PT-RN), senadora, no plenário, na terça-feira (25)
O porcentual de conclusão do Projeto de Integração do São Francisco, informado pela senadora Fátima Bezerra (PT-RN), está correto. Mas o projeto, que fará a transposição de parte das águas do rio para o sertão nordestino, sofreu sucessivos atrasos e já devia ter sido concluído.
A previsão do governo federal, em 2007, era de que a maior parte do projeto estaria terminada em 2010. Em maio do ano passado, no entanto, a presidente Dilma Rousseff admitiu que a data havia sido subestimada. Na época, ela afirmou que a conclusão ocorreria em 2015. “A previsão de entrega total é em dezembro de 2015. Mas o projeto de integração do rio não necessita que 100% da engenharia esteja funcionando para começar a servir de utilidade para o semiárido nordestino”, disse, durante entrevista coletiva.
Em maio deste ano, no entanto, o ministro da Integração Nacional, Gilberto Occhi, esticou ainda mais o prazo, durante uma audiência pública promovida pela Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo do Senado. Agora, a estimativa é que o trabalho seja concluído até 2017. Na ocasião, o ministro afirmou que não havia nada de errado com a mudança no prazo de entrega. “Essa obra começou em 2008 e nós estamos em 2015, portanto aí são 7 anos. Nossa previsão é nos próximos dois anos entregar essa obra. Nós vamos estar compatíveis com a execução mundial de obras dessa natureza”, disse. Ao conversar com técnicos no canteiro de obras do Eixo Leste, em dezembro de 2013, a repórter Marcia Dementshuk, uma das vencedoras do projeto Reportagem Pública, descobriu que, ainda que as obras estejam concluídas, as águas demorariam três anos para encher os reservatórios na extensão do Eixo Leste.
O custo do projeto também pode aumentar mais uma vez. Orçado inicialmente em R$ 4,7 bilhões, o valor já subiu para R$ 8,2 bilhões. “É possível que tenhamos, sim, a necessidade de suplementação”, afirmou o ministro Occhi, em audiência no Senado. Isso ocorreria até o final do ano.
“De acordo com estudo realizado, a taxa de juros do Brasil é de 14,25%. Em conformidade com esse estudo, descontada a inflação dos últimos 12 meses, a taxa de juros reais no Brasil está em 4,92%. É a maior do mundo.” – Álvaro Dias (PSDB-PR), no plenário, na terça-feira (25)
Apesar de elevada, não existem dados atualizados que permitam afirmar que o Brasil tem a maior taxa de juros do mundo. O Banco Central, por exemplo, monitora apenas 13 economias, todas com índices inferiores ao brasileiro.
O estudo citado pelo senador Álvaro Dias (PSDB-PR), publicado em julho pela consultoria MoneYou, comparou somente as 40 maiores economias globais. Como a Organização das Nações Unidas (ONU) tem 193 membros, o universo analisado representa apenas 20,7% do planeta. Nesse grupo, que é limitado, o Brasil apresenta as mais elevadas taxas de juros reais. Consideradas as taxas de juros nominais – que não levam em conta a inflação –, o Brasil cai para o terceiro lugar da lista, atrás da Argentina e Venezuela.
Segundo os dados mais recentes do Banco Mundial, relativos a 2014, o Brasil teve a terceira maior taxa de juros reais entre 110 países pesquisados, atrás de Madagascar e da Líbia – mesma posição do ranking de 2013, quando foram monitoradas 127 economias. Apesar de ser mais completo, o levantamento também não é abrangente o suficiente para incluir todos os membros da ONU.
Definida pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, a taxa Selic corresponde aos juros nominais da economia brasileira e serve de base para estabelecer outros índices, como aqueles cobrados em empréstimos bancários. Em 30 de julho, a Selic atingiu o maior valor desde 2006, 14,25%.
“Tenho orgulho de ter a minha campanha financiada por pessoas físicas.” – Érika Kokay (DF), vice-líder do PT na Câmara, na quinta-feira (27), durante bate-boca com parlamentares na CPI dos Fundos de Pensão
A maior parte das doações recebidas pela parlamentar nas eleições do ano passado realmente veio de pessoas físicas. Mas é possível fazer uma outra leitura quando os dados são analisados com mais detalhe.
Nas eleições de 2014, a deputada federal Érika Kokay (PT-DF) recebeu R$ 823 mil de 132 doadores. Desses, 131 são pessoas físicas. O único doador que não se encaixa nessa categoria foi o PT, que contribuiu com o maior valor. O partido deu R$ 237 mil à parlamentar. Esses recursos tiveram como origem o fundo partidário e correspondem a cerca de 29% do total recebido por Érika.
Entre as pessoas físicas, o maior doador foi o ex-governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT-DF), que tentou se reeleger naquele ano e não conseguiu. Ele doou R$ 172 mil à parlamentar. A segunda maior doação, de R$ 37 mil, veio da própria Érika. Somando essas duas doações com as do PT, é possível concluir que o partido e pessoas ligadas à legenda foram os maiores doadores de sua campanha, com uma soma de R$ 446 mil (ou 54% do total).
“O mundo todo utiliza carvão mineral para 41% da geração elétrica; e o Brasil, menos de 2%. Então, nós temos espaço [para crescer].” – Afonso Hamm (PP-RS), deputado federal, durante evento em que foi reinstalada a Frente Parlamentar Mista em Defesa do Carvão Mineral, na terça-feira (25)
A frente parlamentar liderada pelo deputado Afonso Hamm vai na contramão dos últimos estudos sobre aquecimento global. Para tentar evitar um aumento da temperatura do planeta, muitos países têm buscado reduzir as emissões de carbono. A ideia é trocar combustíveis fósseis, como o carvão mineral, por fontes alternativas.
O último Relatório de Avaliação do Clima, elaborado pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), aponta um aumento nas emissões de gases do efeito estufa entre 2000 e 2010, ocasionado pelo crescimento do uso de carvão para geração de energia. O relatório constata que, caso as emissões de gases do efeito estufa continuem com a mesma intensidade, a temperatura no planeta pode aumentar até 4,8º Celsius até o fim do século.
Os reflexos da intensidade do aquecimento global podem ser observados com o derretimento das geleiras e aumento do nível do mar, além das secas mais prolongadas. A recomendação é de investimento em energias com pouco ou sem carbono – o que não é o caso do carvão.
De acordo com o Ministério de Minas e Energia (MME), o uso de carvão para geração de energia elétrica representou 39,2% da matriz elétrica no mundo todo, em 2014. No Brasil, o carvão mineral representa 2,4% da potência de geração elétrica instalada. A maior parte da potência energética é hidráulica (68%). Aqui, a participação de fontes renováveis de energia é próxima de 80%, enquanto a média mundial é de 20%, segundo o MME. Ainda assim, o uso do carvão mineral para geração de energia aumentou em 2013 e 2014 pela falta de chuvas e pelo aumento na capacidade instalada a carvão. Até 2012, a tendência era de queda na geração de energia por carvão mineral.
As maiores reservas de carvão mineral se encontram na Europa, Eurásia e América do Norte. A China é a maior produtora e consumidora de carvão no mundo, seguida pelos Estados Unidos, como aponta o Relatório Estatístico Global de Energia da BP, com dados referentes a 2014. Os dois países também são os principais responsáveis pela emissão de dióxido de carbono, emitido na queima do carvão mineral. Esse gás é um dos principais agravadores do efeito estufa e também do aumento do aquecimento global.
O Serviço Geológico do Brasil, empresa pública de pesquisa mineral, aponta que 89,25% das reservas de carvão mineral estão no Rio Grande do Sul, o mesmo estado do deputado Hamm. Em uma única jazida, a de Candiota (RS), pode-se encontrar 38% de todo o carvão nacional.
Entre os doadores da campanha que elegeram o parlamentar para seu atual mandato estão a Tractebel Energia, do grupo GDF Suez, que doou R$ 40 mil e opera diversas usinas hidrelétricas e três termelétricas; a Indústria Carbonífera Rio Deserto, que doou R$ 43 mil; e a Carbonífera Criciúma, que doou R$ 27 mil. No início de agosto, Hamm esteve em Candiota (RS) e visitou o escritório da Tractebel Energia, responsável pela implantação da Usina Termelétrica Pampa Sul no município.
Flashback da semana
O dia em que a caça tentou ser caçador
Chefe do Ministério Público Federal, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, esteve do outro lado do balcão por 10 horas e 25 minutos na quarta-feira (26). Acostumado a investigar, foi inquirido. Na segunda reunião mais longa da história da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Janot foi sabatinado por cerca de 30 senadores, dos quais pelo menos 12 são seus investigados no Supremo Tribunal Federal (STF). A reunião só não foi maior que a sabatina do ministro da suprema corte Edson Facchin, em maio, que durou 12 horas e 40 minutos.
Entre os inquisidores de Janot estava Fernando Collor (PTB-AL). Único senador já denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por suposto envolvimento com os esquemas de corrupção da Petrobras, o ex-presidente protagonizou os momentos de tensão da sabatina. De acusado a acusador, Collor repetiu a estratégia que usou contra Lula na campanha eleitoral de 1989. Na época, o então candidato a presidente manteve, em debate com Lula na TV Globo, uma pasta sobre a mesa com supostos documentos que incriminariam o petista. Nada bombástico saiu de lá. Mas a simulação de que poderia sacar uma arma fatal fez o petista suar.
Desta vez, o senador foi o primeiro a chegar à CCJ, sentou-se na primeira fila da sala, de frente para o lugar a ser ocupado por seu algoz, e colocou novamente pasta sobre a mesa. Novamente, mexeu nos papeis em tom ameaçador. Mas não conseguiu extrair de Janot nada mais do que indignação.
Frente a frente com Janot, o ex-presidente o questionou sobre contratações feitas pela PGR sem licitação e o acusou de proteger um irmão procurado pela Interpol. Janot se irritou com a tentativa do senador de interromper suas respostas. O procurador fechou a cara e colocou o dedo em riste: “Vossa Excelência não me interrompa”.
Após passar pelo crivo do colegiado, o procurador teve seu nome aprovado, em plenário, por 59 votos a 12. Terá novo mandato de dois anos à frente da PGR. Essa foi a segunda vez que a presidente Dilma Rousseff pôde se sentir vitoriosa na semana. Além de conseguir fazer sua indicação passar pela peneira do Senado, ela mais uma vez teve prazo estendido em processo que pode lhe render abertura de pedido de impeachment.
Também na quarta-feira, o Tribunal de Contas da União (TCU) concedeu mais 15 dias à presidente para esclarecer novos questionamentos sobre pedaladas fiscais e irregularidades nas contas de 2014.
‘Verdadeiro escândalo’
A semana não foi só de boas novas para a presidente. Ela reviveu a série “esqueçam o que eu disse”, atribuída por petistas ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Na terça-feira, Dilma admitiu que ela e seu governo demoraram a reconhecer a gravidade da crise econômica e deveriam ter adotado medidas para corrigir os rumos da economia ainda no ano passado, quando foi reeleita para mais quatro anos de mandato. Para reverter a situação em atraso, como ela mesmo classificou, Dilma morde a língua. Ela que, em período eleitoral, disse que redução de ministérios era um “verdadeiro escândalo”, agora diz que a medida é necessária para tornar “mais eficiente” o gasto público. No dia anterior, a equipe econômica do governo havia anunciado que prepara o corte de dez ministérios para setembro.
Ainda na segunda (24), o vice-presidente Michel Temer anunciou que estava abandonando o barco da articulação política, função que exercia desde abril deste ano. Mas ele não conseguiu pular fora de um dos barcos que divide com a presidente. A maioria dos ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) resolveu dar continuidade à ação de investigação eleitoral em que o PSDB pleiteia a cassação dos mandatos da petista e do vice. No entanto, o mérito das questões levantadas pelo partido tucano ainda não será analisado, já que a ministra Luciana Lossio pediu vista e, com isso, adiou o julgamento do processo.
Cota para mulheres
Desafeto de Dilma, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), também sofreu derrotas esta semana. O Senado aprovou a instituição de cotas para mulheres na política, contrariando a Câmara, que rejeitou proposta semelhante no primeiro semestre, em meio às discussões da reforma política.
O Plenário do Senado aprovou em primeiro turno a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 98/2015, que reserva um percentual mínimo de cadeiras nas representações legislativas em todos os níveis federativos. A proposta assegura a cada gênero percentual mínimo de representação nas três próximas legislaturas: 10% das cadeiras na primeira legislatura, 12% na segunda legislatura; e 16% na terceira.
Para amargar um pouco mais a primeira semana de Cunha depois da denúncia da PGR, um grupo de 35 deputados divulgou na quinta-feira (27) um manifesto pedindo a saída do peemedebista da presidência da Câmara, com o argumento central de que o parlamentar fluminense pode virar réu do STF nos próximos dias. Intitulado “Em defesa da representação popular”, o documento lembra que, segundo investigações da Operação Lava Jato endossadas pela PGR, Cunha recebeu US$ 5 milhões do esquema de corrupção instalado na Petrobras.
Trem da alegria
Na semana que passou os deputados aprovaram, por 333 votos a favor, 133 contra e 6 abstenções, a PEC dos Cartórios (471/05). A medida torna titulares os substitutos ou responsáveis por cartórios de notas ou de registro. Pelo fato de tornar titulares quase 5 mil responsáveis pelos cartórios, sem a necessidade de concurso público, a proposta foi apelidada por alguns parlamentares como “trem da alegria”.
Outro projeto polêmico aprovado diz respeito à cultura indígena. Por 361 votos a 84 e 9 abstenções, a Câmara aprovou projeto de lei que trata de medidas para combater práticas tradicionais de alguns povos indígenas, como o “infanticídio”.