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Checagem

Projeto de lei que tramita na Câmara não cria novos municípios

Imagem que circula no Facebook denuncia tentativa de criação de 400 novas cidades mas projeto de lei apenas regulamenta os requisitos necessários para plebiscitos locais

Checagem
11 de julho de 2018
15:00
Este artigo tem mais de 5 ano

Enquanto o Brasil acompanha a Copa, os deputados tentarão criar 400 novos municípios.

Exagerado

Enquanto acontece a Copa do Mundo, a Câmara dos Deputados discute, em regime de urgência, um projeto de lei (PL 137/2015) que regulamenta a criação de municípios no país. O PL foi criticado por movimentos populares como o Vem Pra Rua, que em 2 de julho publicou uma imagem sobre o projeto que viralizou na rede social. O texto diz que os deputados estão tentando criar 400 novos municípios em território nacional. A postagem teve mais de 8 mil compartilhamentos e circulou por outras páginas, como a do Movimento Contra Corrupção, na qual conseguiu mais 1,2 mil compartilhamentos.

No entanto, a informação apresentada na imagem é exagerada. O número de novas cidades apontado corresponde a uma estimativa de quantos pedidos de criação de municípios circulavam em 2013, quando outro projeto de lei similar estava em discussão. Atualmente a quantidade de pedidos de criação de município pode ser diferente, já que algumas solicitações podem ter sido abandonadas e outras novas podem ter sido criadas. Independente do número de pedidos, o projeto de lei pressupõe uma série de procedimentos para a criação de municípios e ainda precisaria ser sancionado pela presidência depois de aprovado pela Câmara. Assim, o PL em questão não cria automaticamente novos municípios.

Procurada pelo Truco, a assessoria do movimento Vem Pra Rua apontou matérias da Câmara Notícias, Gazeta do Povo, DCI, Congresso em Foco e G1 como fontes de informação para a postagem. No entanto, nenhuma das matérias trata a criação de 400 municípios como uma consequência imediata do projeto de lei.

O PL 137/2015 já foi aprovado pelo Senado e circula em em regime de urgência na Câmara desde 16 de maio, por requerimento da Deputada Marinha Raupp (PMDB-RO). Por isso, há quase dois meses ele é incluído automaticamente na Ordem do Dia para os deputados, apesar de ainda não ter ido à votação. Além disso, o projeto prevê diversos requisitos para a criação de novas cidades. Para a criação, incorporação, fusão e o desmembramento de municípios seria necessário um requerimento junto à Assembleia Legislativa do respectivo estado com subscrição de pelo menos 20% dos eleitores residentes na área a ser desmembrada ou emancipada e 3% dos eleitores em cada município envolvido em caso de fusão ou incorporação. Além disso, os municípios alterados deverão ter uma população mínima que difere de região para região e um número mínimo de imóveis que também varia conforme a média do estado. Outro requisito é a realização de estudos de viabilidade municipal que deverão ser aprovados pela Assembleia Legislativa do respectivo estado para que então sejam convocados plebiscitos, conforme prevê a Constituição em seu artigo 18. Como o projeto de lei não propõe uma emenda constitucional, ele não tem poder de alterar a carta magna, mas apenas estabelece regras adicionais. Por último, se aprovada a criação em plebiscito, a Assembleia Legislativa local deverá votar uma lei estadual de criação de município, estabelecendo nome, perímetro, distritos e outras características da nova cidade. Não é possível saber quantos municípios conseguiriam atingir esses requisitos previstos pelo projeto de lei.

Além disso, caso aprovado pela Câmara, o PL 137/2015 ainda deve ser sancionado pela presidência, conforme noticiado pelo Diário Comércio Serviços e Indústrias, fonte da informação do Vem Pra Rua. Nos últimos anos, dois projetos a respeito da criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de municípios já foram vetados pela então presidente Dilma Rousseff, o PL 397/2014 e o PL 416/2008. O segundo é muito parecido ao atual e foi rejeitado pela presidência porque, segundo o Ministério da Fazenda, ele permitiria “a expansão expressiva do número de municípios no País, resultando em aumento de despesas com a manutenção de sua estrutura administrativa e representativa.”

Essa conclusão vem de uma pesquisa preliminar realizada pelo Ipea em 2013 a respeito do impacto do PL 416/2008, que circulou e foi aprovado como PL 98/2002 no Senado. O estudo levou em conta pedidos de criação de municípios não finalizados encontrados nas assembleias legislativas de 19 estados brasileiros. Eram 475 pedidos no total e 363 atendiam as subscrições mínimas impostas pelo projeto.

Também apontada como fonte da informação pelo movimento Vem Pra Rua, outra pesquisa realizada pelo O Globo em 2013 a respeito do PL 416/2008 concluiu que havia 410 pedidos de criação de novos municípios naquele ano. O levantamento foi feito com base na consulta às assessorias de imprensa das 26 assembleias legislativas, mas não avaliou se os pedidos atendiam os requisitos estabelecidos pelo projeto de lei.

Como os critérios do PL 416/2008 são idênticos aos do PL 137/2015, as pesquisas de impacto realizadas a respeito do primeiro projeto foram utilizadas para o se referir ao projeto atual. Durante discussão a respeito do novo PL, o deputado Chico Alencar (PSOL) trouxe o número de 400 novos municípios à tona no Congresso, conforme noticiado pela Câmara Notícias e pela Gazeta do Povo. No entanto, as pesquisas são antigas e preliminares, por isso não é possível estabelecer exatamente quantos municípios poderiam ser criados com o projeto de lei atual porque alguns podem ter desistido do pedido e outros novas solicitações podem ter sido encaminhadas às assembleias legislativas.

Informado pelo Truco do resultado da checagem, o movimento Vem Pra Rua manteve o posicionamento anterior onde informou as fontes das informações utilizadas na imagem. No comunicado, o grupo também disse que combate fake news e destacou seu compromisso com a verdade. “O movimento acredita na democracia e, por isso, defende uma imprensa livre e responsável”, afirma ainda.

                                                                            

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Este texto foi produzido pelo Truco, o projeto de fact-checking da Agência Pública. Entenda a nossa metodologia de checagem e conheça os selos de classificação adotados em https://apublica.org/truco. Sugestões, críticas e observações sobre esta checagem podem ser enviadas para o e-mail truco@apublica.org e por WhatsApp ou Telegram: (11) 99816-3949. Acompanhe também no Twitter e no Facebook. Desde o dia 30 de julho de 2018, os selos “Distorcido” e “Contraditório” deixaram de ser usados no Truco. Além disso, adotamos um novo selo, “Subestimado”. Saiba mais sobre a mudança.

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