Buscar

Em 2009, consulado americano em São Paulo previu alta na inflação e “saturação” do mercado de crédito

Reportagem
3 de agosto de 2011
12:22
Este artigo tem mais de 12 ano

Dentre os cerca de 3 mil documentos referentes ao Brasil publicados pelo WikiLeaks ainda há muitos que são importantes para compreender a visão americana sobre eventos que aconteceram no país.

É o caso de um documento enviado pelo consulado de São Paulo em 15 de setembro de 2009 ao Departamento de Estado, sob o título “Brasil: aumento da influência dos bancos públicos traz riscos para o setor financeiro”.

O telegrama consiste em uma análise do crescimento da oferta de crédito pelos bancos públicos nos primeiros anos de crise econômica mundial – servindo, segundo a visão americana, como “quase um último recurso” para os setores mais afetados da economia.

Para o adido do tesouro dos EUA, o aumento “é resultado de pressão significativa do presidente Lula”, enquanto “o governo brasileiro também instruiu os bancos públicos a reduzir as taxas de empréstimo”.

Ouvindo fontes dos bancos privados – que não são nomeados no documento – a missão americana avalia que há muitas “vantagens de mercado” para os bancos públicos, tornando a competição desigual.

“Banqueiros disseram ao adido da embaixada do Tesouro americano que eles simplesmente não conseguem competir em empréstimos de longo prazo”.

Os motivos enumerados nos documentos são: os fundos provenientes do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), destinados aos bancos públicos, seriam de baixo custo; o acesso a financiamentos adicionais do Ministério da Economia; e a possibilidade de fazer empréstimos de mais alto risco com menos garantias.

“Com a recuperação da economia, o crescimento contínuo de crédito dos bancos públicos poderia gerar problemas inflacionários de curto prazo, à medida que o crédito privado deve aumentar”.

O pior cenário previsto pelo consulado é de 6,5% de inflação em 2010 – na verdade, chegou a 5.91%, a maior em seis anos.

De olho nas mudanças de direção

A missão americana também manteve Washington bem informado sobre mudanças nas lideranças de instituições-chave para a economia brasileira.

A expectativa da saída do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, foi citada no documento, assim como de dois “respeitados” integrantes do COPOM (Comitê de Política Monetária), Mário Mesquita e Mário Toros. A informação teria vindo de uma fonte de um grande banco privado.

“O aumento consistente nos empréstimos de bancos públicos no longo prazo poderia expulsar os emprestadores privados e se tornar um empecilho estrutural para a competição entre os bancos no futuro. Enquanto os bancos privados são expulsos do mercado de empréstimos, os subsídios e as garantias recebidas pelos bancos públicos podem aumentar as distorções e impor um alto custo à eficiência do sistema financeiro brasileiro e aos clientes do setor privado”.

No futuro, saturação

O relato diplomático termina com uma nota de preocupação – e ceticismo.  “Muitos brasileiros, incluindo o presidente Lula, acreditam que o estável – embora ineficiente –sistema bancário (nacional) foi responsável por ajudar o Brasil a suportar a crise global”.

“O presidente Lula chegou a sugerir que uma fraqueza do sistema financeiro americano é a ausência de grandes bancos públicos”.

Segundo o documento essa “popularidade” tornaria uma reforma dos bancos públicos “politicamente difícil”.

No entanto, diz o texto, o aumento dos empréstimos levaria à uma “saturação do mercado nos próximos anos”. “A essa altura, restringir os bancos públicos pode ser ainda mais difícil”.

Todos os documentos da embaixada americana e consulados no Brasil foram publicados pelo WikiLeaks no dia 11 de julho, estando à disposição de pesquisadores, jornalistas e internautas no site www.wikileaks.org.

Não é todo mundo que chega até aqui não! Você faz parte do grupo mais fiel da Pública, que costuma vir com a gente até a última palavra do texto. Mas sabia que menos de 1% de nossos leitores apoiam nosso trabalho financeiramente? Estes são Aliados da Pública, que são muito bem recompensados pela ajuda que eles dão. São descontos em livros, streaming de graça, participação nas nossas newsletters e contato direto com a redação em troca de um apoio que custa menos de R$ 1 por dia.

Clica aqui pra saber mais!

Quer entender melhor? A Pública te ajuda.

Faça parte

Saiba de tudo que investigamos

Fique por dentro

Receba conteúdos exclusivos da Pública de graça no seu email.

Artigos mais recentes