Buscar
Nota

Flávio Bolsonaro nega causa da crise climática em votação de projeto sobre adaptação

14 de maio de 2024
19:40

Durante a votação de uma das propostas legislativas consideradas cruciais por ambientalistas e especialistas para evitar novas tragédias como a que atinge o Rio Grande do Sul, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) negou que o episódio tenha relação com as emissões de carbono na atmosfera. Há um amplo consenso científico de que essas emissões, produzidas principalmente pela queima de combustíveis fósseis como petróleo, gás e carvão, são as responsáveis pela alteração dos padrões climáticos globais e o aumento da frequência e intensidade de eventos extremos, a exemplo das chuvas que arrasam o estado gaúcho.

Flávio Bolsonaro abriu a discussão do Projeto de Lei (PL) 4.129/21 no plenário do Senado nesta terça-feira, 14 de maio. A matéria busca estabelecer diretrizes para os planos de adaptação municipais e estaduais aos impactos das mudanças do clima. O PL é apontado pela Frente Parlamentar Ambientalista como uma das cinco matérias prioritárias, em trâmite no Legislativo, para “construir e reforçar as bases legais e constitucionais de adaptação e resiliência do clima no país”.

Os planos de adaptação são fundamentais, segundo especialistas, para que cidades e estados diminuam a vulnerabilidade de suas populações e infraestruturas aos efeitos de tempestades ou secas extremas, por exemplo. A ideia é evitar sobretudo mortes, como as 147 já registradas no Rio Grande do Sul desde o início das chuvas, e o comprometimento de equipamentos fundamentais à vida das pessoas, como rede de esgoto, energia elétrica, estradas, escolas e hospitais, entre outros.

“Eu pergunto: o que está acontecendo no Rio Grande do Sul tem relação com emissão de carbono na atmosfera ou tem relação com o zoneamento urbano de todas as cidades impactadas? Tem a ver com queima de petróleo ou tem a ver com questões geográficas, a realidade regional daquelas várias cidades que estão em uma área suscetível a alagamento?”, questionou Flávio Bolsonaro na tribuna.

“Se aconteceu algo similar, óbvio que não nas mesmas proporções do que está acontecendo neste momento, em 1941 [quando se deram as enchentes que, até o início do mês, haviam sido as maiores já registradas no RS], no estado do Rio Grande do Sul, é de se concluir, de uma forma lógica, que não é pelas circunstâncias globais”, prosseguiu. “Será que o que está acontecendo agora é porque emitimos mais carbono na atmosfera do que emitia-se em 1941? Não. A realidade é que cidades foram construídas, [gerando] mais asfalto, mais cimento, prédios, menos áreas de absorção de água nessa área que já é propícia a alagamentos. É o crescimento urbano desordenado.”

O pano de fundo das falas de Flávio Bolsonaro não é a negação de que as mudanças climáticas existam, mas de que estejam relacionadas à ação humana por meio da emissão de gases de efeito estufa, decorrentes sobretudo da queima de combustíveis fósseis. Essa é uma estratégia comum entre negacionistas do clima. Reportagem da Agência Pública mostrou que a Brasil Paralelo, que produz conteúdos com esse argumento, tem um representante na vice-prefeitura de Porto Alegre.

O senador tentou sugerir duas emendas ao projeto de lei, o que não foi possível porque o prazo de apresentação de propostas de mudança no texto se encerrou em 8 de março, conforme explicou o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que presidia a sessão.

Havia a expectativa, entre ambientalistas, de que o PL fosse aprovado pelo Senado ainda hoje e seguisse para apreciação final na Câmara, onde foi apresentado pela deputada Tabata Amaral (PSB-SP) em novembro de 2021. Mas Flávio Bolsonaro insistiu para que, previamente, o texto passasse pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado. Antes de ir a plenário, o PL foi discutido e teve um substitutivo aprovado na Comissão de Meio Ambiente da Casa, sob relatoria do senador Alessandro Vieira (MDB-SE).

De última hora, um acordo foi construído entre os líderes do governo, Jaques Wagner (PT-BA), e da oposição, Rogério Marinho (PL-RN), no Senado para que a matéria seja debatida no dia 15 de maio na CCJ, como primeiro item da pauta, sem que haja pedido de vista por senadores oposicionistas. Em seguida, a proposta deve retornar ao plenário do Senado para, finalmente, ser submetida a votação.

O coro negacionista de Flávio Bolsonaro foi engrossado por senadores bolsonaristas como o Astronauta Marcos Pontes (PL-SP) e Jaime Bagattoli (PL-RO). Os três são integrantes da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), a chamada bancada ruralista. A Pública identificou que parlamentares alinhados ao grupo ajudam a reproduzir discursos negacionistas sobre a crise climática, impulsionados sobretudo por associações de produtores rurais.

Senadores da frente ambientalista e de partidos de esquerda questionaram as falas negacionistas de Flávio Bolsonaro durante a sessão. “Não podemos mais achar que não devemos debater questões reais, que estão tirando a vida de muitos brasileiros, porque negamos, nesta Casa, a tratar com responsabilidade as questões relacionadas às mudanças climáticas”, afirmou Leila Barros (PDT-DF), presidente da Comissão de Meio Ambiente do Senado.

Já Fabiano Contarato (PT-ES) destacou que a aprovação do projeto tem “total conexão e nexo causal” com a catástrofe enfrentada no Rio Grande do Sul.

Edição:

Não é todo mundo que chega até aqui não! Você faz parte do grupo mais fiel da Pública, que costuma vir com a gente até a última palavra do texto. Mas sabia que menos de 1% de nossos leitores apoiam nosso trabalho financeiramente? Estes são Aliados da Pública, que são muito bem recompensados pela ajuda que eles dão. São descontos em livros, streaming de graça, participação nas nossas newsletters e contato direto com a redação em troca de um apoio que custa menos de R$ 1 por dia.

Clica aqui pra saber mais!

Se você chegou até aqui é porque realmente valoriza nosso jornalismo. Conheça e apoie o Programa dos Aliados, onde se reúnem os leitores mais fiéis da Pública, fundamentais para a gente continuar existindo e fazendo o jornalismo valente que você conhece. Se preferir, envie um pix de qualquer valor para contato@apublica.org.

Notas mais recentes

Brasil Paralelo gastou R$ 300 mil em anúncios contra Maria da Penha


Kids pretos, 8/1 e mais: MPM não está investigando crimes militares em tentativas de golpe


Investigação interna da PM do Maranhão sobre falsos taxistas estaria parada desde julho


Semana tem reta final do ano no Congresso, Lula de volta a Brasília e orçamento 2025


Ministra defende regulação das redes após aumento de vídeos na “machosfera” do YouTube


Faça parte

Saiba de tudo que investigamos

Fique por dentro

Receba conteúdos exclusivos da Pública de graça no seu email.

Artigos mais recentes