Buscar
Agência de jornalismo investigativo
Checagem

Movimentos sociais e terrorismo. Que medo, Damous!

“Não adianta, como esforçadamente faz o relator, dizer que movimentos sociais estão fora porque esse enquadramento será feito por delegados, membros do Ministério Público, Justiça e já sabemos quais vão ser as consequências.” – Wadih Damous (PT-RJ), deputado federal, sobre o projeto de lei 2016/15, que tipifica o crime de terrorismo

Checagem
7 de agosto de 2015
17:00
Este artigo tem mais de 9 ano

Os projetos de lei que definem o crime de terrorismo no Brasil foram impulsionados pela promoção de grandes eventos, como a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016. Iniciativas do gênero têm preocupado movimentos sociais nos últimos anos, porque, como observou o parlamentar, há um risco real de que manifestantes sejam indiciados de acordo com a interpretação dos agentes legais.

Algo semelhante vem acontecendo. Depois das manifestações de junho de 2013, a Polícia Civil de São Paulo passou a investigar danos cometidos a bens públicos e privados. Em vez de investigar os delitos individualmente, como crimes de vandalismo, tentou enquadrar os suspeitos como associação criminosa no inquérito 01/2013, o “inquérito Black Bloc”. Até fevereiro do ano passado, cerca de 300 pessoas tinham sido ouvidas. Advogados criticaram o teor político dos questionamentos da polícia.

Outro manifestante, Igor Mendes, foi detido no Rio em 12 de julho de 2014, na véspera da final da Copa do Mundo, e é considerado um preso político pela ONG Tortura Nunca Mais e outras organizações de defesa dos direitos humanos. Ele foi denunciado pelo Ministério Público por “associação criminosa agravada pelo uso de arma e a participação de adolescentes” e era, até maio, o único dos 23 processados pela Justiça fluminense na prisão. A tipificação do crime de terrorismo pode dar margem para que casos com esses sejam caracterizados dessa forma.

As penas previstas no projeto em discussão na Câmara, que foi enviado pelo Executivo, são bem rigorosas. A maior punição era de 20 anos de prisão, mas o relator, o deputado Arthur Oliveira Maia (SD-BA), aumentou o tempo para 30 anos. O parlamentar fez ainda uma série de modificações no texto original, alegando que o projeto precisava definir o que são “atos de terrorismo” para ser efetivo.

A nova redação qualifica as seguintes ações como terroristas: “I – Usar ou ameaçar usar, transportar, guardar, portar ou trazer consigo explosivos, gases tóxicos, venenos, conteúdos biológicos, químicos, nucleares ou outros meios capazes de causar danos ou promover destruição em massa; II – Incendiar, depredar, saquear, destruir ou explodir meios de transporte ou qualquer bem público ou privado; III – Interferir, sabotar ou danificar sistemas de informática ou banco de dados; IV – Sabotar o funcionamento ou apoderar-se, com violência, grave ameaça a pessoa, ou servindo-se de mecanismos cibernéticos, do controle total ou parcial, ainda que de modo temporário, de meio de comunicação ou de transporte, de portos, aeroportos, estações ferroviárias ou rodoviárias, hospitais, casas de saúde, escolas, estádios esportivos, instalações públicas ou locais onde funcionem serviços públicos essenciais, instalações de geração ou transmissão de energia e instalações militares e instalações de exploração, refino e processamento de petróleo e gás.”

Embora o parágrafo 2º do artigo 2º diga que nada disso pode ser aplicado a participantes de manifestações e movimentos sociais, abre-se margem para interpretação e punição, como ocorreu no inquérito “Black Bloc” e na prisão de Igor Mendes. Até mesmo jovens que invadirem sistemas poderão ser qualificados como terroristas, se for aprovado o projeto com o texto de Arthur Maia.

Wadih Damous (PT-RJ), deputado federal, em sessão na Câmara
Wadih Damous (PT-RJ), deputado federal, em sessão na Câmara. Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados

Outras iniciativas, também bastante duras, tramitavam no Senado e foram criticadas por movimentos sociais. “Tipificar o crime de terrorismo foi percebido pela sociedade como um retrocesso democrático muito grande, especialmente agora que estamos rememorando os 50 anos da ditadura militar”, disse Gabriel Elias, cientista político e membro do Comitê Pela Desmilitarização da Polícia e da Política, em entrevista à Agência Pública no ano passado.

Não é todo mundo que chega até aqui não! Você faz parte do grupo mais fiel da Pública, que costuma vir com a gente até a última palavra do texto. Mas sabia que menos de 1% de nossos leitores apoiam nosso trabalho financeiramente? Estes são Aliados da Pública, que são muito bem recompensados pela ajuda que eles dão. São descontos em livros, streaming de graça, participação nas nossas newsletters e contato direto com a redação em troca de um apoio que custa menos de R$ 1 por dia.

Clica aqui pra saber mais!

Se você chegou até aqui é porque realmente valoriza nosso jornalismo. Conheça e apoie o Programa dos Aliados, onde se reúnem os leitores mais fiéis da Pública, fundamentais para a gente continuar existindo e fazendo o jornalismo valente que você conhece. Se preferir, envie um pix de qualquer valor para contato@apublica.org.

Quer entender melhor? A Pública te ajuda.

Truco

Este texto foi produzido pelo Truco, o projeto de fact-checking da Agência Pública. Entenda a nossa metodologia de checagem e conheça os selos de classificação adotados em https://apublica.org/truco. Sugestões, críticas e observações sobre esta checagem podem ser enviadas para o e-mail truco@apublica.org e por WhatsApp ou Telegram: (11) 99816-3949. Acompanhe também no Twitter e no Facebook. Desde o dia 30 de julho de 2018, os selos “Distorcido” e “Contraditório” deixaram de ser usados no Truco. Além disso, adotamos um novo selo, “Subestimado”. Saiba mais sobre a mudança.

Faça parte

Saiba de tudo que investigamos

Fique por dentro

Receba conteúdos exclusivos da Pública de graça no seu email.

Artigos mais recentes