O fim da escala 6×1, a justiça tributária e o modelo de trabalho dos entregadores de aplicativo e trabalhadores informais estão na agenda do novo ministro de Lula (PT), Guilherme Boulos (PSOL), segundo parlamentares ouvidos pela Agência Pública. O deputado federal assume a Secretaria-Geral da Presidência nesta quarta-feira (29), às 16h, e substitui o ex-ministro Márcio Macêdo, que deixa o governo após receber críticas sobre a articulação da secretaria com os movimentos sociais.
“São agendas que, sem dúvida, conectam com o dia a dia do trabalhador brasileiro e são muito coerentes com a trajetória do agora ministro Guilherme”, explicou a líder do PSOL na Câmara, deputada federal Talíria Petrone (PSOL-RJ). De acordo com ela, o ministro vai viajar pelo Brasil para “aproximar o governo desses territórios, com prestação de contas do que já foi feito, e também escutando as demandas dos movimentos sociais e das cidades do Brasil afora, para que nesse último ano a gente acerte ainda mais”.
Por que isso importa?
- Secretaria-Geral da Presidência tornou-se no terceiro mandato de Lula a responsável por fazer a ligação entre governo e sociedade civil;
- Guilherme Boulos pode ficar fora das eleições de 2026 e impactar na superação da cláusula de barreira do PSOL no Congresso.
A deputada federal, Erika Kokay (PT-DF), vice-líder do PT na Câmara, avalia que “o ministro Boulos vai continuar o que foi feito, todos os avanços do ministro Márcio Macêdo”. “Boulos não parte do zero”, diz. Kokay considera que Macêdo, que foi deputado federal de Sergipe pelo PT entre 2011 e 2023, estruturou as relações entre os movimentos sociais e a Secretaria-Geral da Presidência e “trabalhou na perspectiva de articulação e de resolução de demandas históricas dos movimentos sociais”.
“Eu penso que o ministro Boulos, pela sua história, pelo seu compromisso e pela sua capacidade, tem todas as condições de aprofundar essas relações [com os movimentos sociais], de andar mais pelo país, enfim, de dialogar com o Brasil profundo e particularmente com a sociedade civil organizada”, acrescentou Kokay.
Anunciado para ocupar a vaga há pouco mais de uma semana, Guilherme Boulos disse à CNN que sua função será “colocar o governo na rua”, por meio de viagens pelo país, para “apresentar as realizações e as pautas do governo federal”. Boulos iniciou sua trajetória política na militância do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), que luta pelo direito à moradia digna e ocupa terrenos abandonados para pressionar pela desapropriação. Além de deputado federal, foi candidato a prefeito de São Paulo nas eleições municipais de 2024, mas foi derrotado por Ricardo Nunes (MDB).
Antes mesmo de tomar posse, ele já iniciou as mudanças na pasta. Exonerou, por exemplo, o ex-secretário Nacional de Juventude, Ronald Sorriso, indicado por Macêdo. Como aceitou o cargo, Boulos pode ficar fora da disputa eleitoral do ano que vem, o que representaria uma perda para o PSOL, visto que ele foi o deputado mais votado de São Paulo em 2022, com mais de 1 milhão de votos. O futuro do ministro, entretanto, ainda não está definido, como explicou Petrone: “A tendência é que ele não venha [a ser candidato], mas nós vamos fazer esse diálogo com o ministro, com o governo e com o nosso partido”.
A agenda de Macêdo
Durante os mais de mil dias em que ocupou o cargo mais alto da Secretaria-Geral da Presidência, o ex-ministro Márcio Macêdo teve mais de dois mil compromissos oficiais, de acordo com sua agenda pública. Ele viajou para, no mínimo, 98 cidades, algumas fora do Brasil, nas quais acompanhou o presidente Lula e participou de eventos de movimentos sociais, vistorias a obras e reuniões com políticos locais.
Ainda assim, Lula quis mais. O ápice do descontentamento do presidente foi tornado público em evento em 1º de maio de 2024, quando ele disse que o ato foi “mal convocado”. “Não pensem que vai ficar assim”, disse. A troca, entretanto, levou mais de um ano para acontecer. Questionado, Macêdo respondeu ao Globo que “não é papel do governo mobilizar atos das centrais sindicais ou dos movimentos sociais”.
A Agência Pública analisou as agendas de Macêdo por meio da ferramenta Agenda Transparente, da Fiquem Sabendo. A cidade em que o ex-ministro compareceu ao maior número de eventos (79) foi a capital de Sergipe, Aracaju, onde ele construiu sua carreira política e foi eleito deputado federal pela primeira vez em 2010. Rio de Janeiro (46), São Paulo (29) e Belém (24) seguem respectivamente no ranking de mais eventos com a presença do chefe da pasta, que visitou todas as capitais brasileiras ao menos uma vez.
O ex-ministro também compareceu a eventos, como o Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), em Goiânia — ele iniciou sua trajetória política no movimento estudantil —, e se reuniu com representantes de sindicatos e associações nacionais e locais. Uma das pautas que se repetiu na agenda do ex-ministro envolve a criação de políticas públicas que melhorem as condições de trabalho e promovam a inclusão social e econômica de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis. Ainda em fevereiro de 2023, primeiro ano da atual gestão, o governo lançou um programa voltado à categoria.

Macêdo deve ser candidato à Câmara dos Deputados ou ao Senado Federal no ano que vem. “Em conversa com o presidente Lula, ficou definido que deixarei o cargo de ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República para disputar as eleições de 2026”, disse ao anunciar a saída do cargo.
O que faz a Secretaria-Geral da Presidência
A Secretaria-Geral da Presidência foi reformulada no início da terceira gestão de Lula, quando a pasta assumiu um papel de articulação com movimentos sociais antes não previsto pelo governo de Jair Bolsonaro (PL). A primeira de suas atribuições, definida por um decreto presidencial publicado em 1º de janeiro de 2023, foi descrita como “coordenar e articular as relações políticas do Governo com os diferentes segmentos da sociedade civil e juventude”.
Também cabe ao órgão articular políticas públicas para a juventude, criar e implementar instrumentos de consulta e participação popular e “cooperar com os movimentos sociais na articulação das agendas e ações que fomentem o diálogo”, entre outros. “Um governo democrático popular, como é o governo Lula, tem que ser um espaço de construção coletiva”, justificou Kokay.
A definição dada por Lula para a secretaria diverge da de Bolsonaro, que criou uma pasta mais ligada ao trabalho burocrático. No decreto publicado pelo ex-presidente em agosto de 2019, a pasta tinha como função supervisionar e executar atividades administrativas da Presidência e da Vice-Presidência, verificar a constitucionalidade e legalidade dos atos presidenciais, promover a “fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial” de órgãos do Executivo, e elaborar mensagens do Poder Executivo destinadas ao Congresso Nacional, entre outros.
Durante a gestão Bolsonaro, seis ministros passaram pelo cargo, entre eles o ex-presidente do PSL, partido pelo qual o ex-presidente disputou e ganhou as eleições de 2018, Gustavo Bebianno, além do General Floriano Peixoto e do ex-deputado federal Onyx Lorenzoni (PL-RS).

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