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Ex-chanceler teria afirmado ainda que Itamaraty queria programa nuclear para o Brasil

Reportagem
30 de junho de 2011
13:00
Este artigo tem mais de 13 ano

Durante uma reunião realizada no início de 2008, em sua residência, o ex-ministro brasileiro das Relações Exteriores Luiz Felipe Palmeira Lampreia teve com o embaixador Clifford Sobel uma conversa informal sobre o governo Lula, as perspectivas para o próximo presidente brasileiro, além de questões bilaterais e regionais. É o que revela um documento diplomático enviado ao departamento de Estado americano em 16 de janeiro de 2008 pelo consulado do Rio de Janeiro.

A reunião veio na esteira de um artigo publicado por Lampreia na revista American Interest, na qual analisava a relação EUA-Brasil, o que forneceu o contexto para a reunião. Lampreia foi o chanceler brasileiro entre 1995 e 2001, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso.

Àquela altura, o diplomata se mostrava otimista com as chances de José Serra na corrida presidencial que só aconteceria mais de dois anos depois (pesquisa CNT/Sensus de 18 de fevereiro daquele ano mostrava o governador de São Paulo com 38,2% das intenções de voto, contra 4,5% de Dilma Rousseff ).

Ele especulava que Sergio Amaral, ex-ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior do governo FHC, seria o próximo ministro do Exterior em um eventual governo tucano.

Em relação ao governo Lula, ele disse considerar o presidente um “pragmático conservador”, sugerindo que sua política externa se contrapunha à ortodoxia de suas políticas econômicas. Isso, segundo o diplomata, tornava possível que Lula tivesse amigos de espectros distintos, se relacionando tanto com o então presidente Bush como com o mandatário venezuelano Hugo Chávez.

Mas o alvo principal de Lampreia na conversa foi o então ministro das Relações Exteriores do governo Lula, Celso Amorim. Ele afirmou que o assessor presidencial Marco Aurélio Garcia era grande amigo pessoal de Lula, observando que deveria ser “humilhante” para o chanceler Celso Amorim não se envolver em situações como a negociação para a libertação de reféns das Farc – assunto que teria sido discutido pelo presidente diretamente com Garcia.

Em seguida, perguntado se um acordo comercial em Doha poderia ter sido alcançado caso Amorim não estivesse atuando em nível político e comercial simultaneamente, Lampreia respondeu que o ministro era “um homem de esquerda”, o que implicaria no fato de que o chanceler não poderia estar interessado em um acordo desse tipo, “por razões ideológicas”.

O ex-ministro do exterior disse ainda a Sobel que Amorim “odiava americanos”, ressalvando que “não necessariamente de modo pessoal, mas por razões ideológicas”.

Lampreia sugeria ainda que o Ministério das Relações Exteriores estaria interessado em  um programa nuclear para o Brasil, mas negou que isso tivesse a ver com o acordo nuclear firmado entre EUA e Índia, em 2008.

O ex-ministro avaliava que a execução de um programa nuclear seria um “crime contra o povo brasileiro, dados os custos de tal programa e outras necessidades prementes, como saúde, educação e habitação”. Segundo ele, como não havia necessidade de um elemento de dissuasão contra outros países da região, um programa desse tipo só poderia ser interpretado como uma defesa potencial contra os Estados Unidos.

Quando questionado sobre como melhorar as relações entre os dois países, Lampreia sugeriu que os Estados Unidos devessem ajudar a elevar a reputação do Brasil no mundo, mas, “discretamente”, para não levantar suposições de que os Estados Unidos estariam estabelecendo o Brasil como uma espécie de “substituto” no continente.

Os documentos são parte de 2.500 relatórios diplomáticos referentes ao Brasil ainda inéditos, que foram analisados por 15 jornalistas independentes e estão sendo publicados nesta semana pela Agência Pública.

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