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Descobrir o que há por trás da contagem de cadáveres em Honduras, o país mais violento do mundo, é como descascar uma cebola. A taxa de violência fatal é 8x maior que a média mundial e 4x a média da América Latina

Reportagem
4 de julho de 2012
09:01
Este artigo tem mais de 12 ano

Por Julie Lopez

É madrugada de março e uma fila de passageiros anda lentamente até o ônibus na capital da Guatemala. Um segurança revista seus pertences vasculhando profundamente e passando um detector de metais. De repente, todos os passageiros dão um passo pra trás, perplexos com um flash: o segurança também os fotografa. Desta vez, é um grupo de hondurenhos que voltam para casa, turistas americanos e alguns guatemaltecas que viajam a trabalho.

O ônibus irá parar em Copan e San Pedro Sula antes de chegar a Tegucigalpa, capital de Honduras. Uma caminhonete com dois seguranças armados seguirá até Copan. Depois, escoltará outro ônibus de volta para a Cidade de Guatemala. Na fronteira, em El Florido, vans em fila dupla ladeadas por colinas verdes escondem o aviso “Bem vindo a Honduras”. Um operador de câmbio com 20 anos no ramo diz que a travessia é segura porque ela é cercada. “Em Coríntia (noroeste de Honduras) está pior”, diz franzindo a testa e apertando os olhos, soletrando em seguida o nome das gangues que assolam o local, “Las maras”.

Uma patrulha da Polícia Nacional Civil continua estacionada diante do escritório de imigração do lado da Guatemala. Um policial fala ao celular. O outro lê seu caderno. A fachada da imigração de Honduras está deserta. Mas no banco ao lado, há dois guardas de segurança privada. Eles seguram suas escopetas com firmeza e um deles veste colete à prova de balas.

Um dos seguranças que escolta o ônibus espera, com rádio na mão, os passageiros subirem depois da vistoria da imigração. Ele garante que já ocorreram assaltos na estrada, mas “apenas do lado de Guatemala”, diz ele. “Do lado de Honduras, nada.”

Entre os passageiros está um jovem hondurenho de 24 anos que administra uma academia de karatê em Comayagua, nos arredores de Tegucigalpa. Na viagem, vai lendo a seção de esportes, passando longe das páginas policiais. Segundo ele, Honduras é a mesma de sempre apesar do governo do presidente Porfírio Lobo.

Durante esse tempo, o país atingiu o maior número de mortes violentas no mundo (86 por 100 mil habitantes, uma taxa oito vezes maior que a média mundial e quatro vezes a da América Latina). “O problema aqui é que os políticos ajudam demais a si mesmos” diz, esclarecendo que a corrupção desvia recursos que seriam para prevenção da violência.

Na jornada de 14 horas entre Cidade de Guatemala e Tegucigalpa, os outros passageiros também parecem inabaláveis apesar de viajarem para o coração da violência da América Central, ou do planeta. Muitos dizem estar acostumados a lidar com a violência, sobrevivendo por meio de regras não escritas que todos já conhecem.

Capital com cicatrizes

Alguns muros de Tegucigalpa, a capital hondurenha, ainda revelam as cicatrizes do evento descrito por analistas políticos como um divisor de águas na história do país: o golpe de estado de 28 de junho de 2009, que retirou Manuel “Mel” Zelaya da Presidência, deixando como herança o governo interino de Roberto Micheletti, meses de incertezas, relações diplomáticas fragilizadas e uma onda de violência política, aguçando a violência que já prevalecia por causa da delinquência e do crime organizado.

Três anos atrás haviam mensagens pichadas por toda parte. Agora, é necessário circular por várias ruas e procurar a pintura desgastada que desenhou posições contrárias. Ainda é possível ler mensagens como “Mel ladrão” ou “Fora golpistas”.
Mas a lembrança dos fatos que engendraram estas frases ainda está fresca.

Um ex-chefe de polícia diz que era de conhecimento popular que um filho de Zelaya usava o avião presidencial para assistir shows na República Dominicana. Esta é uma história que também relata um ex-líder do sindicato dos professores. Segundo ele – que não quis se identificar – o dinheiro começou a fluir depois das eleições, inclusive antes de iniciar o governo. Já um ex-dirigente sindical, que se reunia com Zelaya na sua própria casa – e também não quis se identificar – diz que o ex-presidente é vitima de uma campanha de desprestígio. Ele acredita que retiraram Zelaya do país porque ele tentou “tocar” nos poderosos: os distribuidores de combustível, os grandes latifundiários (mesmo que Zelaya fosse um deles) e o empresariado. “Seu grande pecado foi querer ajudar as pessoas mais pobres desse país, que sobrevivem com menos de um dólar ao dia”, diz.

“Mel queria perguntar aos hondurenhos se queriam reformar a Constituição, por meio de um plebiscito para promover as mudanças sociais em longo prazo”, explica. Os críticos de Zelaya afirmam que o ex-mandatário queria modificar a carta magna para reeleger-se e continuar no poder, e os organismos judicial e legislativos interviram para detê-lo. Este debate ainda prevalece, ainda que já haja um caminho percorrido para a reconciliação política – ou, como dizem os analistas críticos, o retorno à democracia plural.

Eleições em novembro

Não se percebe esta polarização logo de cara. Mas o registro, em meados de março passado, do novo partido político de Zelaya, Liberdade e Reformulação, reacendeu a lenha, ainda que segundo pesquisas o Partido Nacional (PN), de direita, e o Partido Liberal (PL), de esquerda, ainda concentrem a preferência do eleitorado em quase 70%, entre os sete partidos inscritos para as eleições primárias de novembro.

Zelaya ganhou as eleições em 2005 pelo PL. Nas eleições de novembro de 2009, o presidente Lobo foi eleito pelo PN. “Na última eleição acreditou-se que um governo forte nos colocaria à frente com mais facilidade, mas as pessoas estavam enganadas”, diz Ramón Custodio, diretor da Comissão Nacional de Direitos Humanos de Honduras, referindo-se ao governo de Lobo.

Nos muros da cidade, as pichações não são a única coisa desgastada. Também estão desgastados os cartazes publicitários que anunciavam o presidente Lobo e suas promessas de segurança e emprego. Com um ano e oito meses para governar, ele admite que está de mãos atadas.

“Eu lhes garanto que ninguém está vacinado; ninguém sabe quando a violência vai tocar a sua porta”, disse em meados de abril. Lobo parecia derrotado. Dizia: “Hoje pela tarde iniciarei uma cruzada pela vida, por comunidades mais seguras”, mas logo advertia: “Não podemos prevenir em um ou dois governos. A luta começa desde o lar, da família, da escola; os governos são transitórios, (mas) o povo segue”.

Porém, a população hondurenha está ferida. Durante a gestão de Lobo, foram mortas violentamente 19 pessoas por dia, em média. Estimativas do Banco Mundial indicam que poucos hondurenhos não sofreram algum tipo de violência. Segundo Giusseppe Zampaglioni, representante do Banco Mundial, cada vítima dos 7.104 homicídios ocorridos em Honduras em 2011 (2.024 só no departamento de Córtes) pertencia a uma família de pelo menos cinco membros. De forma que ao menos 35.500 hondurenhos sofreram o impacto psicológico e econômico dessas mortes no ano passado. Entre as vítimas fatais, 47% tinham entre 15 e 29 anos de idade. Outros 31% tinham entre 30 e 44 anos. Cerca de 20% eram de mulheres.

Lobo foi o principal adversário de Zelaya em 2005, quando sua principal promessa era a segurança. A taxa de mortes violentas era de 37 por cada 100 mil habitantes, mas subiu em 2009 (para 66.8), e alcançou 86 dois anos depois, com Lobo.

A influência militar na polícia

Alguns informes, como um publicado pelo centro acadêmico Woodrow Wilson Center em Washington em 2011, explica que o golpe contribuiu para o aumento na crise de segurança.

O documento indica que o país já sofria problemas de corrupção e crime, mas que o foco das forças de segurança em enfrentar a crise, a violência política e a redução de ajuda estrangeira (resultado do embargo econômico) precipitaram o país para o abismo.

Para o comissário Custodio, essa perspectiva é “preconceituosa”. “Lá fora acredita-se que Honduras nasceu em 28 de junho de 2009 (dia do golpe) mas as desordens já existiam desde antes”, disse ele, que dirige a Comissão Nacional de Direitos Humanos de Honduras desde 2002.

T., um jornalista que pediu para não ser identificado, explica que existem grupos poderosos monopolizando o Estado e que os eventos de 2009 tiveram como precedente, quase 30 anos de transição democrática falha e impune.

A ditadura militar terminou em 1980 sem processos de paz ou de pedidos por democracia. Em 1982, houve uma reforma constitucional. Mas os militares seguiram atrás do poder civil, encarregados de áreas específicas, como a de segurança pública. “Os postos chaves na polícia estavam no comando dos militares”, disse o jornalista. Na verdade, eles ainda estavam sob o controle militar em 2012.

Na década de 90, gangues e o crime organizado usavam as armas provenientes do arsenal remanescente do conflito armado da América Central, mais especificamente da Nicarágua. “Naquela época, um AK-47 (fuzil de assalto, de fabricação russa) eram vendidos por até vinte dólares”, lembra T. “Era comum que todos os dias, encontrar cápsulas para esse tipo de arma nas cenas de crime.”

Em 1994 começou a funcionar o Ministério Público (MP) e uma nova polícia de investigação, que era exclusiva do MP, a Direção Geral de Investigação Criminal (DGIC). As reformas constitucionais e a Lei Orgânica da Polícia, logo em seguida, separaram a polícia das forças armadas em 1996.

Segundo T., ao final dos anos 90 a polícia era “um cartel muito poderoso”. “Os oficiais tinham cotas que preenchiam com o produto de atividades ilegais, principalmente de extorsões, sequestros e assassinatos nas áreas do narcotráfico”, diz ele. “Ainda haviam afinidades ideológicas porque vários oficiais militares de alta classe tinham hierarquia no polícia, e a mentalidade de combate, de guerra contra o inimigo”, afirma T. “A polícia reprimia, e isso ficou claro no golpe (de Estado)”.

O ex- dirigente sindical assegura que ao menos 150 pessoas foram assassinadas enquanto duraram os tumultos, e que a violência política não vinha dos partidários de Zelaya, mas sim do “governo de fato” de Micheletti. Estas mortes não foram esclarecidas.

A Comissão da Verdade e a Reconciliação, que investigou os fatos anteriores e posteriores ao golpe, constatou e recebeu testemunhos sobre o uso desproporcional da força por parte das instituições militares e policiais durante o golpe de Estado e o governo de fato. “O que teve como resultado violações dos direitos humanos expressadas em mortes violentas, privações de liberdade, tortura, estupros e perseguições política”, diz o relatório final.

Ciclo vicioso: corrupção e impunidade

Apesar das muitas mudanças (sem depurações), a polícia seguia devorada pela corrupção e altamente influenciada pelos militares. Postos-chaves na polícia são ocupados por coronéis.

“As investigações não tiveram apoio, e o sistema de justiça processava casos em que 90% das sentenças eram emitidas a favor do acusado”, disse o jornalista. “Isso aumentou a tendência à impunidade e os cidadãos perceberam que não podiam contar com a polícia.” Como resultado, as investigações eram fracas em evidências científica e testemunhal. Havia desconfiança em relação ao programa de proteção a testemunhas. Simplesmente não havia testemunhas dos atos criminais, mesmo que 20 pessoas tivessem presenciado.

Ramón Custodio denunciou que há casos de desaparecimentos forçados e de execução extrajudicial comprovadamente realizados pela polícia. “Isso é grave. A impunidade estimula a continuidade do abuso, e começa quando existe um sistema de justiça que não investiga os crimes adequadamente”. Segundo ele, “os policiais dizem que são os juízes e promotores, e vice-versa, e isso é um jogo de pingue-pongue”.

Em 2006 se estimava que do total de denuncias apresentadas, 78% eram investigadas e apenas 2% terminavam em condenação. Um estudo do Banco Mundial de 2011 sugere que a falta de denúncia – devido à desconfiança em relação ao sistema – contribui para estas porcentagens.

Um caso paradigmático – ainda impune – foi a execução extrajudicial, em 22 de outubro de 2011 de Raul Vargas Castellanos, 22 anos, filho de Julieta Castellanos, reitora da Universidade Nacional Autônoma de Honduras e estandarte da oposição ao Golpe. Relatórios da imprensa indicam que Vargas foi fatalmente ferido em um posto policial. A polícia disparou e a vítima bateu seu veículo poucos metros adiante. Ele estava acompanhado por seu amigo Carlos Pineda Rodriguez, 24 anos, que sobreviveu à colisão, mas foi executado no local. Os policiais abandonaram os corpos em uma estrada localizada a vários quilômetros de distância do local do disparo.

A investigação do caso, perante forte pressão, permitiu a identificação de um subinspetor e três agentes como autores. Foi encontrado sangue em três patrulhas, e DNA de Vargas em uma delas. Alguns dos acusados e seus cúmplices, porém, escaparam da prisão e não foram recapturados. Tampouco foram os policiais que permitiram a fuga.

Seis semanas depois, em 7 de dezembro, Gustavo Alfredo Landaverde Hernandez, assessor da Secretária de Segurança, morreu alvejado a balas 48 horas depois que admitiu na frente das câmeras de televisão que possuía os nomes de altos chefes de polícia envolvidos em corrupção. Ninguém foi preso pelo assassinato.

Em 11 de março, um jornal de notícias do Canal 10 publicou os resultados de uma pesquisa que revelou que 88,8% dos hondurenhos acreditam que o governo falhou na segurança. Segundo a comissão de direitos humanos, a polícia é a instituição estatal que mais abusa dos direitos humanos em Honduras. Os casos ocorrem em todo o país, e não só nas áreas onde há mais atividades de gangues ou narcotraficantes.

Pedindo o impossível

Se a população estimada é de 8,2 milhões de habitantes em Honduras, e a força policial é de 14 mil elementos, há uma média de 585 habitantes por policial. O ideal, de acordo com as normas internacionais de segurança, é de um policial para cada 250 a 300 habitantes.

O pequeno número de policiais é somente uma das batalhas travadas dentro e fora da instituição policial, segundo Carlos Aguilera Cadenas, vice-chefe do departamento de Atlántida, com sede no povoado litorâneo de La Ceiba, em frente às ilhas de Roatan e Utila. Aguilera reconhece que há corrupção interna, mas também argumenta que alguns líderes de governos municipais consideram erroneamente que a segurança é somente um problema da polícia.

“Os elevados níveis de desemprego geram instabilidade social, e devido à imigração aos Estados Unidos há uma série de lares desfeitos onde os meninos são presas fáceis para as gangues ou quadrilhas”, afirma o sub chefe de polícia.

Honduras é, juntamente a seu vizinho Nicarágua, um dos dois países mais pobres do continente, com os níveis de pobreza acima de 70% .

As condições de trabalho, diz o policial, não são as melhores. Os turnos policiais, por exemplo, duram 36 horas. Quando terminam o turno de 36 horas, devem apresentar-se novamente no dia seguinte às sete horas da manhã. “Nos fins de semana, a jornada é duplicada, porque [os policiais de plantão] entram na sexta-feira, às sete horas da manhã e saem na segunda-feira às quatro da tarde”, acrescenta. Mesmo sob estas condições, os policiais ganham apenas um salário mínimo. “(O policial) vem do interior, de onde tem que viajar a cada 15 dias e pagar por sua própria comida, habitação, muitas vezes até sua própria munição, mesmo em La Ceiba. Ao final desse salário não lhe resta muito. Então, é por isso que a corrupção ocorre”.

Dentre os hondurenhos, 86,8% acham que a corrupção aumentou nos últimos dez anos, de acordo com uma pesquisa do Conselho Nacional Anticorrupção.

Para piorar, os planos do ministro da Defesa,o ex-policial Marlon Pascua, para reformar a polícia não começaram com pé direito. O assassinato de Landaverde, em dezembro do ano passado gerou dúvidas sobre a possibilidade. De acordo com o ex-chefe de polícia, os esforços contra a corrupção não avançarão se não não forem dirigidos por um policial “porque não conhece a instituição por dentro”.

Prisões assassinas

Em fevereiro, um incêndio na prisão Comayagua, nos arredores de Tegucigalpa, levou a 361 detentos mortos, colocando o país nas manchetes internacionais. O MP e os bombeiros de Honduras, e a cooperação americana asseguraram de que se tratou de um incêndio acidental. Mas jornal El Faro, que fez sua própria reportagem investigativa, concluiu que não foi um acidente.

Entre os detalhes importantes constava que a prisão estava superlotada. Abrigava quase 852 presos (60% em prisão preventiva), quando sua capacidade era para 400. Além disso, de acordo com um ex-funcionário do sistema prisional, nessa e em outras prisões, os guardas têm uma formação precária. No caso de Comayagua, os carcereiros foram punidos por seus superiores por não abrir as celas quando as vidas dos internos corria perigo. Mas, de acordo com a reportagem de El Faro, isso aconteceu apesar dos próprios superiores os terem proibido de abri-las.

O relatório do Wilson Center de 2011 detalha as situação precária das prisões e a superpopulação. Mas um ex-chefe de polícia, aposentado em 2008, afirma que as condições das prisões facilitam a corrupção. “Na prisão de Támara, os detentos tinham o controle interno das celas, e o orçamento diário de alimentação por interno era de apenas 13 lempiras (R$1,40)”. Isso em um país onde uma garrafa de meio litro de água custa 20 lempiras (R$2,15). Estas condições geram, de acordo com o ex-chefe de polícia, todos os tipos de negócios ilegais, onde “cobravam por tudo”. Plaza Pública entrevistou um guatemalteco que esteve recentemente na prisão de Támara, e afirmou que ainda é um território liberado, sob controle do crime organizado.

Extorsão

Na segunda semana de março 2012, autoridades anunciaram a instalação de um sistema de câmeras em áreas públicas de Tegucigalpa para ajudar a reduzir a criminalidade – proveniente principalmente das quadrilhas e gangues de crianças e adolescentes dos bairros mais pobres e excluídos de Honduras. Seus membros somam ao menos 36 mil, de acordo com uma estimativa policial.
Mas muitos empresários estão contratando empresas de segurança administradas por ex-polícias e ex-militares. Um desses administradores disse que em 2011 sua empresa conseguiu entregar à polícia uma quadrilha de quatro nicaraguenses dedicados a quebrar janelas dos veículos nos estacionamentos de restaurantes fast food. Em outro caso, eles tiveram ajuda da polícia para desmantelar uma quadrilha de seis criminosos que tinham se apoderado da base de dados de números de telefones celular de uma empresa para praticar extorsão.

Julio, um motorista de táxi com pelo menos uma década de serviço pelas ruas da capital, conta que toda semana cada condutor de táxi deve entregar 200 lempiras (R$ 32) para a gangue Mara Salvatrucha e outras 200 para a gangue Distrito 18. Em um mês, todos os taxistas pagam ao menos 600 lempiras (R$ 65), pelo “direito de passagem”.

Mas como você sabe que se trata de eles? “Olha, não saem por ai se apresentando”, disse Julio. “Eles mandam laranjas (crianças pequenas) de 10 ou 12 anos para cobrar, mas já se sabe quem eles são.” A lei anti- quadrilhas estabelece que se um desses jovens é preso com grandes somas de dinheiro, cuja a origem legal não se possa comprovar, poderia passar até sete anos na prisão. “Por isso, às vezes enviam uma ‘laranja’ grávida para fazer a cobran;a, porque as mulheres grávidas não são revistadas pela polícia – e já se sabe que não se pode contar com a polícia”. Segundo ele, os taxistas que tentam escapar da cobrança correm o risco de ser mortos.

Assassinatos de jornalistas

Nos últimos dez anos, morreram violentamente quase 50 mil hondurenhos. Em 2011, cerca de 8 em cada 10 casos permaneciam impunes, segundo dados compilados pela Comissão de Direitos Humanos. Entre os assassinatos mais graves figuram 19 jornalistas, apenas desde janeiro de 2010, quando Lobo assumiu a presidência. Um caso, o de Luz Marina Paz, ocorreu um dia antes do assassinato de Landaverde, o assessor que seria o denunciante.

Parece que a impunidade nos assassinatos de jornalistas reflete a impunidade nos casos de outras vítimas. Ou seja, os jornalistas são mortos porque a maioria dos assassinos de Honduras está livre.

Em fevereiro de 2011, o jornalista de TV Saira Almendares foi morto a tiros em San Pedro Sula. O caso mais recente, a vítima número 19, foi Fausto Valle Hernández, apresentador do programa La Voz de la Noticia Alegre de rádio Alegre de Sabá, Colón. Em 11 de Março, Vale andava de bicicleta perto de sua casa quando foi atacado por um homem que lhe deu 18 facadas. O assassino fugiu sem roubar nada. Três dias depois, segundo notícias da imprensa, a polícia não tinha feito nem um informe sobre o caso.

No final de 2010, o presidente Lobo insistiu que as mortes dos jornalistas não estavam relacionadas ao seu trabalho. Mas jornalistas ouvidos pela reportagem (que preferem não ser identificados) afirmam que as evidências sugerem que uma minoria dos casos está relacionada com a prática profissional das vítimas. “A maioria está ligada a diversas formas de corrupção, e foram assassinados nessas circunstâncias, onde o elo comum é a impunidade”, diz o jornalista T.

A motivação dos permanece um mistério porque a polícia e o MP não divulgam os resultados das investigações. Então, o efeito é duplamente prejudicial. “A morte de um jornalista – por qualquer motivo – tem um forte impacto na sociedade. As pessoas concluem que se não se faz justiça quando matam alguém importante, menos se fará em relação a um cidadão comum”, diz T.

Diversas organizações da imprensa internacional classificam Honduras como o país mais perigoso para jornalistas, depois do México, na América Latina. No mundo, os dois países só são superados pelo Iraque e Afeganistão.

O presidente Lobo mantém um relacionamento conturbado com a imprensa. De acordo com o comissário Custodio, Lobo está chocado ao ver que Honduras é manchete de jornais internacionais devido a violência. “O presidente está incomodado com a liberdade de expressão, mas eu prefiro que se saiba San Pedro Sula (onde metade dos crimes é são cometidos por menores de idade) tirou o primeiro lugar da Ciudad Juarez (México) como cidade mais violenta do mundo”, explica. “(Lobo) diz que (a publicação desses dados) vai evitar que venham investidores, mas para mim isso é um raciocínio infantil para aplacar o espírito da crítica”.

Para ler o original em espanhol, clique aqui.

 

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