Quando fui passar uma semana na Ocupação Bubas, em Foz do Iguaçu, muitos amigos só me perguntaram se eu tinha medo de roubarem meu equipamento.
Mas o que eu vi por ali é que a Ocupação Bubas é uma família surgida da indiferença com os pobres. E, como toda família, é marcada também por diversidade: uns moradores têm mais grana, outros têm mais vontade de se dar bem; um tem preguiça, outro tem mais predisposição para “tretar”, um terceiro tem mais azar, ou bebe demais. Assim é Bubas.
Foz do Iguaçu não é só a cidade das Cataratas do Iguaçu, ela é rodeada por Puerto Iguazú, na Argentina, e Ciudad del Este, no Paraguai. Na tríplice fronteira, é um leva e traz de produtos para abastecer comércios formais e informais do Brasil. Segundo relatos que ouvi por ali, nos últimos dez anos os agentes da Receita Federal intensificaram a fiscalização contra os muambeiros e, assim, muitos moradores se viram em declínio financeiro. Resultado: já não podem arcar com a cesta básica, aluguel, água e luz. Esse é o caso da quase totalidade dos moradores da Ocupação Bubas.
Desde 2013, cerca de 1.200 famílias começaram a ocupar uma antiga área de plantação de soja. Segundo análises feitas pela Universidade da Integração Latino-Americana (Unila), através de fotos de áreas da região, há anos o terreno não estava sendo usado.
A organização foi espontânea, cada um respeitando o lote do outro. Três lideranças emergiram e cuidam dessa grande família: Rose, Maria e Cumpadre. Eles mantêm a comunidade sob suas rédeas; poucos são os filhos revoltados que fogem do controle e quebram o padrão de comportamento local, fazendo que a tranquilidade seja a norma a ser seguida. Problemas? Tem. Mas em qualquer local com mais de dois indivíduos, em algum momento, haverá conflitos de interesses.
Em 2017, o juiz Rogério Vidal Cunha, titular da 2ª Vara da Fazenda Pública de Foz do Iguaçu, emitiu uma sentença indeferindo a liminar favorável à reintegração de posse e revogando a medida que determinava a saída das famílias. A regularização fundiária depende agora de arranjos políticos entre o estado e o proprietário, Francisco Buba Júnior, que afirma estar disposto a negociar.
Durante dois anos, Bubas cresceu sob o esquecimento da cidade. Em setembro de 2015, após uma chuva de granizo que danificou praticamente todas as moradias, uma onda de comoção elevou-os à atenção de grande parte da população, que levou doações e ajudou na reconstrução dos barracos. Em 2014, após uma proposta de remoção para uma área afastada da cidade, grupos ligados às Brigadas Populares e à Unila intervieram para explicar aos ocupantes o direito à cidade, a importância da memória afetiva e a autonomia. Hoje, uma voz praticamente uníssona ecoa na ocupação: “Não queremos nada de graça, queremos pagar”.
Não fui para Foz do Iguaçu pelas cataratas – escrevo em minúscula mesmo – fui pela Ocupação Bubas, sem nenhum medo de roubarem meu equipamento. Encontrei uma família.