Em telegrama do dia 27 de janeiro o cônsul-geral americano em São Paulo, Thomas White, comenta sobre um jantar organizado pela revista Raça para celebrar a posse de Obama.
Neste encontro havia lideranças afrodescendentes brasileiras que incluiam celebridades como a atriz e apresentadora Adriana Lessa e o terceiro vereador mais votado de 2008 em São Paulo, Netinho de Paula. O consul elogia o fato de algumas pessoas comuns estarem participando, como um motorista de ônibus e duas avós.
White tece elogios a Netinho, para ele o vereador tem evidente habilidade de falar em público e possivelmente um futuro promissor na política. Já sobre o editor da Raça, Maurício Pestana, White descreve uma aparente saia justa. Pestana advertiu um consultor político do consulado sobre a Universidade Zumbi dos Palmares que teria uma liderança muito fechada. O consul faz um adendo no telegrama explicando que já se relaciona muito bem com a universidade. Segundo ele, a Zumbi dos Palmares abrigou algumas pessoas ligadas ao Plano de Ação Conjunta Brasil-EUA contra o Racismo em setembro de 2008 e reafirma que nunca teve nenhum problema com a universidade.
“Um motorista de ônibus disse que vai demorar muito tempo para os afro-brasileiros elegerem um deles como presidente porque ‘os negros não apoiam uns aos outros’. Já a Senhora Conceição explicou que mesmo quando se vota em afro-brasileiros, eles não sustentam sua parte no acordo” descreve no telegrama obtido pelo Wikileaks. Os dois exemplos usados são do ex-prefeito Celso Pitta e da atual deputada federal Benedita da Silva.
Em outro telegrama de 22 de maio, o consul se mostra positivamente surpreso pela longevidade da campanha de divulgação de Obama. Uma apresentação de PowerPoint contendo um pouco de sua biografia tem sido material usado em palestras em escolas, centros comunitários, universidades e etc. Ainda comenta que intelectuais, que tendem a ser críticos aos Estados Unidos, são atraídos pela biografia de Obama. Segundo dados do telegrama essa apresentação teria sido feita para mais de 4 mil pessoas em onze apresentações públicas pelo Brasil.
“Presidente Obama é popular em muitos países, mas a reação brasileira tem sido particularmente forte nesta sociedade multi-racial” descreve. Ainda comenta que nas eleições municipais de 2008, 4 candidatos mudaram seus nomes para Obama. White diz que os afrodescendentes brasileiros sentem um misto de inveja e admiração pelo presidente americano e que sua eleição causou um alvoroço na consciência coletiva deste grupo no país. “Brasil se orgulha de ser uma democracia racial, mas na realidade os afro-brasileiros continuam marginalizados e sub-representados nos altos escalões da política e da sociedade” diz o telegrama.
O consul alerta para o fato que mesmo tecendo elogios ao novo presidente, eles (americanos) tem recebido mais perguntas sobre a crise financeira. “Normalmente essas perguntas giram em torno da ideia de que os Estados Unidos estão sendo hipócritas em suas políticas e fazendo coisas (como aumentar o dinheiro em circulação e investindo dinheiro público em bancos e montadoras) que já criticaram em relação a outros países.
No final do telegrama White mostra preocupação que em breve o sucesso do presidente não seja o suficiente para a boa imagem dos Estados Unidos e diz que o desafio é atrelar esse sucesso a própria experiência americana.
Comunidade Muçulmana no Brasil
O chefe de Economia e Política do Consulado dos EUA em São Paulo, William Popp, escreve dois telegramas no dia 16 de julho descrevendo e comentando a reação da comunidade muçulmana no Brasil e da imprensa em relação ao discurso que Obama proferiu no Cairo sobre o Islã.
No dia 4 de junho, Obama disse no Egito que os Estados Unidos não está e nunca estará em guerra com o Islã. Reafirma que estão sim combatendo extremistas violentos que trazem perigo para o povo americano. O primeiro telegrama trata da reação dos muçulmanos sunitas moderados que vivem no Brasil e que “estão ansiosos para trabalhar com os Estados Unidos”. Também diz que especialistas em política externa não-muçulmanos reagiram favoravelmente ao discurso.
“São Paulo abriga a maior comunidade muçulmana do Brasil. A grande maioria são sunitas de ascendência libanesa. Politicamente, eles variam de amigáveis aos EUA para aqueles altamente crítico de ambos, os EUA e Israel. Geralmente o Sheik mais interessado em encontro com nós (americanos) têm menos influência na comunidade muçulmana” descreve Popp que consultou vários Sheiks em São Paulo para a elaboração do documento.
Alguns Sheiks moderados tinham essa opinião “indicou que o discurso do Presidente tinha-lhes dado mais espaço para cooperar com os Estados Unidos. O louvor veio com avisos, no entanto. Sheik Saleh advertiu que os EUA tinham que acompanhar com ações os comentários do presidente. Haverá sempre os radicais que são impossíveis de conquistar, advertiu, e eles vão tomar a iniciativa, se não houver resultados”.
O Sheik Ali Saifi, chefe do Centro de Divulgação do Islam para a América Latina, questionou a descrição de Obama sobre a aliança EUA-Israel como “inquebráveis” e afirmou que o presidente tinha omitido pontos-chave, como “o sofrimento dos palestinos, do massacre de inocentes, o uso por Israel munições americanas proibidas, e novos assentamentos de Israel. Saifi também criticou o presidente Barack Obama por não pedir desculpas por “massacre de inocentes no Iraque, Afeganistão e Paquistão”
Sobre a imprensa, Popp comenta sobre um artigo de Demétrio Magnoli no Estado de S. Paulo onde ele elogiou Obama dizendo que o discurso maquineísta foi abandonado. E que também a fala de Obama traria de volta a credibilidade para os Estados Unidos.
No segundo telegrama, Popp fala de possíveis atitudes e ações que os diplomatas americanos podem ter com a comunidade muçulmana no Brasil para melhorar as relações. Um delas é fazer um “Open House” no Consulado para mostrar como é o processo de candidatura para obtenção de visto, um dos problemas seria que a negação de um visto é entendido como um problema político.
Popp também sugeriu um painel de “Espiritualidade Americana” ou “Diversidade Fé dos EUA” que falaria sobre a grande variedade de religiões representadas nos EUA e seu impacto no desenvolvimento do país. O envio também de algumas lideranças muçulmanas que visitariam os EUA para encontrar tanto muçulmanos e não-muçulmanos e na volta realizassem palestras sobre o assunto.