Pioneira, a Envolverde adotou desde 1998 a licença chamada, então, de “Copyleft”, permitindo livre reprodução dos conteúdos desde que citada a fonte. Conversamos com Dal Marcondes, fundador e diretor a Envolverde, para ouvir como foi a trajetória desse empreendimento independente, que chega à sua maturidade. Como ele mesmo resume, “foram anos de muitas mutações, tanto internas como externas”. Um ótimo exemplo pra quem quer fugir do padrão.
Como nasceu a envolverde?
Em junho de 1995 começamos editar um suplemento de jornal dedicado à cobertura de meio ambiente (o Projeto Terramérica) através da Envolverde Editora Ltda. Até 1998 a Envolverde era apenas isso. No começo de 1998 criamos o site Envolverde em HTML, e começamos a a traduzir e distribuir no Brasil os conteúdos da IPS, uma ONG de jornalistas que atua em mais de 100 países. Em maio de 1998 me desliguei da Agência Estado, onde ocupei cargos de edição e, por último, o de gerente de projetos especiais, e passei a me dedicar exclusivamente ao projeto. Assim nasceu a Envolverde.
Por que os fundadores do Envolverde resolveram, 16 anos atrás, abandonar as redações tradicionais? Quais eram seus maiores exemplos então?
O principal motivo foi fazer um jornalismo mais comprometido com o desenvolvimento humano. Nosso maior exemplo era, e ainda é, a agência IPS, que cobre temas normalmente relegados pelos veículos tradicionais de mídia. Procuramos estabelecer o modelo de cobertura dentro do território brasileiro, dando especial destaque à cobertura de temas normalmente fora da pauta das mídias convencionais.
A Envolverde é uma empresa ou uma ONG? Como é o funcionamento?
A Envolverde nasceu como uma empresa, mas a legislação brasileira tem muitos obstáculos para a gestão de empresas jornalísticas, notadamente agências de notícias. Passamos quase 10 anos brigando contra cobranças indevidas de impostos, uma vez que o exercício do jornalismo goza de imunidade tributária (os órgãos públicos entendiam que essa imunidade estendia-se apenas ao jornalismo impresso). Em 2007 criamos o Instituto Envolverde, uma ONG que assumiu a gestão do site www.envolverde.com.br e deixamos de atuar como uma empresa na área de produção e distribuição de conteúdos. Passamos a trabalhar com a lógica de uma ONG, mas sem abandonar nossa linha editorial, na qual o jornalismo é a linha mestra. Muitas vezes nos perguntam se somos militantes ambientais e a resposta é sempre não. Somos jornalistas que trabalham com pautas ambientais e sociais. Já tivemos uma grande equipe de profissionais CLT e quando veio a crise da Internet no início dos 2000 quebramos, mas conseguimos pagar todo mundo direitinho. O site nunca saiu do ar. Temos uma equipe pequena que cuida do site, com um tradutor, duas jornalistas e uma revisora, todos assalariados. Os outros profissionais são acionado por trabalhos específicos e recebem de acordo com a remuneração de cada trabalho.
Houve, nesse percurso, maneiras diferentes de financiamento. Você poderia explicar essas modalidades?
O modelo de financiamento da Envolverde sempre foi o maior desafio, seja como empresa ou como ONG. Na maior parte do tempo fazemos coisas, serviços e produtos para clientes e parceiros e usamos parte do dinheiro para financiar o site. Fazemos estudos para empresas e organizações sociais, reportagens encomendadas por outros meios jornais e revistas, cursos e eventos, tudo sempre com foco em sustentabilidade ambiental. Desta forma conseguimos um mix de receita que mantém a roda girando. Estamos entrando em 2014 ainda buscando empatar as despesas e receitas do site, é um trabalho permanente e não pode haver desânimo.
O trabalho da Envolverde, que já rendeu 2 prêmios Ethos de Jornalismo, é recompensador, em termos pessoais – apesar do fato de que uma reportagem na Globo, por exemplo, alcança um público muito maior?
No início eu tinha muito medo de estar fazendo uma aposta furada. Muita gente me disse que eu não conseguiria mais ser recebido pelas fontes por não ter um sobrenome profissional forte, como Globo, Estadão, Exame etc. O tempo mostrou que estavam errados. Hoje eu e os jornalistas da Envolverde temos um excelente trânsito entre empresas, governos e organizações sociais. Somos identificados como uma mídia de referência na área que cobrimos. É fato que a Globo chega a mais gente, mas conseguimos emitir um boletim diário para quase 16 mil pessoas e temos mais de 40 mil leitores no facebook. Isso para uma mídia segmentada é bastante. Um texto publicado na Envolverde é replicado de 5 a 50 vezes, basta procurar na internet e ver que todo tipos de organização e empresa utiliza nossos conteúdos livremente, principalmente entidades educacionais.
Fala-se muito que estamos passando da “mídia de massa” para a “massa de mídias”, com uma valorizaçã do jornalismo empreendedor. Qual a sua avaliação sobre essa tendência? Que conselho você daria para um jornalista que está começando neste “admirável mundo novo”?
Eu acredito que o jornalismo está em uma fase de transição. As grandes mídias podem chegar a mais gente, mas as pessoas estão buscando nelas mais entretenimento do que informação. A informação, o jornalismo, a investigação, a opinião tem de ter assinatura, tem de vir de uma fonte que o público valide como relevante e responsável. Além disso, há um mundo de informações que não têm o menor sentido para a maior parte das pessoas e apenas o jornalista é capaz de navegar com alguma segurança nesse mar de dados, números e opiniões de forma a trazer à tona aquilo que é realmente relevante. Na sociedade da informação, que apenas desponta nesse início de século, o jornalista, as mídias independentes e os projetos de novos negócios em jornalismo têm espaço garantido. Para esses, há oportunidades de financiamento em organizações sociais nacionais e estrangeiras, programas de apoio de empresas e leis de incentivo. Nada deve ser descartado e nunca se pode desistir com um não, mas sim buscar entender como funciona o processo de seleção de projetos, aprender a apresentar bons projetos e batalhar sempre. É sempre bom lembrar que empreender é um ato de convicção, conhecimento e teimosia!